O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) defendeu uma saída política para acelerar a aprovação do projeto de lei de proteção aos dados pessoais (PL 6276/2016), após a retirada da urgência, requerida pelo presidente interino Michel Temer. No entendimento do parlamentar, que coordenou audiência pública sobre o tema na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara, nesta quinta-feira, 7, ainda há posições muito divergentes sobre a proposição. Uma das saídas seria a criação de uma comissão especial para análise da matéria e, para isso, teria que distribuir o PL para mais uma comissão permanente, disse o parlamentar, que também é um dos relatores do projeto. Hoje a proposta também terá que passar pela Comissão de Ciência e Tecnologia e de Constituição e Justiça.

Na audiência realizada nesta quinta, 7, especialistas e representantes da sociedade defenderam o projeto como está, enquanto que os representantes de setores da economia pediram alterações profundas no texto, a começar do conceito de dados pessoais que faz parte do projeto, por considerar que ele é muito amplo. “O desafio é criar um regime geral de proteção de dados em linguagem objetiva, com direitos e obrigações exequíveis e razoáveis, que protegem o cidadão e, ao mesmo tempo, incentivem a inovação e o empreendedorismo”, defendeu a representante da Associação Brasileira de Internet (Abranet), Carol Conway. Ela reclamou também da exclusão dos bancos de dados do Estado do regime geral de proteção dos dados.

Para o presidente-executivo da Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom), Sérgio Paulo Gallindo, o escopo da aplicação da lei precisa ser aperfeiçoado: “não faz sentido que todos os dados sejam protegidos”, disse. Segundo ele, o aumento vertiginoso da quantidade de dados produzidos pelas pessoas, a variedade e o tratamento dessas informações têm gerado valor e com uma velocidade crescente, com perspectiva de alcançar até US$ 1,6 trilhão em quatro anos e esse valor econômico vai crescer muito mais com a Internet das Coisas.

Gallindo alega que, na cadeia do tratamento, a responsabilidade é contratual e reclama dos exageros nas sanções previstas no projeto. Ele também opina que a transferência internacional de dados deve ser regulada ex-post e não ex-ante, como previsto no texto em exame. “O País tem uma oportunidade gigantesca de fazer uma lei protetiva dos direitos e impulsionadora dos negócios”, afirmou.

Para o representante da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), Antônio Negrão, da forma como está, o texto inviabiliza a portabilidade de créditos, em função dos riscos de transferência de dados. “No mínimo, essa facilidade deveria ser restrita aos bancos”, disse. Já o representante da Associação Brasileira de Marketing Direto (Abemb), Efraim Kapulski , revelou as preocupações do setor com a exigência do consentimento do titular do dado para sua utilização, o que dificultaria a atuação de terceirizados que fazem esse tratamento. Ele citou que o projeto está desconectado da realidade operacional do mercado, que acabará por não gerar a proteção pretendida, por conta de uma restrição excessiva.

Apoio

Já especialistas e representantes da sociedade civil fizeram poucos reparos ao texto. O representante do Instituto Beta de Internet e Democracia, Paulo Rená, por exemplo, disse que o projeto é adequado, mas faz restrições ao uso de dados biométricos. “Senhas podem ser trocadas, impressão digital não”, afirmou. O pesquisador do Idec, Rafael Zanatta, por sua vez, disse que o projeto não pode levar em conta somente o cenário econômico. Para ele, o interesse legítimo, previsto no texto, não impede o big data, mas é preciso manifestar o uso que será dado aos dados coletados por aplicativos, por exemplo.

O representante do coletivo Actantes, Sergio Amadeu, a lei de proteção de dados servirá também para regulamentar o mercado de compra e venda de dados pessoais. Para ele, esse mercado não pode ser extinto, mas a lei pode dar modulações mínimas para seu funcionamento. “As pessoas tem o direito de saber quanto estão ganhando com a venda de seus dados e devem ter a opção de não permitir a coleta deles”, salientou.

O pesquisador da Universidade de São Paulo (USP), Bruno Biono, disse que as reações contra o controle de dados anônimos não faz sentido. Segundo ele, não há dados anônimos que não possam ser usados para reidentificar uma pessoa. Por essa razão, considera que a alteração do conceito de dados pessoais estabelecido no projeto, que prevê o consentimento para uso mesmo de dados anonimizados, seria um retrocesso.

Há ainda divergências sobre a autoridade que, no projeto de lei, pode estabelecer novas exigências para aperfeiçoar a proteção dos dados. A única unanimidade é a importância do marco regulatório, especialmente para contratos com empresas ou organismos internacionais.