A fornecedora norte-americana Qualcomm alerta para a necessidade de a Anatel encarar com mais agilidade o processo de destinação de espectro para a tecnologia 5G, sobretudo com as faixas de 3,5 GHz, 5,9 GHz e de 28 GHz. A empresa defende a maior eficiência espectral, e, por isso, advoga pela liberação dessas frequências, além de sugerir o desligamento da 2G e mesmo o fim do limite de espectro.

Segundo o diretor de relações governamentais da companhia, Francisco Giacomini Soares, para a faixa de 3,5 GHz, o que se discute atualmente é a interferência no serviço de TVRO, que não utiliza a mesma banda (mas sim a de 3,6 GHz), porém sofre interferência na banda adjacente causada nos receptores de TV parabólica com filtros ineficazes. No entendimento dele, a questão já se arrasta por 12 anos, e o ideal seria dedicar mais do que os 200 MHz que a Anatel estuda separar para as operadoras móveis. “Estamos tentando empurrar, convencer que essa licitação saia, não precisa de pressa, pode ser ano que vem, mas que saia para resolver a coisa do TVRO, talvez com alguma limitação de potência nas partes mais próximas da banda adjacente”, explicou ele durante painel sobre 5G na Fiesp nesta quinta-feira, 12. Para ele, é o legado de TVRO não é de 20 milhões de aparelhos, mas sim de 7 milhões, “no máximo”.

Já a faixa de 5,9 GHz não está regulamentada no Brasil, mas Soares diz que a Qualcomm conversa com a Anatel para tentar disponibilizar a faixa para ser utilizada em comunicação veicular com o protocolo CV-2X. A questão é que ela é utilizada para fazer uplink da banda C para satélite. “Começamos a fazer estudos, a Qualcomm em parceria com a CETUC (Centro de Estudos em Telecomunicações da PUC-RJ) para mostrar como é a compatibilidade com a banda C. Nos preocupou bastante, mas os estudos estão mostrando que dá para conviver”, declara. Há problemas, contudo, da convivência com o Wi-Fi em alguns países. Para tanto, sugere “pelo menos 10 MHz exclusivos para as aplicações de segurança, para não ter nenhum risco de interferência”. Mas diz que normalmente, o release 15 do CV-2X conta com 70 MHz na faixa.

mmWave

Giacomini Soares espera que a faixa de 28 GHz acabe sendo discutida também na Conferência Mundial de Radiocomunicações, que acontecerá em outubro de 2019 em Genebra e definirá as ondas milimétricas (mmWave) utilizadas para 5G. Apesar de esse espectro ser destinado à comunicação satelital em banda Ka, países como Estados Unidos, Coreia do Sul e Japão já executam testes e têm a frequência como um dos principais carros-chefe para o padrão IMT-2020, além do 3,5 GHz. O diretor da Qualcomm afirma que o Brasil precisará rever o uso exclusivo da faixa de 28 GHz para banda Ka. “A faixa de 26 GHz (mesma defendida pela Europa) talvez sozinha não vai dar, tem que pensar talvez no futuro de usar a de 28 GHz também”, declara. Ele alega que há a possibilidade de convivência com o uso satelital, e por isso sugere em “pensar como uma coisa só” o alcance de 26 GHz a 28 GHz. “Era bom pensar um pouco nessa faixa, não a isolar, abrir um pouquinho, deixar passar alguma ventilação”, afirma.

A faixa de 28 GHz já é utilizada pela operadora japonesa KDDI, em parceria com a Nec, para testes de 5G. Em um exemplo demonstrado pelo diretor de soluções e engenharia da fornecedora, Wagner Coppede Júnior, no debate na Fiesp, as empresas realizaram em fevereiro um piloto de operação remota de equipamento pesado por meio da transmissão de vídeo em 4K e 3D com antena multielemento e a uma distância de 70 metros. O Japão tem como plano lançar comercialmente a 5G nas Olimpíadas de 2020, com um “pré-piloto” durante o Campeonato Mundial de Rugbi, em 2019.

“Em relação a 28 GHz, são três países: EUA, Coreia e Japão. Usualmente o Brasil não segue os Estados Unidos em relação à canalização, então não chega a ser um absurdo a gente não usar”, justifica o conselheiro da Anatel, Leonardo Euler de Morais. “A gente demonstrou claramente que 28 GHz para chegar ao serviço fixo satelital tem papel importante”, completou, referindo-se à extensão territorial do País.

Porém, segundo explica o professor do Instituto Nacional de Telecomunicações (Inatel), Luciano Leonel Mendes, a convivência da 5G com “outras tecnologias é mais suave do que foi no caso do WiMAX”. Isso porque a conformidade espectral utilizada para a quinta geração é mais moderna, com melhor emissão fora da faixa. “O nível de interferência é muito menor, e a premissa é válida na convivência com satélites”, alega. O Inatel executa testes com ondas mais potentes, MIMO e rádio cognitivo (aproveitando frequências ociosas) em Santa Rita do Sapucaí (MG) para oferecer conectividade 5G em áreas rurais e de baixa densidade populacional com velocidades de até 100 Mbps em um raio de 50 km. O piloto conta com participação de RNP, UnB, CPqD, UFC, USP, Ericsson, Telefónica I+D, Technische Universtat Dresden, Universidade de Oulu, Universidade Carlos III de Madri e da Comissão Europeia.

Sem 2G, sem limite

Outra iniciativa que Francisco Soares, da Qualcomm, defende é o desligamento da rede 2G para melhorar a eficiência espectral. Ele considera a tecnologia um “gap entre onde estamos e aonde queremos evoluir”. Com o fim da segunda geração, alega, é possível também melhorar a qualidade de serviço. Segundo ele, a aplicação do GSM na Internet das Coisas é limitada, especialmente em duas das verticais que são prioridades para o governo no Plano Nacional de IoT: saúde e agroindústria. “Como vai usar IoT para a área de saúde com a rede caindo? E como vai priorizar área rural e usar drones para mapear?”, indaga. Ele sugere que haja estímulo para a migração direta para o LTE.

Soares diz que a Qualcomm já enviou sua contribuição à consulta pública sobre gestão de espectro, e que pretende fazer o mesmo como a Abinee. Para o diretor, o limite de espectro já não é mais necessário para o mercado brasileiro. Ele argumenta que isso foi colocado para fomentar a competição, mas considera que as empresas já estão maduras. “A gente está vendo que o mundo está flexibilizando isso”, afirma. Segundo Francisco Soares, a proposta de elevar em 40% o limite original é adequada, mas considera uma “pegadinha” a necessidade de pedir autorização à Anatel se passar de 30%. “É um processo a mais, não sei se é necessário e pode trazer dificuldades.”