Com uma base mundial de 175 milhões de usuários ativos e 500 mil novos por dia, o Viber, aplicativo móvel de chamadas VoIP e chat, se tornou uma pedra no sapato das operadoras celulares tradicionais. Por sua rede trafegam 120 milhões de minutos por dia. Em Mônaco, o Viber tem praticamente o mesmo número de usuários que as teles locais. No Brasil, são 6 milhões, o que é bastante razoável se for considerada a baixa penetração de smartphones no País. "Seguimos a geografia dos smartphones", disse o CEO do Viber, Talmon Marco, em entrevista por telefone para MOBILE TIME. O executivo agora acena com a bandeira branca da paz para as operadoras: quer firmar parcerias com as teles. A ideia é que as operadoras ofereçam o Viber como um diferencial para reter assinantes, sem cobrança de dados. Marco falou sobre os planos de lançar versões premium do Viber; a adaptação do serviço para feature phones; e sua opinião sobre neutralidade de rede. Por fim, para não perder o costume, criticou o Joyn, iniciativa internacional das operadoras para serviços de mensagem multimídia: "o camelo é um cavalo desenhado por um comitê. O Joyn me parece exatamente isso".

MOBILE TIME – Antes de começarmos, fale um pouco da história do Viber.

Talmon Marco – A empresa tem três anos, mas os serviços estão disponíveis há dois, porque levou um pouco de tempo para entrarmos no mercado. Começamos em fevereiro de 2010. A empresa tem sede corporativa no Chipre e escritórios de desenvolvimento em Israel e na Bielorússia. E eu tenho cidadania norte-americana, israelense e romena.

Durante sua apresentação em Barcelona, você trouxe um dado de 175 milhões de usuários ativos. Me fale um pouco mais sobre seus números, onde o Viber é mais comum, perfil de uso etc.

Estamos no mundo inteiro, seguimos a geografia dos smartphones. Onde tem mais smartphones, temos mais usuários. Ganhamos 500 mil usuários diariamente, o que seria impossível de acontecer em apenas uma pequena região. São usuários em todo o mundo. No Brasil, temos 6 milhões de usuários.

Você percebe usuários do Viber mais ativos onde os preços das operadoras locais são mais altos ou não há uma correlação direta?

Pensamos que haveria, mas não estamos vendo isso de fato. O que vemos é algumas regiões com usuários mais ativos, mas acho que isso tem mais relação com preferências de serviço, moda, mas não parece haver uma relação com os preços praticados pelas operadoras.

Na sua apresentação você trouxe o exemplo de Mônaco, onde o Viber tem praticamente o mesmo número de usuários que a operadora local de telefonia.  Qual a razão?

As pessoas são atraídas pelo Viber e por outros serviços concorrentes por conta de uma série de características, não apenas uma. Há mensagens, com confirmação de entrega e leitura; envio de fotos; estrutura de chat, em que se pode saber se a outra pessoa está escrevendo ao mesmo tempo; e garantia de entrega da mensagem, ao contrário do SMS. E na maior parte dos casos o tempo de envio de mensagem é menor (que no SMS). Ainda há a possibilidade de comunicação em grupos, os stickers de expressão, e a interoperabilidade com todas as plataformas de smartphones.

O que as pessoas usam mais: voz ou SMS?

As pessoas entram inicialmente para usar voz, mas passam a usar para mensagens também. Hoje eu diria que mensagem já está superando voz, pois as pessoas preferem se comunicar por texto. Mas mesmo em voz temos mais de 120 milhões de minutos trafegados por dia. (NR: Além desses dados, há relatos de que o Viber já trafegue 3 bilhões de minutos de voz e 10 bilhões de mensagens por mês).

O que é necessário em termos de infraestrutura?

Temos 200 servidores. Os servidores centrais ficam no datacenter da Amazon, nos EUA, e temos alguns servidores regionais espalhados, inclusive um em São Paulo, que chamamos de media servers.

Algum desses servidores são conectados a servidores de operadoras de telecomunicações?

Não, até porque nesse momento os usuários do Viber não fazem chamadas para usuários de outros serviços.  Eventualmente algum dos nossos servidores pode até estar no datacenter controlado por alguma operadora, mas seria apenas uma coincidência, não uma necessidade.

As operadoras enxergam o Viber e outros serviços over-the-top como competidores. Vocês têm a mesma visão?

Prefiro dizer que estamos oferecendo às operadoras uma oportunidade de inovarem e se diferenciarem com seus serviços de banda larga. Foi disso que tratei em Barcelona. E a melhor maneira delas fazerem isso é se associando com empresas como o Viber.

Que papel cada uma teria? As empresas tradicionais seriam provedoras apenas de conectividade, não de serviços? Porque até hoje não tem sido assim, e as teles provêm ambos os serviços, e cobram por isso.

Concordo que as operadoras até aqui têm sido as provedoras de conectividade e serviços. Mas os usuários estão demandando serviços melhores e mais inovadores, e por isso eles estão cada vez mais procurando serviços como o Viber e outros. A melhor forma para qualquer empreendimento ter sucesso é ouvir o que os clientes estão pedindo e seguir essa direção.

Você notou alguma tentativa dos operadores tradicionais de bloquear ou comprometer a qualidade dos seus serviços?

Vimos isso acontecer pontualmente. Nunca aconteceu na América Latina. Na verdade, o problema foi muito pontual em uma única empresa, mas não é um problema . O que fizemos foi divulgar em nosso website de que havia esse bloqueio e passamos a atualizar de tempos em tempos a informação.  Isso dava aos nossos usuários a opção de escolher um provedor de rede que desse a eles o que queriam. Na medida que os usuários se posicionam contra esse tipo de atitude e cobram a sua operadora de rede, dificilmente o problema acontece, desde que haja outras ofertas de provedores de conectividade. Esperamos que nossos usuários utilizem sempre operadoras que tenham um comportamento transparente em relação aos serviços over-the-top.

Vocês não tem nenhuma forma de receita. Como é o modelo de negócios e como isso vai mudar?

Hoje estamos investindo na companhia e nos concentrando em conseguir uma boa base de usuários. Ainda este ano vamos começar a oferecer e operar serviços premium, que não serão gratuitos. A experiência do usuário e a qualidade do serviço será diferente. O que ofereceremos será algo que alguns usuários escolherão pagar.

E a diferença é só a qualidade do serviço?

Não apenas. Os serviços de voz e mensagem que temos hoje continuarão a ser gratuitos e vamos continuar melhorando a qualidade desses serviços. Mas vamos trazer alguns recursos adicionais que serão cobrados. Mas o serviço atual não será cobrado nem degradado.

Vonage e Skype, por exemplo, optaram por um modelo de cobrança por chamadas locais, oferecer terminação de chamadas para números locais etc. Esse é o caminho?

Não vou entrar nos detalhes da nossa oferta futura. Mas o que Vonage e Skype fizeram foi justamente oferecer serviços adicionais sem degradar o serviço que já prestavam. No nosso caso serão vários serviços premium, começando alguns já esse ano.

Você mencionou o desejo de fazer parcerias com empresas de telecomunicações tradicionais. Que tipo de modelo de negócios é possível entre vocês e as teles com esses serviços?

Há muitos modelos potenciais. Vemos o Viber  sendo oferecido como um diferencial pelas teles, como em uma oferta delas de serviços premium sem cobrança. Ou podemos oferecer serviços premium em que a cobrança seja dividida com as teles. Há várias outras formas e estamos desenvolvendo esses modelos.

Você poderia eventualmente ter uma melhor qualidade de serviço na rede de determinada operadora em relação a outros provedores OTT?

Nós somos 100% favoráveis à neutralidade de rede. Não aceitaríamos nunca um modelo que ativamente degradasse a qualidade de serviço de um de nossos competidores.

Mas não estou falando de degradar a qualidade do competidor, mas de melhorar e garantir qualidade no seu serviço…

Não vemos nenhum problema se uma carrier decidir dar ao Viber uma qualidade de serviço superior.

Você tem acordos dessa natureza? Parece que tem uma parceria com a Axis,  operadora da Indonésia, certo?

Sim, temos uma parceria com a operadora Axis que permite aos seus usuários de banda larga usarem o Viber  livremente (NR: sem consumo de franquia de dados).

Vocês apostam no modelo de video-chamadas também?

É algo que certamente estamos olhando e temos interesse, mas ainda não anunciamos nada nessa área.

Você funciona em redes 3G e redes Wi-Fi. As redes 3G de hoje têm capacidade de suportar um serviço como o Viber?

Há muitas redes 3G diferentes. Algumas são melhores, outras nem tão boas. Varia muito. No Japão a qualidade das redes 3G é fenomenal, mas em outras mercados não tem nenhuma possibilidade de funcionar na rede 3G.

Imagino que a maior parte dos seus usuários hoje utilize redes Wi-Fi, não?

Depende do país. Sempre há um percentual das chamadas em redes Wi-Fi e outro em redes 3G, mas a proporção varia. Eu olho para o Brasil e vejo ainda uma diferença muito significativa entre esses dois tipos de usuários e essa diferença varia muito de operadora para operadora. Esse tipo de análise é fundamental para o nosso trabalho.

Você já se manifestou crítico de esforços que priorizam a interoperabilidade entre serviços over-the-top, como o Joyn. Por que?

Em Barcelona eu relembrei um velho ditado que diz que o camelo é um cavalo desenhado por um comitê. O Joyn me parece exatamente isso. Estão em desenvolvimento desde 2007 e estão disponíveis hoje em poucas operadoras. A última vez que eu vi eram nove. Mas os recursos suportados pelo Joyn hoje são menos ricos do que o Viber e outros serviços OTT já oferecem, e nós estamos disponíveis em qualquer operadora. Se sentássemos hoje e decidíssemos construir um grande carro, e disséssemos: "qual é um grande carro"? "Ah, o Volvo 1990 é um grande carro, vamos fazê-lo". Por que alguém faria isso em 2013? Hoje um grande carro é o Volvo 2020. O meu ponto é que eles estão construindo notícia velha, e ainda levam meia década para chegar lá. O Viber 2.3 é velho se comparado ao Viber 3.0, que é a versão mais atual. É assim que a inovação funciona: é preciso correr mais rápido que os competidores. O Joyn está aí há alguns anos e não mudou nada desde então. Olhe no Google Trends: coloque Viber e coloque Joyn, para 2013. Para cada duas pesquisas por Joyn tem 100 pesquisas por Viber. E somos uma empresa pequena de 100 pessoas brigando por uma iniciativa suportada por empresas de US$ 1 trilhão.

Um dos riscos para provedores de conteúdos over-the-top como vocês é competir com empresas como Google, Apple e Microsoft, que também têm serviços OTT mas também têm o controle dos sistemas operacionais e das lojas de aplicativos. Como vocês lidam com isso?

Acho que os designers dos sistemas operacionais hoje entendem que o futuro deles está atrelado à condição de que os desenvolvedores possam criar em cima das plataformas. Além disso, os usuários de cada um desses sistemas operacionais gostam dos aplicativos desenvolvidos por terceiros.  Não vejo isso como um risco. Não temos nem tivemos dificuldades de distribuir. No caso do BlackBerry (NR: onde, por limitação imposta pelo detentor do sistema operacional, sistemas de VoIP eram barrados), teremos os recursos de VoIP em pouco tempo, inclusive para o BB10. A Microsoft, que é dona do Skype, tem sido também muito atenciosa para o desenvolvimento do nosso aplicativo na plataforma deles.

Qual a perspectiva de expansão dos serviços do Viber para feature phones?

É algo que definitivamente estamos buscando. Já temos o Viber rodando em plataformas S40, que estão em feature phones, e estamos olhando outras plataformas.