O texto final do projeto de lei 2630/2020, conhecido como PL das Fake News, que deve ir a votação no plenário da Câmara dos Deputados em breve, contém uma série de artigos que impactam no mercado de robôs de conversação (chatbots), muito utilizados hoje por empresas para o relacionamento com o consumidor através do WhatsApp. Mobile Time analisou o texto do PL e indica abaixo os pontos que afetam o mercado de bots.

1) Bots precisam ser identificados como bots. O artigo 6 do PL determina que redes sociais e apps de mensageria identifiquem as contas controladas por bots e seus respectivos conteúdos. Devem ser providos mecanismos para que os titulares das contas possam informar quando utilizam bots. O uso não identificado de um bot deve ser proibido, determina o projeto de lei. Além disso, as redes sociais e os apps de mensageria devem “adotar medidas técnicas que viabilizem a identificação de contas que apresentem movimentação incompatível com a capacidade humana, devendo informá-las em seus termos de uso ou outros documentos disponíveis aos usuários.”

Hoje, embora seja de bom tom que uma empresa informe o consumidor quando ele estiver conversando com um assistente virtual, não há nada que a obrigue a fazê-lo. A maioria das contas têm uma atuação híbrida: é comum o atendimento começar de forma automatizada, com o bot fazendo uma triagem e tentando entender a intenção do cliente, e depois, dependendo do caso, o atendimento é encaminhado para um ser humano. A identificação obrigatória não é uma invenção brasileira: há exemplos de leis em outros países, como nos EUA, que a exigem. Essa é uma tendência internacional na legislação de inteligência artificial.

2) Encaminhamento controlado. No artigo 12, o PL determina que as redes sociais e serviços de mensageria “devem projetar suas plataformas para manter a natureza interpessoal do serviço e limitar a distribuição massiva de conteúdos e mídias”. Para tanto, exige que esses serviços limitem o encaminhamento de mensagens ou mídias para vários destinatários, seguindo parâmetros a serem definidos em um código de conduta que, por sua vez, terá suas diretrizes estabelecidas pelo CGI.br, de acordo com o PL.

O WhatsApp nos últimos anos já tomou medidas para conter o encaminhamento de mensagens: cada usuário só consegue enviar para cinco destinatários de cada vez, e o limite é reduzido para um quando se trata de uma mensagem que já foi muito encaminhada.

3) Adição a grupos/listas somente com opt-in. Ainda no artigo 12, com o mesmo objetivo de conter disparos em massa, o texto exige que haja consentimento prévio do usuário para ser incluído em “grupos de mensagens, listas de transmissão ou mecanismos equivalentes de agrupamentos de usuários”. Além disso, determina que “listas de transmissão só poderão ser encaminhadas e recebidas, em qualquer hipótese, por pessoas que estejam identificadas, ao mesmo tempo, nas listas de contatos de remetentes e destinatários”.

Hoje a adição a grupos no WhatsApp é feita pelo administrador dos mesmos, não pelo usuário final, até porque não existe um diretório de grupos para serem buscados. 

4) Proibição de provedores externos de disparos em massa. O artigo 12 proíbe “a venda de softwares, plugins e quaisquer outras tecnologias que permitam disseminação massiva nos serviços de mensageria instantânea.” O objetivo é combater players piratas, que vendem disparos em massa no WhatsApp ou em SMS sem autorização do aplicativo ou das operadoras. Isso fica claro em seguida: ”Os provedores de mensageria instantânea devem criar soluções para identificar e impedir mecanismos externos de distribuição massiva”. E deixa uma porta aberta para o assunto ser tratado no Código de Conduta, cujas diretrizes serão estabelecidas pelo CGI.br: “O Código de Conduta deverá estabelecer obrigações de os provedores de mensageria instantânea tomarem outras medidas preventivas para conter distribuição massiva de conteúdo no âmbito dos seus serviços”. 

O WhatsApp e as operadoras móveis já tomam uma série de ações, tanto técnicas quanto jurídicas, para combater o disparo em massa de agentes externos não autorizados. Recentemente o WhatsApp informou que nos últimos dois anos conseguiu na Justiça proibir a atuação de sete players irregulares de disparos em massa no app de mensageria.

5) Contas comerciais precisam ser identificadas e não podem veicular conteúdo eleitoral. O artigo 14 determina que contas comerciais identifiquem o remetente da mensagem. E proíbe a sua utilização para fins eleitorais: “Os provedores de mensageria que ofertem contas comerciais devem exigir de seus usuários, sejam pessoas físicas ou jurídicas, uma declaração consciente e inequívoca de que o aplicativo comercial não deve ser utilizado para finalidades de propaganda eleitoral e partidária, nem para distribuir qualquer conteúdo que não esteja relacionado a finalidades institucionais e comerciais.” Quem desobedecer deve ter a conta bloqueada: “Caso o provedor identifique encaminhamento de mensagens e mídias que não se enquadrem no escopo do serviço comercial, a conta deverá ser bloqueada.”

Isso significa que partidos e candidatos não poderão usar o WhatsApp Business API para disparos em massa nem mesmo para eleitores previamente cadastrados com o devido consentimento. Ou seja, o uso eleitoral do WhatsApp ficará restrito aos grupos (hoje limitados a 256 participantes) e à troca ou ao encaminhamento de mensagens entre usuários finais. Até então estava proibido o disparo em massa de spam, ou seja, de mensagens para destinatários não autorizados. Mas partidos políticos e candidatos já haviam experimentado nas eleições municipais de 2020 o uso do app respeitando seus termos de serviço e com disparo somente para eleitores que deram opt-in.