Em uma avaliação final do Grupo de Trabalho do BRICS sobre Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs), o chairman do GT, Daniel Cavalcanti, afirma que “possivelmente, o maior ganho da presidência brasileira foi em sustentabilidade espacial”. Para essa temática, as reuniões técnicas resultaram em um conjunto de diretrizes para guiar os responsáveis por políticas públicas e regulação dos países membros, entre eles, o apoio a um mandato da UIT sobre satélites não geoestacionários – infraestrutura que é essencial para a tecnologia direct-to-device (D2D).

“Há décadas a UIT faz uma regulação muito eficiente e muito bem sucedida nas chamadas órbitas geoestacionárias (GSO) […] A nova realidade é: estão subindo constelações de satélites não-GSO a centenas. Às vezes, um único foguete lança mais de uma centena de satélites não-GSO. E a realidade é que a UIT não tem um mandato estrito para a regulação desse ambiente específico de satélites não-GSO”, explica Cavalcanti.

A partir disso, a ideia foi de suprir a lacuna. “Queremos reforçar o papel da UIT não só sobre satélites geoestacionários, mas também não-geoestacionários e com um mandato bem específico associado ao tema dos não-GSO, para evitar um cenário de que esse bem comum, que é o espaço como um ambiente para comunicações, seja ocupado na base do ‘leva quem chegar primeiro’, mas que [ao contrário disso] seja de maneira equitativa, organizada e que permita que todos se beneficiem desse recurso”, complementou o chairman do GT.

Tal intenção foi traduzida no White Paper do GT de TICs na busca pela “melhoria da coordenação e colaboração internacional para gerenciar as alocações e o uso do espectro de radiofrequência e das órbitas satelitais associadas aos serviços baseados no espaço, garantindo o acesso justo para todos os países e minimizando interferências, particularmente dentro do mandato da UIT, bem como o fortalecimento do desenvolvimento de recursos humanos e o avanço da transformação digital”.

Ao todo, são oito recomendações, sendo as demais:

  • Identificação e monitoramento institucional de tendências e desenvolvimentos na conectividade espacial;
  • Criação de um ambiente político e regulatório propício para a conectividade espacial nos níveis nacional, regional e global, considerando acessibilidade, custo, resiliência e as complementaridades entre diferentes sistemas baseados no espaço e redes terrestres, possibilitando modelos de negócios viáveis e prevenindo distorções de mercado;
  • Implementação de medidas políticas e regulatórias, em tempo hábil, para garantir soberania de dados, segurança e proteção da privacidade para os serviços baseados no espaço, bem como a padronização internacional dessas medidas;
  • Incentivo à harmonização dos marcos regulatórios entre países;
  • Implementação de marcos regulatórios para uma gestão eficaz do Tráfego Espacial (STM) e desenvolvimento de sistemas colaborativos de coordenação do tráfego espacial;
  • Identificação e minimização do impacto ambiental dos lançamentos e operações de satélites, enfrentando o problema dos detritos espaciais por meio de regulamentações, políticas e cooperação internacional, reconhecendo os respectivos mandatos de diferentes entidades das Nações Unidas, enquanto se exploram abordagens inovadoras para a sustentabilidade ambiental nas atividades espaciais;
  • Apoio à inovação e pesquisa contínuas em tecnologias de conectividade espacial, para garantir que os avanços beneficiem todos os setores da sociedade.

O documento alerta, ainda, que “no cenário internacional, a falta ou mesmo o atraso em alcançar um consenso para avançar em um novo regime internacional pode comprometer uma resposta razoável e equilibrada para garantir a sustentabilidade espacial”. Acesse aqui a íntegra do documento.

A presidência brasileira recomendou o desenvolvimento conjunto de estudos, indicando como exemplo uma parceria em Sustentabilidade Espacial promovida pela Comissão de Comunicações, Espaço e Tecnologia (CST) da Arábia Saudita e a Anatel, “que visa contribuir com resultados tangíveis, envolvendo simulações e projeções, utilizando Inteligência Artificial (IA) para prever o comportamento futuro de satélites e otimizar a gestão dos recursos de conectividade espacial”.

Novos GTs permanentes

Na coletiva de imprensa realizada nesta tarde também foi anunciado que o GT de TICs do BRICS acatou proposta brasileira de tornar os temas “infraestrutura digital pública” e “redes do futuro” permanentes no trabalho de colaboração técnica a ser elaborado nos próximos anos dentro do bloco.

A infraestrutura digital, especificamente, será objeto de um grupo técnico que visa acompanhar as medidas que estão sendo implementadas nos países membros sobre a transformação digital do Estado. Cavalcanti explicou que o Brasil está compartilhando a experiência adquirida na gestão do gov.br e do Pix, por exemplo. “É uma troca de experiências, não só na implementação, mas na governança do dia a dia. Para aqueles países que estão um passo atrás, é a oportunidade de cooperação”, explicou.

No tema das “redes do futuro” trata-se da incorporação de todos os países membros do Brics em uma iniciativa que até então estava concentrada apenas entre Brasil e China, materializada agora no Instituto BRICS de Redes Futuras (BIFN).

Apesar do nome “instituto”, trata-se de um fórum, que reunirá centros de pesquisa indicados por cada país. No Brasil, esse lugar de destaque é dado ao CPQD (Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações).

“Lá atrás acordamos na criação desse mecanismo de cooperação, que diferentemente dessas reuniões anuais que são de governo, a ideia é colocar em contato e em cooperação quem está na prática fazendo redes e avanços de rede”, conta Cavalvanti.

A declaração dos ministros de Comunicações dos BRICS publicada nesta tarde cita, ainda, “a proposta de um novo tema sobre tecnologias quânticas” para debate no bloco.

“Observamos o Ano Internacional da Ciência e Tecnologia Quântica 2025 (IYQST), declarado pelas Nações Unidas, e a oportunidade de aproveitar as capacidades existentes nesse campo nos Estados-Membros dos BRICS. Reconhecendo a capacidade transformadora e a natureza transversal das tecnologias quânticas, incentivamos deliberações e ações de alto nível sobre esse tema”, consta na declaração.

Entre as prioridades do GT de TICs do BRICS esteve, ainda: a conectividade significativa, com mapeamento de indicadores nos países membros em um relatório que será publicado posteriormente; e a sustentabilidade ambiental, que visa estimular boas práticas pelo setor de TICs na mitigação de efeitos danosos ao meio ambiente e o uso das infraestruturas de telecom para auxiliar o monitoramento climático, como é o case do Cell Broadcast.

Regulação de plataformas

Outro tema debatido pelo GT foi o ecossistema digital, incorporando desafios regulatórios na internet. O grupo não firmou entendimento meritório sobre obter ou não uma regulação de plataformas digitais ou do mercado digital, mas buscou identificar qual é a estrutura de competências do Estado sobre esse tema entre os países membros, para troca de experiências e subsídios para tomadas de decisão. Tal levantamento compõe um estudo que ainda não foi publicado pelo bloco.

Imagem principal: Chairman do GT de TICs do BRICS, Daniel Cavalcanti. Foto: Isabela Castilho/BRICS Brasil

 

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