O Cade voltou a debater o inquérito administrativo sobre a divulgação de conteúdo jornalístico nos resultados de busca do Google com prática de scraping e sem remuneração aos veículos de mídia nesta quarta-feira, 11. Em seu parecer, o relator, Gustavo Augusto Freitas de Lima, foi favorável ao encerramento do inquérito. De acordo com o conselheiro, a prática da plataforma é benéfica ao mercado e aos consumidores, que podem acessar notícias. Depois do parecer do relator, a discussão foi encerrada pelo pedido de vista do conselheiro Diogo Thompson. Ou seja, a análise continua no órgão regulador.
As entidades que entraram com a ação, entre elas, Associação Nacional de Jornais (ANJ), defendem que a exibição de conteúdo jornalístico nas plataformas digitais sem a remuneração dos veículos produziu desvio de tráfego direto aos sites de notícia e limitou a distribuição de receitas com publicidade. A prática desincentivaria os usuários a acessarem diretamente o site de notícias. A plataforma digital puxa manchete, imagem e um trecho da notícia e insere a URL para que a pessoa possa clicar no link e seguir diretamente para o site da notícia.
Na defesa, o advogado do Google alegou que a prática é benéfica para os sites jornalísticos por levar tráfego para o portal de notícias.
“O Google demonstrou ao longo da investigação que os veículos de notícias possuem mecanismos e ferramentas para ter um controle específico, completo e granular de quais informações são exibidas ou não nas ferramentas de busca do Google. Os veículos podem decidir em quais produtos podem manter sua exibição, seja no Google News ou na busca geral e vice-versa. Há muito tempo essas ferramentas existem. Inclusive o tamanho do texto de descrição do conteúdo (snipet)”, explicou na audiência Ricardo Motta, advogado do Google.
Estudos apresentados pelo Cade

Conselheiro do Cade Gustavo Augusto. Crédito: reprodução de vídeo
Estudos da área técnica do Cade concluíram que os mecanismos de busca do Google geram tráfego positivo aos criadores de conteúdo. Os mecanismos aumentam o acesso à informação de forma gratuita para o usuário e atuam como uma “plataforma de múltiplos lados”. E as empresas jornalísticas não fazem o opt-out do sistema de busca porque os tráfegos são benéficos.
O estudo afastou ainda três teorias de danos: prática de preços abusivos (as empresas possuem outras opções para obtenção de tráfego, o que afasta a hipótese de dependência absoluta), recusa de venda dentro das condições de pagamento normais aos usos e costumes comerciais (é prática das empresas de mídia fornecer acesso a conteúdo em troca de tráfego) e a venda casada (há dados empíricos de que o Google gera tráfego relevantes).
O relator também salientou que as empresas de notícias não impedem (com o opt-out) o scraping e praticam o snippet em redes sociais, por exemplo, onde colocam um link para o seu acesso.
Inclusive, Lima não vê diferença entre a prática do Google na busca – de inserir imagem, manchete e um pequeno trecho da notícia, além de um link para a matéria – para aquilo que as próprias empresas jornalísticas fazem para divulgar suas matérias nas redes sociais ou apps de mensageria como Facebook, Instagram, X, Telegram, entre outras. Assim sendo, se fosse o caso de proibir o snippet, a medida teria que avançar também nessas outras plataformas.
“A conduta dos produtores de conteúdo jornalístico leva a crer que a conduta do Google de apresentar título, snippet e link em seu buscador é algo positivo porque elas mesmo fazem de maneira voluntária, e postam matérias exatamente dessa forma [em redes sociais]. Ou seja, a conduta dos sites de notícia leva a crer que essa é uma prática positiva. Isso é feito dentro de diversas plataformas e redes sociais e é feito rigorosamente a mesma coisa”, disse.
Vale dizer que a investigação do Cade não levantou dados sobre o uso de inteligência artificial no serviço de indexação de notícias.
Busca e redes sociais
De acordo com estudos apresentados pelo relator, se forem considerados apenas os buscadores gerais – Google, Bing e Yahoo, por exemplo – a participação de mercado do Google estaria entre 70-80% (dados de 2022). Já foi maior (90%), mas reduziu com o tempo. Os outros buscadores – Bing e Yahoo! – teriam cerca de 10% de participação cada. Neste caso, não foram consideradas as redes sociais ou apps de mensageria. Os números consideram somente os fluxos de desktops, não de dispositivos móveis.
Em relação às plataformas digitais, o WhatsApp é o meio mais relevante para a geração de tráfego para portais de notícias. Depois estão o YouTube e o Instagram. E, em seguida, Facebook, Twitter e TikTok.
Sem contar o tráfego a partir dos mecanismos de busca e fazendo um recorte somente com as plataformas digitais, ainda segundo estudos apresentados por Lima, o Google é responsável por gerar de 30% a 68% de tráfego para um site e a mediana está em torno de 44%. “É um número significativo, não é desprezível, mas está longe de ser único ou insubstituível. As outras fontes de tráfego são superiores e isso muda de portal para portal”, explicou.
Esses dados foram gerados a partir de respostas de empresas jornalísticas como BBC, Correio Braziliense, Brasil 247, Diário do Nordeste, Estado de São Paulo, Folha de São Paulo, IG, Antagonista, Crusoé, Metrópoles, O Popular, o Povo, Jornal do Commercio, Terra e Zero Hora e o conselheiro fez uma compilação dos dados, que são sigilosos.
O relator também apresentou um estudo da Deloitte que afirma que o tráfego gerado pelo buscador do Google aos sites de notícia é benéfico e funciona como propaganda gratuita. Segundo dados da empresa de consultoria, um aumento de 10% do tráfego de usuários está associado a um aumento médio de 1,02% das receitas globais dos editores. E o clique em uma notícia e acessar o portal gera uma receita média de 0,04 centavos de euro e 0,06 centavos de euros, respectivamente. Estudo é internacional, por isso o valor em euros.
As entidades de veículos de notícias
As entidades representantes de veículos de mídia defendem a apuração dos efeitos das práticas da big tech, mas também a aplicação de remédios determinados para garantir condições justas de concorrência no mercado digital para o setor. Elas acreditam que o scraping é uma prática danosa e prejudicial por exibir trechos de reportagens que são exibidas no Google News e no seu buscador. A ANJ pede ao Cade o aprofundamento das investigações.