O Brasil na pós-pandemia sairá diferente de quando entrou, mas a situação atual deixou em evidência as desigualdades do País. As cidades inteligentes precisarão ser repensadas para rever não apenas as desigualdades, mas pequenas questões do cotidiano. “Todas as tendências estão suspensas porque a pandemia inverteu as necessidades. E vimos quase como um fracasso das cidades inteligentes”, disse Mauro Calliari, Editor de Caminhadas Urbanas, do jornal Estadão, durante o painel “Cidades inteligentes na pós-pandemia: estratégias essenciais na recuperação econômica na vida das cidades”, no Futurecom Digital Summit, nesta segunda-feira, 22, totalmente virtual. Para Calliari, o fracasso vem do fato de que as cidades brasileiras ainda não pensaram na tecnologia “básica” para serem mais inteligentes, como sensores que identificam quantas pessoas há por metro quadrado em uma determinada região. “Como a gente faz para garantir que as frotas de ônibus continuem funcionando, mas sem aglomeração?”, questionou-se durante o painel.

Para Calliari, é preciso retomar o prumo e pensar na melhoria da qualidade do serviço e pensar no Mobility as a Service, além de integrar os sistemas de transportes – inclusive seus meios de pagamento – e oferecer o serviço que mostra quando chega o próximo ônibus nas paradas. Tudo isso sem parar de pensar na sustentabilidade. “Esse assunto ficou suspenso, mas deve voltar com tudo. Não é possível que carros e ônibus continuem transmitindo CO2 nos níveis atuais. É preciso pensar numa matriz mais sustentável: deslocamentos a pé, com bicicleta, mas também o elétrico”.

Para o jornalista especialista o objetivo de todos seria pensar na redução da desigualdade entre periferia e centro e a mobilidade seria o fator mais simples e óbvio de se mexer. “A pandemia colocou a desigualdade no centro da pauta.”

No entanto, apesar de Calliari pedir pequenos “gestos” por parte dos responsáveis pela concretização das cidades inteligentes, o Brasil esbarra numa carência de infraestrutura muito grande. É o que diz Abraão Balbino, superintendente de comunicação da Anatel: “Mais de 10% da população brasileira vive sem uma infraestrutura de transmissão de telecomunicação que esteja apta a permitir que outros níveis nas camadas de serviços mais avançadas possam chegar. No contexto pós-pandemia, o poder público fica mais carente de capacidade de investimento, mas a recuperação precisa acontecer. Precisamos buscar e criar condições de investimentos a partir de parcerias público-privadas para que a gente consiga vencer esse gap de infraestrutura de conectividade”.

Uma das formas de desenvolver as cidades inteligentes, em especial na retomada da vertical econômica no pós-pandemia, seria usar uma base de dados consolidados para entender o comportamento dos pequenos núcleos das cidades, como os bairros. Ou seja, seria uma forma para entender quais atividades econômicas são fortes por região e organizar em torno dessa economia local ações específicas para estimular a atividade local. É o que pensa Cris Alessi, presidente da Agencia Curitiba de Desenvolvimento e do Fórum Inova Cidades.

“Temos visto que, com isso, vamos superar a questão de mobilidade, trabalhar a micromobilidade, trabalhar as soluções econômicas urbanas, de educação. Para isso, você precisa de uma estrutura urbana, de comércio e moradia, zoneamento que o uso misto do solo se resolva em todas as regiões da cidade. É preciso ter infraestrutura em todas as localidades para diminuir as diferenças entre periferia e centro”, resume. Fazer um planejamento descentralizado com as regiões metropolitanas dos grandes centros, trabalhar a indústria 4.0, apoiar os pequenos comerciantes para eles transformarem seus negócios para o digital”.

Alessi salientou em sua fala durante o painel que a tecnologia é o meio e não o fim. Ou seja, “é necessário fazer o planejamento para a solução econômica e social que seja centrada no cidadão. Ações com soluções de problemas para as pessoas e, a partir disso, usar a tecnologia para fazer essa transformação digital”.