O executivo italiano Carlo Filangieri chegou ao Brasil em outubro de 2012 para comandar a diretoria de redes da TIM. Não poderia ser um momento mais desafiador: a operadora acabara de passar por um período de proibição de vendas por ordem da Anatel em razão da qualidade do serviço prestado e, ao mesmo tempo, começava a planejar a implementação do 4G e a cobertura para eventos como a Copa das Confederações e a Copa do Mundo.

Passado pouco mais de um ano, Filangieri já fala bem Português e concedeu entrevista para MOBILE TIME na qual fala sobre os investimentos da empresa em infraestrutura, comenta sobre o crescimento do tráfego de vídeo e a estagnação do tráfego de SMS e dá a sua opinião sobre neutralidade de rede e sobre possíveis metas de velocidade em vez de cobertura no leilão de 700 MHz. Por fim, faz um alerta sobre a cobertura dentro dos estádios da Copa: as obras de alguns estão atrasadas e as teles precisam de pelo menos três semanas para montar as redes indoor.

MOBILE TIME – A velocidade média da banda larga móvel brasileira ainda é uma das mais baixas do mundo, segundo recente levantamento da Akamai. Por que?

Carlo Filangieri – Nas principais cidades do Brasil, como Rio de Janeiro, São Paulo e Curitiba, acho que não temos grande diferença (em relação à média mundial), porque com 4G podemos chegar tranquilamente acima de 10 Mbps. E na TIM o 3G está sendo desenvolvido com HSPA+ dual carrier, que permite chegar a 4 ou 5 Mbps em movimento, o que significa poder olhar um vídeo com boa qualidade em movimento. A TIM escolheu fortalecer o 3G, além do desenvolvimento do 4G.

Onde  a TIM tem rede dual carrier?

Em todas as principais cidades do país estamos colocando dual carrier . No fim de 2013, nosso dual carrier cobria 30% da população brasileira. E esperamos chegar a 40% este ano. O Brasil é um país enorme, maior que a Austrália. No interior é difícil chegar com capacidade alta.

Para uma rede dual carrier ou 4G é preciso levar fibra às antenas, certo?

A estação precisa estar fibrada ou no máximo ter um enlace de rádio. Hoje, os novos rádios  permitem chegar a 300 Mbps em área urbana. Fechamos 2013 com 39 cidades com FTTS (Fiber to the Site). Em 2014 vamos chegar a 120 cidades. E em 2015, 139 cidades. No interior, onde é possível, estamos tentando chegar com fibra ao ponto mais próximo e depois completamos com rádio para garantir pelo menos 10 ou 20 Mbps. Não dá para ter 100 Mbps, porque depende da área coberta e da densidade.

O pré-pago antigamente era um usuário que quase não usava dados. A TIM mudou isso com a oferta de acesso ilimitado por R$ 0,50 ao dia. Como está hoje o uso de dados pela base pré-paga?

Estamos estimulando muito o uso de dados e Internet móvel pelo pré-pago. Em 2013 a velocidade foi aumentada de 500 Kbps para 1 Mbps. Atualmente, 30% dos clientes pré-pagos usam dados. Investimos mais de US$ 3 bilhões por ano em infraestrutura. Em 2014, 17% do investimento em rede será para 4G (LTE), 75% para 3G e 8% para 2G. No quarto trimestre, 69% das vendas de celulares da TIM foram smartphones. Um ano antes eram 46%. Ou seja, o usuário da TIM está se acostumando a usar smartphones e Internet móvel.

Este ano, a base 3G deve superar aquela de 2G no Brasil. Quando todos os celulares forem 3G, o que será feito das redes 2G?

A rede 2G tem que ser mantida para garantir um bom serviço de voz. Em países europeus onde o 2G é uma tecnologia velha, a rede continua existindo porque garante uma boa cobertura de voz. O tráfego de voz no 2G está estável e no 3G vem aumentando de 40% a 60% ao ano.

Não daria para reaproveitar o espectro de 2G para 4G, o chamado refarming?

Estamos estudando essa possibilidade em algumas localidades. Algumas frequências de 2G poderiam ser muito úteis para o 4G. É o caso de 1800 MHz, por exemplo. Pensamos nessa opção de refarming quando o número de aparelhos 4G for alto. Talvez isso aconteça em 2015, depois que os preços caírem.  Hoje um aparelho 4G custa mais de R$ 1,5 mil.

A TIM está testando o VoLTE (Voice over LTE)?

Sim, apenas em laboratório, por enquanto. Só uma operadora no mundo está usando VoLTE comercialmente. Essa tecnologia ainda não está madura. Os principais fabricantes estão propondo testes.

Quais aplicativos têm consumido mais banda na rede da TIM atualmente? Algum te preocupa?

Vídeo está crescendo muito. Tenho dois consumidores em casa: uma filha e um filho, que usam quase continuamente vídeo. YouTube e Netflix são os apps que consomem mais banda. Em número de acessos o campeão é o Facebook, com certeza, mas o tráfego não é tão alto. Estima-se que em 2017 o tráfego de vídeo vai responder por 66,5% do total no mundo. Hoje é 35%. Esses números valem para a TIM também.

A TIM já identifica uma queda no volume de SMS em função do sucesso de serviços de mensagens OTT?

O SMS se estabilizou e em alguns lugares está caindo, como já aconteceu em outras partes do mundo, porque os jovens estão acostumados a usar WhatsApp, Facebook Messenger e outros apps de comunicação. O que estamos fazendo para é oferecer pacotes com volumes grandes de SMS.

O consumo de dados parece crescer a uma velocidade maior que a capacidade das redes. Como lidar com isso?

No caso de vídeo, as operadoras fazem acordos de peering direto com os principais fornecedores de conteúdo. Assim, a latência é muito menor.  E de outro lado fazemos o caching, que ajuda a baixar rapidamente conteúdos que têm muitos acessos.

Quem é fornecedor da solução de caching da TIM?

É a Cisco. O caching não precisa ser na estação rádio-base. Geralmente está no core da rede e é atualizado a cada minuto com os conteúdos mais acessados.

Qual a sua opinião sobre neutralidade de rede?

Neutralidade de rede é garantir a independência do conteúdo. A operadora não tem que fazer uma distinção entre os conteúdos. É diferente se o cliente ou o provedor pagam a mais e recebem um serviço melhor. É como num avião: se você paga mais, você vai de primeira classe. Mas todo mundo chega ao destino. E ninguém pode te impedir de pegar um avião. Neutralidade é não censurar os conteúdos, à parte daqueles que a própria lei não permite.

O compartilhamento da rede ativa é uma novidade no Brasil. Como está sendo essa experiência com a Oi?

Quando cheguei no Brasil, estávamos discutindo sobre como lançar a rede 4G. Tivemos uma conversa com a Oi sobre a possibilidade de compartilhar. Eu pessoalmente acredito que compartilhamento é uma maneira inteligente para desenvolver uma rede de forma rápida e que respeite o meio ambiente. No 4G estamos evitando um gasto ambiental. Evitamos o descarte de 500 toneladas de lixo. E há uma redução de 37% no consumo de energia, porque o mesmo equipamento gerencia as frequências das duas operadoras, sem dobrar o gasto. Além disso, diminui a poluição visual. Trabalhamos com a Oi há mais de um ano. E estamos também trabalhando com as demais operadoras para aumentar o compartilhamento em geral, não só de cabos, mas de antenas e sites. Em um país de tamanho continental como o Brasil, é fundamental.

Mas não é delicado discutir planejamento de rede com um concorrente?

Não trocamos nenhuma informação de caráter comercial. A cada ano discutimos o plano de cobertura nas cidades. Trocamos somente informações técnicas. Os problemas de ambos são os mesmos. A metodologia técnica é a mesma. Cobrir juntos uma cidade não significa tirar a concorrência. No contrato, cada um tem a possibilidade e liberdade de fazer implementação sozinho se percebe que pode ser útil para o próprio negócio.

A Anatel quer estipular metas de velocidade de banda larga para as licenças de 700 MHz, em vez de cobertura. O que acha disso?

Garantir a cobertura é mais fácil porque se trata de um critério determinístico. Se precisa cobrir o Rio de Janeiro, sabemos quantos sites são necessários. Garantir uma velocidade, em um ambiente estatístico como o móvel, é mais difícil. Temos que discutir o percentual de atendimento. É impossível ser 100%. Em um evento com 1 milhão de pessoas em uma área restrita, não tem como garantir alta velocidade para todos. Mas pode ser útil discutir sobre esse assunto.

A TIM chegou a ter suas vendas proibidas pela Anatel dois anos atrás por causa de problemas na qualidade do serviço e depois foi acusada de derrubar ligações de propósito. O que foi feito desde então em rede para reverter essa imagem negativa e como garantir que isso não vai acontecer de novo?

Quando cheguei estávamos discutindo esse problema. A TIM fez um bom trabalho com a Anatel e adotou um plano pesado de desenvolvimento, que estamos acompanhando a cada mês. Os resultados são bons. Os indicadores estão melhorando muito. Acreditamos que a qualidade seja a melhor alavanca para conquistar os consumidores. Estamos melhorando em todos os principais indicadores da Anatel.

Como estão conseguindo isso?

Não existe uma resposta única. Tem que trabalhar sobre cada aspecto: fibra, mais antenas, qualidade de operação e manutenção, melhorar a parte de rádio etc.

Como estão os preparativos para garantir a qualidade da comunicação nos estádios durante a Copa do Mundo?

Usamos muito a experiência na Copa das Confederações, que está ajudando a melhorar todos os sistemas em todos os estádios, em um trabalho conjunto com as outras teles. O problema é que temos estádios que não estão prontos. E só deixam as teles entrarem depois que as obras estão quase terminadas.

De quanto tempo as operadoras precisam?

Precisamos de pelo menos três a quatro semanas.

E nos aeroportos, como está?

Há gestores de um aeroporto que estão pedindo para as teles um valor de aluguel impossível. Não posso dizer qual é, mas estão pedindo mais de dez vezes acima da média.

A TIM vem investindo em Wi-Fi para desafogar sua rede 3G. Como está esse projeto?

Wi-Fi é uma tecnologia incrível, porque tem custo por Mb menor que qualquer outra. Desde que introduzimos a autenticação automática vemos que de 10% a 15% do tráfego do móvel está passando para Wi-Fi nos locais onde temos hotspots.

Quantos hotspots a TIM tem hoje?

Temos entre 700 e 1 mil hotspots, se considerar indoor e outdoor. Devemos superar 1,5 mil em 2014.

Carlo Filangieri, diretor de redes da TIM Brasil