Há grandes empresas de conteúdo que ainda não descobriram como fazer dinheiro em mobilidade. Para o presidente do Google e do IAB no Brasil, Fábio Coelho, não há razão para preocupação: a monetização com esse canal é uma questão de tempo. O executivo conversou com Mobile Time na semana passada, durante evento sobre publicidade móvel realizado pelo IAB em São Paulo. Coelho analisou o atual estágio do mercado brasileiro de mobile advertising, falou sobre o avanço do Android e relembrou que na década de 80, quando queria estudar nos EUA, precisou sair de Vitória/ES para vir ao Rio de Janeiro colher informações sobre universidades norte-americanas na biblioteca do consulado daquele país. "Hoje em dia a informação está na palma da mão", compara. Leia abaixo a entrevista, que contou também com a participação do diretor de comunicação do Google, Felix Ximenes.

Mobile Time – Algumas empresas nascidas na Internet, como o Facebook, ainda não descobriram como gerar receita em mobilidade. Não é o caso do Google, que trabalha com publicidade móvel e tem uma loja de aplicativos móveis…

Fábio Coelho – Não vejo como um problema [não ter receita com mobilidade], mas como um estágio de mercado. Isso ocorre com qualquer ecossistema no qual as condições de oferta e demanda ainda não se normalizaram. Isso também ocorre com o Google e com qualquer plataforma onde o ambiente móvel está sendo conhecido. Para a gente o mobile ainda representa uma pequena participação, que estimo entre 6% e 10% do nosso tráfego geral no mundo, mas que vem crescendo bastante. Vou dar um dado da indústria, não do Google: dependendo da data festiva e do momento, as buscas móveis em determinadas categorias já são iguais ou maiores que aquelas feitas em desktop.

Poderia dar um exemplo?

No Valentine´s Day, ou dia dos namorados, a quantidade de buscas de presentes na última hora aumenta muito. Buscas por hotel também: se você está em um lugar e não tem hotel para aquela noite, ficará sem um teto para dormir. Geralmente, você começa tentar reservar um hotel 30 dias antes, ou 15 dias antes da viagem, a partir de um desktop. Só no último dia de buscas você usa um dispositivo móvel. Ou seja: são situações diferentes, contextos diferentes e momentos diferentes. E o mercado publicitário está acordando cada vez mais para essa realidade. Aqui no Brasil, o tráfego móvel cresceu 30 vezes nos últimos dois anos. Isso mostra que as operadoras estão com planos mais competitivos, os usuários estão navegando mais durante o dia e há mais devices disponíveis: atualmente são quase 30 milhões de smartphones ativos no Brasil. Todos estão olhando para mobilidade e daqui a pouco a questão de geração de receita vai se normalizar.

As duas principais fontes de receita do Google com mobilidade são publicidade móvel e a loja de aplicativos?

Há a publicidade móvel, através da plataforma AdSense, para vídeo e para texto (links patrocinados), e há toda a experiência com outros conteúdos, como redes sociais, que por enquanto não são monetizados. No Orkut era. No Google+ não é, mas em algum momento será. O que vai decidir esse momento será a nossa capacidade de encantar o usuário e de conseguir criar uma experiência de publicidade que agregue valor, que não seja tão intrusiva.

Qual é o volume atual de impressões móveis do Google no Brasil?

Estamos registrando um crescimento forte. Não é mais uma fantasia de algo que vai se materializar no futuro. Do ponto de vista do usuário, já é uma realidade. Do ponto de vista de receita publicitária, vai demorar um pouquinho, mas vai acontecer.

Uma das dúvidas mais comuns entre as empresas é escolher entre um app ou um site móvel.  O que você recomenda?

Eu recomendo os dois. É aquela discussão: se você encontra uma nota de R$ 10 e uma de R$ 5 no chão, qual você pega? As duas, claro. Em um ambiente de recursos limitados, pode haver essa dúvida. Mas não é o caso das grandes empresas. O investimento é pequeno para você ter o seu conteúdo disponibilizado no maior número de plataformas possível. A gente acredita que as plataformas se alavancam entre si. Hoje, por exemplo, falando em empresas de mídia, há o aplicativo do jornal "O Globo" no Google+. No mês passado ele tinha 100 mil pessoas seguindo essa página. Agora já são 175 mil. É um canal a mais de divulgação, onde o Globo publica seus vídeos. Hoje em dia, as empresas de produção de conteúdo não deveriam prescindir de nenhum canal de distribuição, seja um canal estacionário, seja um canal móvel. As pessoas estão consumindo informação de maneira mais fragmentada, mais vezes ao dia. Nosso consumo de informação aumentou muito. Mas é um consumo de "nuggets" de informação e a monetização acontece de forma mais dinâmica e sofisticada do que dez anos atrás, quando a receita vinha na forma de banners ou de propaganda estática.

Como está a relação entre oferta e demanda de espaço publicitário em dispositivos móveis no Brasil hoje? Temos excesso ou falta de inventário móvel atualmente?

Essa discussão precisa ser segmentada. Temos bons portais e ambientes onde há publicidade em espaços pequenos não contextualizados e aí a publicidade móvel não funciona tão bem quanto poderia funcionar, que é quando a gente une todo conteúdo servido por toda e qualquer plataforma, seja de notícia ou de diversão, com tecnologia. A grande mudança que ocorreu com a Internet nos últimos cinco anos foi que os banners começaram a ter um componente de tecnologia que permitiu entregar somente a publicidade certa para a pessoa certa, de maneira mais inteligente, através de ferramentas de segmentação, de remarketing, de geolocalização etc. E há mais um elemento nessa questão, que é a chegada das adnetworks móveis ao Brasil, cada vez mais fortes e presentes. Em vez de discutir se há muito ou pouco inventário, prefiro uma discussão sobre como a gente pega o inventário disponível no brasil e faz com que ele seja monetizado da melhor maneira possível para devolver ao ecossistema, para que as pessoas que geram o seu conteúdo possam ser remuneradas por isso, desde o pequeno, lá na cauda longa, passando pelo médio, que está no dorso, até quem está lá na cabeça da nossa curva de acessos. No passado trabalhávamos muito com os grandes players. Agora cada vez mais a barreira entre produção e consumo de conteúdo está caindo.

Boa parte da publicidade móvel é para divulgar outros produtos móveis, outros apps. Parece que essa mídia fala para si mesma.  Que setores ainda não descobriram essa mídia, mas teriam potencial para investir nela? E por que ainda não anunciam?

Não anunciam porque é algo novo. As pessoas estão em processo de entendimento desse canal, como canal de comunicação e de transação. Tudo que é novo enfrenta certa inércia antes de se transformar em corrente, em mainstream.  O brasileiro é supercurioso. Eu vejo um pouquinho de cada setor atuando em mobilidade. Tenho exemplos muito bons, desde o setor imobiliário, passando pelo setor financeiro etc. Precisaria fazer uma análise mais aprofundada para poder apontar um ou outro setor que esteja mais atrasado. Posso dizer que o varejo está na frente, porque é mais orientado a performance e tem gente com um embasamento tecnológico mais forte, o que o ajudou a pular na frente. Mas acho que com o tempo haverá lugar para todo mundo. É questão de tempo.

Qual é a participação do Android hoje nas vendas de smartphones no Brasil? Quantos usuários Android há no País?

Não tenho esse número de base instalada, mas sabemos que o Android representa atualmente mais de 50% das vendas de novos smartphones no Brasil.

No mundo, Android e iOS concentram cerca de 80% das vendas de smartphones atualmente. O que acha das tentativas de se criar um terceiro player? Há espaço para Windows Phone, BlackBerry 10 e outros, na sua opinião?

Sempre tem espaço, desde que estabeleçam uma noção de valor adequada que leve em conta a necessidade de um determinado segmento do mercado. Essa é uma resposta genérica, mas que vale para qualquer indústria. Tem espaço para cinco operadoras no Brasil?

Tem gente que diz que não…

É, mas eu acho que tem. Há a Nextel fazendo um bom trabalho, a TIM com uma estratégia bastante coerente, e Oi, Claro e Vivo com outros posicionamentos. O mesmo vale para sistemas operacionais. Quem decide é o usuário final.

Felix Ximenes  – Um bom exemplo é o Chrome. Quando surgiu, todo mundo dizia que não haveria espaço para mais um navegador web. Agora temos quatro no mercado: Explorer, Safari, Firefox e Opera, fora outros menores. Acabou havendo espaço.

Fábio Coelho – E estamos falando de outras empresas que são extremamente respeitáveis, que são a RIM e a Microsoft. Está nas mãos deles criar um espaço de mercado para continuar se mantendo relevantes.

Empresas de antivírus vêm alertando frequentemente para o aumento na quantidade de códigos maliciosos descobertos para Android. Este é o preço de ter uma plataforma aberta?

Felix Ximenes – A questão do Android é muito sensível. As empresas de antivírus estão vendendo o peixe delas: criam o medo para criar a solução. Não há registros de grandes invasões ou roubos por uma falha do sistema. Já identificamos e punimos aplicativos maliciosos, mas que não exploravam uma fragilidade do sistema.

Talvez haja uma fragilidade na loja de aplicativos…

Felix Ximenes – Pode ser uma fragilidade do nosso modelo aberto de loja. Mas é um modelo que privilegia o pequeno desenvolvedor. Temos que jogar o jogo de identificar rapidamente esses abusos e excluí-los. Não é uma fragilidade específica do nosso sistema operacional.

O que acha da tendência de substituir o processamento no terminal pelo processamento em nuvem? O Chrome substituirá o Android no futuro?

Fábio Coelho – Processamento na nuvem é maravilhoso. Juntos nós somos melhores e podemos ser mais rápidos, mais ágeis, guardar maior quantidade de informação e tê-la disponível onde a gente quiser, quando a gente quiser e no dispositivo que a gente quiser. Isso tem um valor impressionante para a sociedade. Juntos nós colaboramos mais. Quando se fala de Google Apps e Google docs há uma capacidade de colaboração que é uma revolução social que as pessoas não entenderam ainda. Podemos criar juntos, estudar juntos, resolver problemas juntos. Quanto à questão de Chrome e Android, isso a gente não discute no Brasil, porque não está na nossa pauta. Não dá nem para especular.

Recentemente o Google Play incluiu a possibilidade de venda de assinaturas in-app. No Brasil, como é a proporção de receita entre vendas in-app e vendas de downloads?

Não temos esse dado.

O Google concluiu recentemente a compra da Motorola Mobility. Haverá algum tipo de integração entre as equipes das duas empresas no Brasil ou as operações se manterão completamente separadas?

A princípio são empresas separadas que vão ser tratadas como empresas separadas. Só não sei até quando.

Teremos um tablet do Google, algo como o Nexus? Quando ele chegará ao Brasil?

Felix Ximenes – Assim que chegar o telefone do Google. (risos) É bem claro para a gente: o Google não pretende produzir hardware, embora a compra da Motorola possa parecer o contrário.

Mas podem pedir para alguém fabricar e botar a marca Google, como aconteceu com o Nexus…

Felix Ximenes – Exatamente. O que fazemos é criar produtos-conceito, que mostram a possibilidade da tecnologia, a possibilidade de inovação.

Para concluir: quais são as perspectivas para o mercado de publicidade móvel no Brasil nos próximos anos e o que podemos esperar de novas ferramentas móveis do Google?

A adoção pelos usuários e pelos anunciantes vai evoluir. Assim como vai evoluir o entendimento de tudo o que esse mercado pode fazer. Vai evoluir a qualidade da nossa publicidade, que será mais contextualizada, localizada e segmentada, o que até agora não podemos fazer na web em desktop. E o Google pode colaborar nesse sentido trazendo ferramentas e plataformas que ajudem esse mercado. Queremos que o mundo mobile seja completo e que não precise estar amarrado apenas no pilar do conhecimento estacionário. Queremos que o conhecimento esteja com as pessoas, pois, como bem diz o Leo Xavier (presidente do Grupo.Mobi): móvel é o usuário, não o celular. O meu sonho, na década de 80, quando comecei a trabalhar em Vitória/ES, era estudar nos EUA. Para buscar informação sobre as universidades onde poderia ingressar eu tinha que ir ao consulado dos EUA no Rio de Janeiro e entrar na biblioteca, que  abria de 13h às 16h. Isso foi há 30 anos. Hoje em dia a informação está ao alcance da mão. Nós ajudamos a disponibilizar a informação, o conhecimento, que não é nosso, mas pertence à sociedade.