A complexidade do tráfego de Internet dificultaria o cálculo objetivo e justo de uma tarifa por uso de redes de telecom, o chamado “fair share”, ou “network fee”. Este é um dos argumentos presentes em um extenso documento elaborado pela consultoria SmC+ a pedido da Aliança por uma Internet Aberta na América Latina e Caribe (AIA-LAC).

Um gráfico apresentado no documento demonstra essa complexidade (veja abaixo). Uma solicitação de acesso a um conteúdo por parte de um dispositivo móvel passa por intrincado trajeto de pontos de rede, em que a infraestrutura móvel é apenas uma pequena parte, pois abrange também backbones, data centers, CDNs, IXPs e cabos submarinos.

fair share

Fonte: AIA-LAC e SmC+

O caminho mistura infraestruturas de diferentes atores, o que torna difícil medir a proporção do tráfego móvel e do tráfego fixo. O relatório aponta a existência de divergências dependendo de quem faz o cálculo e a metodologia utilizada. Enquanto a UIT estimou que 81% do tráfego de dados em 2023 passou por redes fixas e 19% por redes móveis, um estudo da Sandvine relativo ao mesmo ano estimou em 67% e 33%, respectivamente. As estimativas de volume total de dados trafegados também variam: a UIT calculou em 14 EB por dia e a Sandvine, em 33 EB por dia.

“As medições que vemos sendo reportadas pelas operadoras móveis são certamente uma visão muito limitada e restrita do tráfego total que circula e que é trocado dentro de um país em um dado momento. Elas certamente ignoram muitas dinâmicas da banda larga fixa, o papel dos pequenos provedores, dos pontos de troca de tráfego (IXPs), dos acordos de peering e de trânsito, das CDNs e assim por diante. De certa forma, isso revela uma espécie de olhar autocentrado sobre a internet e o papel que cada um exerce dentro do ecossistema”, escrevem os autores do relatório.

Outros argumentos da AIA-LAC contra o fair share

O relatório da AIA-LAC também traz outros argumentos contra o fair share, como a ausência de relação direta entre Capex das operadoras móveis e aumento do tráfego móvel ao longo dos últimos anos. Enquanto o investimento das teles na América Latina se manteve relativamente estável em torno de US$ 11 bilhões por ano entre 2016 e 2024, o Capex por EB caiu de US$ 1,2 bilhão para US$ 165 milhões. E a projeção é diminuir para US$ 62 milhões em 2030.

A entidade também argumenta que o faturamento das teles latino-americanas continua crescendo ano a ano e que a margem Ebitda se mantém em um nível saudável, acima de 30% em países como Brasil, Uruguai e Paraguai.

Por fim, aponta a contradição de as operadoras reclamarem do tráfego excessivo concentrado em alguns poucos aplicativos, como aqueles da Meta e do Google, mas ao mesmo tempo estimularem esse tráfego por meio de ofertas de zero rating para o consumidor final.

“Tarifas de rede não fazem sentido”

Um dos autores do relatório é Sebastián Cabello, ex-diretor da GSMA para América Latina.

“O mais importante (no relatório) é que tarifas de rede não fazem sentido”, declara Sebastián Cabello, em conversa com Mobile Time.

“As teles têm margens grandes, fizeram muito dinheiro em sua história e agora precisam se transformar através da inovação e encontrando novas formas de adicionar valor ao seu negócio”, acrescentou.

“As teles desintegraram seu negócio e tornaram realidade a profecia de virarem ‘dumb pipes’. Elas viraram dumb pipes: basta ver seus planos de telefonia celular”, concluiu.

 

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