|Mobile Time Latinoamérica| O crescimento das plataformas OTT (Over The Top), que englobam serviços de vídeo, mensagens e aplicativos de áudio, transformou a forma como os colombianos consomem conteúdos e serviços.

Esse fenômeno impulsionou a demanda por Internet com maior capacidade e velocidade, mas, segundo a Comissão de Regulação das Comunicações (CRC), órgão regulador de telecom na Colômbia, não comprometeu a estabilidade da rede nem existem fundamentos técnicos para cobrar das plataformas pelo seu uso.

É o que revela o Estudo de Plataformas de Serviços Digitais OTT 2024, apresentado pela entidade, que oferece uma radiografia do ecossistema digital e reacende um debate que envolve operadoras, associações internacionais e gigantes da tecnologia.

Entidades como Asomóvil, ASIET e GSMA comemoraram os resultados do estudo, mas insistem que o debate deve acontecer na Colômbia e garantir equilíbrio no uso das redes no país.

Constatações da CRC: mais consumo, sem congestionamento
A análise, que explora a interação entre usuários, operadoras de telecomunicações e plataformas digitais, confirma uma relação de benefício mútuo: as OTT impulsionam o consumo de dados, as operadoras fornecem conectividade e os usuários acessam uma maior diversidade de serviços e conteúdos.

Entre as principais descobertas, destacam-se:

  • Crescimento controlado: o tráfego de dados passou de um crescimento anual de 103% em 2021 para apenas 10,1% em 2024, refutando o temor de um colapso iminente.

  • Infraestrutura mais eficiente: grande parte do tráfego circula por meio de caches e acordos de local peering, impulsionados pela expansão de data centers no país.

  • Desigualdades regionais: a infraestrutura digital ainda está concentrada nas grandes cidades, o que limita a qualidade do serviço em áreas periféricas.

  • Hábitos dos usuários: a penetração dos smartphones atingiu 88% em 2024; o WhatsApp é o aplicativo mais usado, enquanto Netflix e Disney+/Star+ lideram entre os de vídeo.

No consumo, 32% dos maiores de 15 anos acessam plataformas de vídeo, enquanto no áudio, 92% não pagam assinatura, embora Spotify (47%) e YouTube Premium (23%) dominem entre os que pagam.

“A evidência mostra que o crescimento do tráfego é previsível e parte natural do planejamento das redes”, afirmou Lina María Duque Del Vecchio, comissária e diretora executiva (interina) da CRC.

A CRC enfatizou, porém, que não há evidências que relacionem o crescimento do tráfego de dados com investimentos imprevistos por parte das operadoras, o que invalida fundamentos técnicos para que plataformas OTT paguem pelo uso das redes. “O crescimento do tráfego é considerado previsível e parte natural do planejamento das redes”, destaca o documento.

Asomóvil: modelo financeiro “inviável” sem contribuição justa

Embora a CRC descarte a congestão como risco, as operadoras, representadas pela Asomóvil, afirmam que o debate não deve ser encerrado. “É preciso reconhecer que a CRC reitera sua competência para regular os grandes geradores de tráfego. Hoje, temos um ecossistema mais amplo, mais complexo, mas o campo de jogo está desequilibrado”, disse Samuel Hoyos, presidente da Asomóvil, ao Mobile Time Latinoamérica.

A entidade aponta que o estudo confirma um desequilíbrio insustentável: enquanto as operadoras estão sujeitas a exigências de investimento, pagamento de espectro e cobertura, as plataformas não enfrentam as mesmas obrigações regulatórias.

“É como se, numa concessão rodoviária, os caminhões mais pesados circulassem eternamente sem pagar pedágio, sob o argumento de que o concessionário sempre fará a manutenção. Esse modelo é insustentável”, disse Hoyos.

Segundo a Asomóvil, as operadoras investiram mais de 55 trilhões de pesos colombianos nos últimos sete anos, mesmo com a receita por usuário tendo caído 70% na última década.

Por isso, defendem um modelo de “Fair Share” ou contribuição justa, no qual os grandes geradores de tráfego (Netflix, Meta, Alphabet, TikTok, Disney e Microsoft, que concentram mais de 73% do tráfego móvel) compartilhem parte dos custos das redes.

“Precisamos de uma regulação que distribua bem as cargas entre todos os atores do ecossistema. Cargas mais leves, mas melhor distribuídas entre operadoras, OTTs, os que implantam infraestrutura e todos os que usam a rede”, enfatiza Hoyos.

GSMA: regulação com visão de ecossistema

A GSMA também celebrou o estudo da CRC, considerando-o um passo importante para o reconhecimento da assimetria de investimentos e obrigações entre plataformas e operadoras.

“O crescimento exponencial do tráfego de dados, impulsionado principalmente por um número reduzido de plataformas, exige investimentos massivos apenas para manter a qualidade do serviço. Esses recursos limitam a expansão para áreas remotas”, afirma a organização.

Em conversa com o Mobile Time Latinoamérica, durante o Andicom 2025, Lucas Gallitto, diretor para a América Latina da GSMA, reiterou a importância de equilibrar as responsabilidades entre operadoras e grandes plataformas. “Não há vilões ou heróis nesta história. Temos uma realidade que já não funciona para toda a cadeia da internet.”

Para Gallitto, é preciso discutir regras do jogo mais justas para todos os envolvidos no ecossistema: “O que estamos propondo é como vamos financiar as redes do futuro. O modelo atual está no limite”, afirmou.

Segundo a GSMA, a regulação deve ser antecipatória, não reativa: “As mudanças regulatórias não devem esperar consequências negativas, mas ser instrumentos com visão de futuro”.

ASIET pede uma regulação mais justa

A Associação Interamericana de Empresas de Telecomunicações (ASIET) destacou o estudo da CRC, afirmando que o diagnóstico revela a urgência de enfrentar a sustentabilidade financeira das operadoras de telecomunicações.

Segundo a ASIET, enquanto as empresas de conectividade enfrentam altos custos regulatórios, de espectro e impostos, suas receitas se deterioraram desde 2010, em contraste com o crescimento sustentado dos provedores OTT, cujas receitas por usuário saltaram de US$ 17 em 2017 para US$ 80 atualmente.

A entidade ressalta que essa situação gera “assimetrias regulatórias” que comprometem a capacidade de investimento em infraestrutura. Por isso, valorizou o primeiro passo da CRC em ajustar o marco regulatório ao novo ecossistema digital e reiterou a necessidade de que todos os atores, inclusive as plataformas OTT, assumam corresponsabilidade no futuro digital da Colômbia.

Um debate aberto

O estudo da CRC marca um marco na compreensão do ecossistema digital colombiano, mas, longe de encerrar o debate, o amplia. Enquanto o regulador insiste que não há base técnica para cobrar das plataformas pelo uso da rede, operadoras e entidades internacionais alertam que o modelo atual é financeiramente insustentável e limita a redução da desigualdade digital.

Após a publicação do estudo, a CRC anunciou quatro linhas de ação: revisar a definição de acesso à infraestrutura digital, ajustar o regime de reporte de informações, estudar mecanismos para que os usuários evitem conteúdos não solicitados e trabalhar com o MinTIC na proteção de menores.

 

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