A Xiaomi voltou ao Brasil em junho do ano passado, em uma parceria com a DL. Desde então, vem construindo uma comunidade de usuários que são fãs da marca, consumindo não apenas seus smartphones e acessórios inteligentes, mas também uma série de outros produtos, de patinetes a guarda-chuvas, passando por mochilas, balanças e até chopeiras. O catálogo, que era composto por 260 SKUs na virada do ano, deve chegar a 500 no fim de 2020, revela o head da Xiaomi no Brasil, Luciano Barbosa, em entrevista para Mobile Time. A diversidade só é possível por conta do enorme catálogo global da marca e pela importação dos produtos. Mas a companhia não descarta a produção de smartphones no Brasil: um estudo encomendado pela empresa para analisar as vantagens e desvantagens dessa decisão será concluído em maio. Confira abaixo a entrevista de Barbosa.

Mobile Time – Qual o seu balanço desses primeiros oito meses meses de operação após o retorno da Xiaomi no Brasil?

Luciano Barbosa – É bastante positivo. Entramos com portfólio de produtos relativamente expressivo: sete smartphones e 100 produtos do nosso ecossistema. Desde então, triplicamos a quantidade de produtos. O gosto do brasileiro é bastante variado. Ao mesmo tempo que tenho consumidores loucos por tecnologia, tenho alguns que nos procuram e acabam comprando um guarda-chuva ou uma caneta. Tenho um bom exemplo para ilustrar isso: a venda de mochilas está sendo extremamente positiva agora com a volta às aulas. Nossa meta é levar o consumidor para conhecer nossos produtos. E o brasileiro gosta de pôr a mão no produto. Temos agora mais de 2,5 mil pontos de venda onde as pessoas conseguem tocar em nossos produtos.

Quais os maiores desafios enfrentados nesses primeiros meses?

O primeiro desafio é vencer a inércia. Tivemos que mostrar para o varejo que o consumidor quer outras marcas, tanto Xiaomi quanto outras. Acho que há espaço para outras marcas de smartphones nas nossas prateleiras. Hoje há duas com maior share de mercado e isso não é comum em nenhum lugar do mundo, só em países fechados. Em países com fronteiras mais abertas há presença maior de marcas e empresas. Quem fornecer produtos melhores ganha o consumidor final. O segundo desafio é expandir… Vou botar balcões em vários varejos: tenho que construir, mandar entregar, isso é um desafio de logística. E tem o “custo Brasil”, que é outro desafio. As pessoas veem o preço lá fora e comparam com o preço daqui. Isso acontece com outras marcas também, mas no nosso caso é um desafio grande porque a Xiaomi é conhecida pela boa relação custo-benefício. Ainda consigo ser melhor que meus concorrentes nesse aspecto, mas em relação à expectativa do consumidor é um desafio para a gente. E tem também o desafio da venda online: me comprometi em lançar o marketplace no fim de julho, mas como nossa logística vinha de Minas Gerais para São Paulo ou qualquer outro local, o prazo de entrega não estava sendo uma boa experiência. Agora estamos com centro de distribuição em São Paulo e entregamos em D+0 ou D+1. Inauguramos ele em novembro e veio a Black Friday para validar a operação.

Luciano Barbosa, head da Xiaomi no Brasil

Quais as metas para 2020?

Como iniciamos a operação no meio do ano passado, nosso plano é meio americanizado: estamos entrando no nosso segundo semestre agora, e não no primeiro. A meta até 31 de maio, como foco número 1, é gerar experimentação de produtos. Entramos recentemente nas Casas Bahia, que é enorme player de varejo tanto para nossos smartphones como para os demais produtos. Pernambucanas também. Então estamos atingindo nossa meta de experimentação. E o foco número 2 é aumentar o portfólio, já que o brasileiro gosta de tudo um pouco. Acabamos de lançar duas chopeiras! E nosso terceiro foco é aumentar as vendas online. Para isso, estamos melhorando a estrutura de e-commerce.

Quantos produtos a Xiaomi tem em seu portfólio no Brasil?

Tínhamos 260 SKUs na virada do ano. Até o final de 2020 serão 500 SKUs. Depois de maio vamos definir um reajuste de portfólio. Vamos entender o que deu mais certo e menos certo para ajustar para o segundo ano de operação.

Na China, qual é o tamanho do catálogo da Xiaomi?

Na China temos mais de 2 mil itens. E entre eles tem até carro e moto.

Todos os produtos vendidos no Brasil são importados?

Sim, escolhemos todos do catálogo global e é tudo importado.

Quantos smartphones venderam até agora no Brasil?

A empresa não abre o número de unidades vendidas. Trabalhamos até hoje com 16 modelos de smartphones, cada um com três cores. Hoje estamos com14 modelos à venda no Brasil

Quantos novos modelos serão lançados em 2020?

Não tenho o número atualizado de quantos vamos lançar, por conta da questão do 5G, que é uma indefinição, pois no Brasil não tem rede ainda. Mas posso dizer que devemos lançar pelo menos 10 modelos este ano.

A maioria dos seus concorrentes trabalha com um portfólio enxuto de modelos de smartphones. Qual a vantagem de atuar com um catálogo tão diversificado?

O portfólio diversificado é o nosso ponto forte. Quando se produz no Brasil é preciso configurar a linha de produção, o que envolve maquinário, equipamentos etc. Dá trabalho configurar 15 modelos. É bastante complicado. Como eu importo, tenho a facilidade da produção lá fora e posso ter uma variedade grande. Em termos de cores, muitas marcas ainda apostam em aparelho preto ou cinza espacial, com uma ou outra variação. Nós lançamos produto verde e foi um estouro de vendas! Tem modelo em que a versão vermelho vende mais que a preta. Tem público para tudo. E o público brasileiro é muito diversificado.

Por outro lado, a alta do dólar atrapalha quem importa…

A alta do dólar afeta todo mundo. Sobe para a gente, sobe para todos. No meu concorrente direto, sobe o preço da matéria prima. No meu caso pesa direto no preço de venda. Quem acaba sofrendo é quem está na ponta. Mas entendemos que o dólar alto vai impactar todas as marcas.

Há planos de fabricação no Brasil?

Temos um estudo com previsão para conclusão no final de maio. Se houver convergência em certos modelos, poderemos produzir localmente. Mas será um estudo bem pé no chão. Não moveria todo o meu catálogo para produção local do dia para a noite, mas gradativamente.

Essa produção local poderia começar este ano?

O estudo ainda está em andamento. É possível fabricar ainda este ano se o estudo mostrar necessidade de produção local.

Como a Xiaomi lida com a importação direta feita pelo consumidor?

O consumidor quer escapar do “custo Brasil”, mas corre o risco de ser taxado na alfândega quando o produto chega. São dois os impactos negativos para o consumidor: 1) o produto pode vir com tecnologia diferente daquela usada no Brasil, como as frequências de 4G ou o plugue da tomada; 2) falsificações de aparelhos, principalmente fones de ouvido, pulseiras e patinetes. De todo modo, a lei permite a importação direta. Alguns consumidores vão se sentir felizes, mas a maioria não. No longo prazo, a compra no mercado local vai aumentar e a internacional será reduzida.

As lojas no Brasil estão entre aquelas da Xiaomi que tiveram maior sucesso em sua inauguração no mundo. Hoje há duas em São Paulo. A empresa tem planos de abrir novas lojas em outras cidades neste ano?

A loja do Ibirapuera foi aberta em 1º de junho do ano passado com 5 mil pessoas no primeiro dia e 2 mil no segundo. E aquela do Center Norte recebeu 5,5 mil pessoas no primeiro dia. O engajamento do brasileiro com a marca é bastante agressivo. Temos planos de expansão para outros estados em 2020. Estamos fazendo alguns testes, validando informações. Dentro do Brasil cada estado é um país, com diferenças de tributação. Mas com certeza estaremos com lojas fora de São Paulo neste ano.

Entre os produtos que não são smartphones, quais têm melhor performance em vendas?

São os fones de ouvido e as pulseiras. São líderes absolutos. E agora em janeiro tivemos uma grata surpresa com um crescimento imenso da balança. Ainda bem que fizemos um bom estoque do produto. Quando vi os números achei até que estavam errados. Bateu nosso top 3. As lâmpadas ficam em quarto e os repetidores Wi-Fi, em quinto.

Na China a Xiaomi tem uma loja própria de aplicativos móveis. Pretende trazê-la para o Brasil?

Aqui utilizamos a Play Store, do Google. Entendemos que o consumidor está acostumado com ela. Não temos intenção de trazer nossa loja própria de apps para cá.

Na China, a Xiaomi está em permanente contato com sua base de usuários, cujos feedbacks contribuem para o aperfeiçoamento de sua interface no smartphone. Pretendem aprofundar essa relação com os consumidores brasileiros?

A Xiaomi nasceu fazendo software. Em 2010, quando Android ainda começava, ela criou um recurso novo atrás do outro e depois fez seus smartphones. Esses feedbacks dos usuários chineses acontecem até hoje. O pessoal de desenvolvimento de produtos tem encontros semanais para conversar com fãs nas redes sociais. O próprio CEO conversa. Os recursos criados a partir desse contato são sensacionais. Muitos foram copiados pelo Andorid e outros depois. É um grande diferencial nosso. Acho que se um dia eu tiver outro smartphone estranharia. Quando pedalasse com minha mulher teria que levar dois celulares para desbloquear duas bikes. Na Xiaomi posso duplicar um app e botar duas contas num celular só. Também posso dividir a parte profissional da pessoal com um clique.

No Brasil temos um pessoal que gerencia as mídias sociais coletando sugestões. Mas não temos encontros com fãs ainda. Isso deve começar a acontecer neste primeiro trimestre ou, no máximo, em abril.