A Política Nacional de Data Centers, o Redata, é vista como o primeiro passo para que o país se transforme numa referência global para a instalação de centros de dados. Mobile Time ouviu especialistas, advogados, empresas e entidades para entender quais são os pontos positivos e os preocupantes da medida provisória apresentada nesta quarta-feira, 17.

Reinaldo Roxo, TechSales Data&AI da IPNET by Vivo, por exemplo, aponta três aspectos para serem observados:

– A exigência de que parte do serviço seja voltado para o mercado interno é importante, mas não garante que os dados fiquem no Brasil;

– Segurança e compliance. O texto é genérico sobre requisitos de segurança, criptografia e conformidade com a LGPD, o que pode abrir brechas para empresas operarem com padrões abaixo do ideal.

– Atratividade real para big techs. Os incentivos são bons, mas o Brasil ainda enfrenta desafios como o custo alto de energia, burocracia regulatória e insegurança jurídica.

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Reinaldo Roxo, TechSales Data&AI da IPNET. Foto: divulgação

“A isenção tributária do Redata é um passo muito importante, mas sozinho ele não é suficiente. Resolve o primeiro o problema, que é a barreira de entrada. Diante do custo que a gente tem com servidores e tudo mais, cortar o IPI, PIS e COFINS certamente representa uma economia muito grande no Capex e torna o país mais competitivo comparado a outros países, como Chile, México, Colômbia, entre outros. Mas a gente ainda tem algumas barreiras para a instalação local de data centers”, afirma Roxo.

Para o executivo do IPNET, entre os entraves estão: energia elétrica cara e instável; burocracia; insegurança jurídica; falta de infraestrutura em regiões estratégicas; e demora na regulamentação. “A isenção vai abrir a porta, mas a decisão de entrar vai depender do pacote completo”, acrescenta.

João Paulo Cavinatto, sócio de direito tributário do Lefosse, escritório de advocacia, acredita que o programa deixa alguns pontos em aberto, como critérios de sustentabilidade e definição de similaridade para a concessão de benefícios para as importações.

Cavinatto aponta que a isenção tributária não é suficiente para atrair e estimular que empresas se instalem no país. Inclusive, um dos obstáculos observados por ele com investidores e empresas também é fiscal, mais especificamente o ICMS, por não estar contemplado no Redata.

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João Paulo Cavinatto, sócio de direito tributário do Lefosse. Foto: divulgação

“Para garantir a eficiência da iniciativa é fundamental que estados (e, talvez, municípios, no que tange tributos municipais) criem programas semelhantes e coordenados para garantir uma efetiva redução do custo fiscal e segurança jurídica”, diz.

 Alerta

A descentralização e o estímulo para que se instalem data centers nas regiões norte, nordeste e centro-oeste do país pode ser positiva para estimular a inovação e o desenvolvimento regional, segundo Raphael Gomes, sócio de Energia do Lefosse. Mas a infraestrutura deve acompanhar. Para as empresas, porém, a decisão ainda depende bastante da disponibilidade de infraestrutura – linhas de transmissão, conectividade, mão de obra qualificada. Caso esses gargalos não sejam atendidos, a priorização regional pode acabar afastando investimentos ao invés de atraí-los, argumenta.

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Raphael Gomes, sócio de Energia do Lefosse. Foto: divulgação

Pontos positivos

Entre os pontos positivos está a atração de investimentos – estima-se que o programa possa gerar R$ 2 trilhões de investimentos privados nos próximos 10 anos.

Roxo diz que o Redata finalmente coloca o país no radar global de investimentos em infraestrutura digital. Desde incentivos fiscais agressivos, como isenção de PIS, COFINS, imposto de importação,  até a exigência de investimento em P&D e reserva de capacidade para o mercado interno.

“Isso é muito inteligente, estimula a inovação local e evita que os data centers virem apenas hubs multinacionais”, afirma.

O Redata não é somente um regime fiscal, mas um instrumento de transformação digital, soberania tecnológica e desenvolvimento econômico de setores como: IA; computação em nuvem; produção de chips; redes de fibra ótica; e smart factories, aposta.

O estímulo à inovação é outro ponto importante com a obrigação de investimento de 2% em pesquisa e desenvolvimento por parte das empresas em cadeias produtivas digitais. “Certamente, isso fortalece o ecossistema de tecnologia nacional e estimula a criação de soluções locais”, diz Roxo.

“Em resumo, o Redata é uma alavanca para reposicionar o Brasil como um protagonista na economia global, com mais controle sobre seus dados, mais inovação local e mais empregos qualificados”, avalia.

As preocupações com o Redata

Enquanto empresas e advogados tributaristas consideram o Redata um avanço para o desenvolvimento do país, para os institutos Idec, LAPIN e IP.rec, a Política Nacional de Data Centers, tal como está, não é transparente, exclui a sociedade civil da discussão e prioriza negociações com grandes empresas do setor.

As entidades denunciam a ausência de salvaguardas socioambientais e climáticas claras, alertando para riscos como estresse hídrico, aumento do consumo energético, poluição, conflitos territoriais e exclusão de comunidades locais e povos indígenas dos processos decisórios. Criticam também a falta de regras sobre extração mineral, reciclagem e descarte de resíduos eletrônicos, além da falta de exigência de estudos de impacto ambiental antes da concessão de benefícios fiscais.

Segundo os institutos, o governo contradiz seu discurso de soberania nacional ao abrir espaço para interesses privados estrangeiros, em um modelo de digitalização que amplia desigualdades e ameaça a democracia, a justiça socioambiental e a autonomia do país. Eles defendem que investimentos públicos só sejam concedidos mediante transparência, participação democrática e salvaguardas socioambientais robustas.

Os entusiastas

Em comunicado à imprensa, Alessandro Lombardi, presidente da Elea Data Centers, comemorou a medida provisória do governo federal. O executivo acredita que o Redata deixará o Brasil competitivo para processamento de dados e um exemplo para outras nações.

“O Redata não apenas torna o Brasil um dos países mais competitivos do mundo para processamento de dados, mas também faz dele o país mais competitivo do ponto de vista sustentável. O Brasil foi a primeira nação do mundo a assinar uma Política Nacional de Data Centers e, para obter benefícios tributários e tarifários, as empresas são obrigadas a usar energia limpa e sistemas de refrigeração sem uso de água. Portanto, com essa medida provisória, o Brasil se torna um exemplo mundial para sustentabilidade em data centers, a revolução digital verde e a inteligência artificial com matriz renovável”.

Para a Brasscom (Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação e de Tecnologias Digitais), a MP é “um passo decisivo para consolidar o Brasil como um hub global de infraestrutura digital e para impulsionar o desenvolvimento da economia digital em nosso país.”

A entidade sustenta que a medida adianta a desoneração de investimentos prevista na reforma tributária, estabelece fundamentos legais e regulatórios que ampliam a segurança jurídica e favorecem a liberação de novos aportes no setor de data centers e processamento de dados. “Empresas aguardavam a publicação da MP para avançar com investimentos no Brasil que terão uma forte expansão prevista nos próximos anos em diversas regiões do país”, escreveu a entidade em um comunicado à imprensa.

Victor Arnaud, presidente da Equinix no Brasil, acredita que o Redata é o passo decisivo para consolidar o país como um hub global de tecnologia. “Para a Equinix, que investe de forma consistente no país há mais de duas décadas, a nova política fortalece o ambiente de negócios e cria condições ainda mais favoráveis para a expansão da infraestrutura que sustenta a economia digital”, disse.

A medida provisória

Na última quarta-feira, 17, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou a MP que institui o Regime Especial de Tributação para Serviços de Datacenter no Brasil, o Redata. O programa faz parte da Política Nacional de Data Centers (PNDC) e institui isenção de impostos sobre equipamentos importados e a exportação de serviços. O objetivo é atrair investimentos em infraestrutura digital, reduzindo custos.

A MP prevê ainda isenção de PIS/Pasep, Cofins e IPI na compra de equipamentos de TIC, nacionais ou importados, voltados à implantação, expansão e manutenção de data centers. Quando não houver produção nacional similar, também haverá isenção do imposto de importação.

Em contrapartida, as empresas beneficiadas pelo Redata deverão investir 2% do valor dos equipamentos adquiridos no Brasil ou no exterior em projetos de pesquisa, desenvolvimento e inovação. Os recursos serão destinados a programas prioritários voltados ao fortalecimento da cadeia produtiva da economia digital.

Outra exigência é a oferta de pelo menos 10% da capacidade de processamento, armazenamento e tratamento de dados ao mercado nacional. Para projetos localizados no Norte, Nordeste e Centro-Oeste, as duas contrapartidas terão redução de 20%.

 

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