A inteligência artificial começa a ganhar destaque no projeto de MetaIndústria da ABDI com a SPI Integradora, disse em conversa com Mobile Time Valdenio Araújo, analista de inovação e produtividade industrial da ABDI, durante o lançamento do edital de R$ 1,05 milhão para 21 provas de conceito do setor.

Após 18 meses de atuação, a iniciativa contabilizou R$ 42,3 bilhões em economia estimada em custos para empresas participantes (163 grandes empresas e 87 PMEs), 400 workshops empresariais focados em IA, 113 indústrias atendidas, 1,5 mil usuários impactados e mais de 30 mil possibilidades de soluções para a indústria brasileira, além da participação de mais de 80 fornecedores como Nokia, NVIDIA, EDGE e Qualcomm.

Araújo explicou que a iniciativa evoluiu de criar projetos de prateleira à indústria 4.0 (algo que antes era chamado de ‘Tabela FIPE da Indústria’) para ser um “instrumento de transformação” focado em gerar conhecimento em conjunto, abranger a diversidade da indústria e difundir esse conhecimento.

A partir do trabalho com a SPI, a MetaIndústria desenvolveu uma metodologia fundamentada em “aprender fazendo”, feita por meio de um “ciclo virtuoso” que envolve: capacitação e integração; criação de exemplos reais; escalabilidade e financiamento; medição e criação de modelo robusto; articulação e expansão.

Na prática, a metodologia da SPI para gerar esses casos de uso passa por um processo dividido em cinco etapas:

  1. Capacitar as equipes para usar IA generativa e saber montar agentes;
  2. Implementar equipamentos no chão de fábrica que estejam aptos à digitalização;
  3. Juntar as camadas digitais e agentes construídos pelos profissionais;
  4. Retreinar os modelos de IA para LoRA (adaptação de modelo em baixa classificação – low ranking, não confundir com rede LoRA usada em IoT), assim como criar modelos e guardrails;
  5. Aprendizado contínuo do sistema e colheita dos resultados.

Casos de uso

Com esses formatos, o projeto conta com casos de uso de sucesso para grandes empresas. É o caso de Bio-Manguinhos. que usou 5G e um braço mecânico para girar um princípio ativo de vacina e, com isso, reduzir a perda de insumo farmacêutico. Antes, o processo era manual com um analista precisando ir ao laboratório e girando esse insumo de tempos em tempos. Além de ABDI e SPI, o projeto contou com Rockwell, Nokia, EDGE e NDC.

Outro caso é da divisão de agricultura da Bayer, que implementou uma câmera com visão computacional para medir acuracidade e qualidade de sementes de milho. Feito dentro da MetaIndústria com apoio da SiDi, o processo implementado analisa 60 mil sementes que são colocados em cada saca, algo que antes era feito manualmente com amostras retiradas no campo.

E a Dexco fez uma ação audaciosa de desenvolver um gêmeo digital para sua fábrica de R$ 700 milhões em Botucatu/SP, que produz 10 milhões de metros quadrados de porcelanato por ano. Mas, inicialmente, a Dexco escolheu começar apenas a digitalizar a parte de logística, de modo que combine a utilização de robôs e pessoal no cotidiano. De qualquer forma, a iniciativa permite que a empresa digitalize e robotize a planta com a réplica virtual. Isso envolve não apenas digitalizar a fábrica, mas também analisar processos e acompanhar o fluxo do pessoal no chão de fábrica.

Para as próximas etapas, a Dexco começará a pegar camadas de dados, simulações, SAP, câmera e expandir para outras áreas da empresa o projeto para compreender o chão de fábrica como um todo. Por sua vez, a Bio-Manguinhos começa a trabalhar a estruturação de agentes de IA e criação de gêmeos digitais.

Edital

Como parte do conselho da MetaIndústria, o Future Board, os membros de Dexco, Bio-Manguinhos e Bayer querem compartilhar esse conhecimento e aprendizado de seus cases para outros participantes da indústria brasileira por meio do edital lançado na última sexta-feira. Com R$ 50 mil para cada uma das 21 POCs, o chamamento público visa criar exemplos de IA, robótica, gêmeos digitais e realidade aumentada que possam ser replicados pela indústria brasileira.

De acordo com Araujo, da ABDI, apesar de parecer pouco, o montante destinado pela agência de desenvolvimento é suficiente para criar as provas de conceito.

Ele comentou também que as companhias brasileiras investem aproximadamente 1% do PIB em pesquisa e desenvolvimento (P&D), ante uma média de 3% da OCDE, conforme estudo da FGV reproduzido pela Embrapii. Ainda assim, o analista da ABDI quer provocar o ecossistema industrial brasileiro e mostrar que é possível fazer ações de transformação digital a partir de R$ 50 mil: “A indústria precisa ver os resultados. Essa POC é para isso. Se os industriais virem o resultado, eles podem começar a colocar Opex e Capex na inovação para colher resultados”, disse.

Araújo lembra ainda que a indústria brasileira passa por um “Diagrama de Pareto” com 20% das grandes companhias sendo responsáveis por 80% do PIB industrial brasileiro. Por isso, um dos papéis do MetaIndústria e do seu edital é abrir espaço para pequenos e médios terem acesso às novas tecnologias, tanto que as PMEs que se inscreverem no edital terão um peso adicional positivo como fator de escolha.

Apoio

A gerente da unidade de difusão de tecnologias da ABDI, Isabela Gaya, afirmou que o edital ainda permite que as empresas selecionadas para fazer as PoCs tenham acesso à infraestrutura da ABDI e da SPI, o que inclui as tecnologias inseridas nos dois laboratórios do MetaIndústria em São Caetano do Sul/SP e São Leopoldo/RS. “O que esperamos são os resultados da PoC. Pode não ser excelente, mas queremos. Porque a ABDI foca em difusão de tecnologias para depois demonstrar como ajudou a empresa e servir de demonstrador ”, afirmou Gaya, durante o lançamento do edital.

Em complemento a isso, as 21 empresas selecionadas terão o apoio de quem já fez PoC do Future Board e da academia. As instituições de ensino UFRGS, Fundação Vanzolini e Instituto Mauá colocaram à disposição os estudantes e seus centros de pesquisas para desenvolver as tecnologias. E os responsáveis pelos mecanismos de investimento apresentaram formas de escalar essas PoCs, como a Finep com o Nova Cred 4.0, Embrapii com recursos não reembolsáveis e a RVC com estrutura de funding e utilização de benefícios fiscais (como a Lei do Bem).

Jairo Cardoso, head de PMO na SPI, recordou que apesar de terem feito workshop com 400 empresas, o número de empresas fazendo transformação digital ainda era pequeno. Por isso desenvolveram o edital como uma forma de fomentar a “competição” no setor.

“A PoC é para testar a tecnologia e fazer engajamento estrutural. Faz o piloto e escala para o resto da empresa”, disse Cardoso. “É com essa lição que vamos disseminar o conhecimento. Queremos saber o que deu certo, o que deu errado, o que faria de novo e o que pode melhorar. Não queremos informações confidenciais, só as melhorias percentuais”, concluiu.

Expectativas

Élcio Brito, sócio-diretor da SPI,  afirmou que esperam ao término do edital que boas PoCs sejam criadas para subir a barra da inovação no país, apesar de reconhecer que a inovação é um desafio para as indústrias. Por sua vez, o outro sócio e CEO da integradora, Marcos Barbosa, explicou que “não dá para a gente inovar com tanta tecnologia, imaginando que tudo vai dar certo da primeira vez”, que a “inovação exige a criação de modelos, simulação e o desenvolvimento de provas de conceito (PoCs)” e que é preciso estar de olho na tecnologia “para se criar vantagem competitiva” e analisar como a sua utilização se desdobra e impacta o negócio.

Por sua vez, Jean Paulo, COO da Dexco e membro do Future Board, disse que espera que a iniciativa seja um começo para alavancar a transformação digital na indústria brasileira e com isso espera movimentar mais pessoas: “Temos grandes universidades, empresas e diversas cabeças pensantes. Esse é um dos prazeres que podemos criar em um movimento. Uma pessoa fala para outra. Isso desmistifica um monte de coisa”, explicou.

“Passamos pela revolução da automação. Era uma fase que precisava de um especialista de robótica, programação, PLC (dispositivo de controle tecnológico). Era uma revolução de engenharia. Vejo agora que conseguimos democratizar isso. Mas para usar a tecnologia, hoje é muito mais friendly. Basta ser curioso. Não precisamos mais de tantos especialistas, mas necessitamos de grandes curiosos. A maior oportunidade que vemos neste movimento é abrir e trazer mais gente curiosa”, completou.

Imagem principal: Apresentação do edital por Jairo Cardoso, head de PMO da SPI Integradora (crédito: Henrique Medeiros/Mobile Time)

 

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