À semelhança do que ocorre no setor de varejo, o marketplace financeiro compreende a noção de plataformas digitais que agregam, em um mesmo ambiente, serviços financeiros oferecidos a potenciais clientes por múltiplos atores (instituições bancárias, fintechs, companhias de crédito e empresas do segmento).

Em termos simples, cria-se um ecossistema onde variados fornecedores de soluções financeiras apresentam suas condições e ofertas aos usuários interessados que, com base nas propostas disponibilizadas, podem avaliar, comparar e escolher o produto e/ou serviço mais conveniente e adequado à sua necessidade, em um ambiente único, centralizado e de fácil interação e entendimento.

Com as intensas mudanças do mercado financeiro brasileiro, o modelo de marketplace possui grande potencial de fomento do acesso a produtos e serviços financeiros, especialmente porque traz benefícios a todos os envolvidos: (i) seja aos usuários, por garantir uma experiência melhor, mais rápida e eficiente na contratação de soluções, dada a transparência, segurança e estímulo à concorrência; (ii) seja às instituições do setor, quando se permite aumentar a visibilidade e alcançar maior público, com oferecimento de novas soluções aderentes a diferentes perfis, alavancando negócios com a democratização dos serviços.

Dentre os produtos e serviços abarcados por esse modelo, a concessão de crédito, a contratação de planos de previdência privada e seguros, e soluções de investimentos poderão ser objeto de alterações e melhorias, impulsionadas pela promoção da competição e foco na experiência e melhor interesse do cliente/usuário.

Nesse contexto, a definição desse novo formato de oferecimento de produtos e serviços financeiros está intrinsecamente ligada à nova dinâmica do setor promovida pela regulamentação do sistema financeiro aberto, ou open banking, que no Brasil assegurou a possibilidade de intercâmbio de dados e histórico financeiro entre diferentes instituições, que, por sua vez, poderão avaliar de forma mais célere e desburocratizada o perfil do cliente e oferecer soluções apropriadas e aderentes ao momento.

O conceito de marketplace muito se alinha com essa proposta, pois viabiliza a disponibilização de informações de determinados tipos de serviço em plataforma única, a fim de facilitar a visualização pelo usuário sobre todas as instituições que oferecem. Com as devidas autorizações, os dados de um titular poderão ser compartilhados com as demais instituições financeiras, não ficando o usuário final dessa forma necessitado a buscar ferramentas de terceiros para obter informações de forma centralizada.

Desta forma, pode-se falar que as próprias instituições financeiras, em seus devidos sites e aplicativos, já poderão, com as vantagens oferecidas pelo open banking, oferecer funcionalidades referentes ao marketplace financeiro.

Por outra via, o mercado já se adianta à norma – como de praxe –, pois plataformas de terceiros que operam fora do guarda-chuva regulatório direto do Banco Central (BACEN) já oferecem certas características que se amoldam ao conceito de marketplace financeiro.

Não é raro encontrar plataformas web que usem informações cadastrais de possíveis usuários para informar sobre comparação de determinados tipos de serviços e produtos financeiros em diferentes instituições.

De todo modo, em um cenário transparente de autorização do titular, usuários que optarem por aderir ao open banking poderão usufruir, além de consultas unificadas sobre informações de diversas entidades financeiras em um único local, também de ofertas e serviços personalizados em marketplace financeiro da própria instituição. Esse ponto será possível graças à consulta e correlacionamento de transações entre diferentes instituições, pertencentes a um mesmo titular.

O desafio por conta dos componentes desse ecossistema de marketplace financeiro, assim como no open banking, fica em realizar a correta gestão destes pedidos de compartilhamento, mantendo histórico de quem, quando e onde foram realizadas estas operações de autorização.

Delineados os múltiplos benefícios aos usuários – e os desafios operacionais que serão levantados até este objetivo –, deve-se levar em conta os desafios legais para os atores do mercado no tocante à delimitação das responsabilidades perante a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), regulamentações do BACEN e demais legislações pertinentes.

Nesse cenário, é importante conhecer as peculiaridades do modelo de marketplace financeiro para estabelecer as responsabilidades perante o usuário, com a delimitação da atividade de cada ator, da eventual intermediação e do resultado final esperado, que é a celebração e operação do serviço financeiro eventualmente contratado.

Por outra perspectiva, no âmbito das responsabilidades, é certo que o marketplace financeiro atua com intenso fluxo de tratamento de dados pessoais para viabilizar o negócio entre o usuário e as instituições financeiras, bem como para manter o relacionamento para divulgação de produtos e serviços ao usuário da plataforma, motivo pelo qual é considerado um agente de tratamento de dados pessoais, cuja posição – em nome próprio ou de terceiro – dependerá da análise de caso concreto para definir (i) quem detém ou determina as diretrizes do tratamento a ser realizado, (ii) qual o escopo desse tratamento e (iii) quem operacionalizará os direitos dos titulares quando assim demandado.

Todavia, independente do fluxo observado, a transparência e a segurança do eventual tratamento deverão ser garantidas por todos os agentes de tratamento, por meio de medidas de mitigação de risco que são inerentes ao ambiente de interoperabilidade sistêmica, tais como: (i) divulgar Política de Cookies e Política de Privacidade apresentando de maneira clara como é realizado o tratamento dos dados pessoais; (ii) divulgar um canal específico para atendimento das requisições dos titulares; (iii) nomear um Encarregado pelo Tratamento dos Dados Pessoais para atender as requisições;  e (iv) garantir a implementação de boas práticas por meio de políticas e normas que asseguram a governança de dados pessoais.

Cabe dizer que o movimento não é uma exclusividade brasileira, mas uma tendência mundial. Bancos digitais do Reino Unido, como Monzo Bank e Starling Bank, são exemplos de instituições que adotam esse novo formato, proporcionando uma experiência integrada de serviços bancários que contam com a colaboração de terceiros especializados. No cenário brasileiro, o modelo tem se desenvolvido com a atuação de fintechs e empresas de tecnologia (i.e. Zoop, Finplace, GuiaBolso/Picpay e Transfeera).

Portanto, assim como visto no cenário internacional, o referido modelo de negócio tem enorme capacidade de beneficiar a sociedade brasileira, seja na figura dos titulares consumidores ou das entidades empresariais voltadas ao setor. Contudo, os desafios atrelados à proteção de dados e à privacidade dos usuários, assim como ao regime de responsabilidade aplicado aos intermediários das operações, não devem ser subestimados, mas sim considerados como elementos diferenciais e de destaque das plataformas que se propõem a oferecer essa solução, garantindo, desse modo, uma melhor experiência do usuário.

Por fim, dado que o sistema financeiro é um ente em constante amadurecimento e evolução, o modelo de negócio baseado numa rede de serviços conectados passará a ser regra, oportunidade em que ecossistemas financeiros fechados nas paredes de uma única instituição não alcançarão a necessidade de grande parte de um público tecnologicamente engajado ou, literalmente, não o alcançarão de modo algum.