Desde o início de sua presença em redes sociais, os veículos de imprensa utilizam métricas de participação – como compartilhamentos, likes e comentários – para indicar o consumo e a reação de seu público aos conteúdos produzidos por eles. O comportamento foi tão bem sucedido que os portais e páginas destes veículos passaram a adaptar áreas para comentários e interações muito parecidas com as dos canais sociais, incentivando ainda mais este tipo de feedback.

Este mecanismo está, no entanto, subestimando a percepção das notícias publicadas, o que pode potencialmente fazer com que os veículos tomem decisões e medidas baseadas em opiniões mais extremadas de seus leitores.

Em estudo deste ano, a Reuters indica o crescimento do que eles chamam de “consumidores passivos de notícias”, ou seja, aqueles que apenas consomem o conteúdo, mas não realizam qualquer ação de engajamento. O perfil divide espaço com outros dois tipos: o participante ativo – que comenta e posta notícias – e o participante reativo – que dá like e compartilha conteúdo. 

Este perfil mais ativo e que deixa mais claro o que pensa tem diminuído sua participação:

Embora os índices de evolução acima sejam mundiais, o cenário brasileiro não é muito diferente: em 2023 o país conta com 42% de consumidores passivos de notícias, liderando, junto com a Argentina, o ranking latino-americano para o perfil. Com relação a participantes ativos, o país fica em segundo lugar, com 24% contra 21% de nossos vizinhos do Sul.

Uma das causas percebidas é a sensação de hostilidade a opiniões diversas nos espaços virtuais. O ambiente de redes passou a ser percebido como agressivo por aqueles que consomem notícias, o que acaba por perfilar quem interage com conteúdos, colocando-os nos extremos políticos da direita ou da esquerda e com maior participação masculina.

Neste quesito, o Brasil também é peculiar. Em nível mundial, as pessoas de direita e de esquerda relatam sofrer desconforto em proporção semelhante. No Brasil e em alguns outros países, a parcela de esquerda se sente mais hostilizada e relata maior número de experiências negativas associadas a notícias. Estas situações acabam por gerar maior reflexão antes de ações de engajamento com o conteúdo. Mais de 65% dos brasileiros relatam, por exemplo, que é necessário cuidado para se falar de política online.

O resultado é a migração destes leitores para espaços menos expositivos, como os comunicadores interpessoais, onde há maior possibilidade de diálogo e menor nível de agressões. Estas plataformas, no entanto, não constam das métricas de engajamento e, principalmente, são um ponto cego para opiniões, aferidas principalmente nas caixas de comentários online.

Os novos dados trazidos pela Reuters servem a todos que lidam com o monitoramento de notícias – matéria importantíssima do social listening e da gestão de redes: às empresas de comunicação, cabe ponderar que a caixa de comentários traz nuances mais acaloradas do que a opinião geral e que ali quase que se invisibiliza o que pensa a maioria silenciosa de seus leitores.

Para as demais empresas, é necessário cuidado ao avaliar a recepção de notícias sobre sua marca, produtos e serviços na mídia, assim como a percepção de temas de interesse no noticiário. As percepções ali também podem sofrer influência desta polarização. Vale salientar que polarização e politização de notícias não acontece somente com temas puramente políticos. Temas diversos, como inclusão de minorias, ecologia, veganismo, crianças e uma série de outros também acabam sendo inseridos nesta dinâmica.

Neste âmbito mais corporativo, os times de monitoramento de redes sociais devem estar atentos e olhar para notícias de forma comparativa. Criar índices internos e dar destaque a comportamentos que fujam à regra de repercussão é importante. Volumes de interações como likes e outras reações também ganham destaque, uma vez que permitem observar de maneira comparativa, numérica e direta a recepção de notícias pelo público.

No que tange à área de comentários e seus aspectos mais qualitativos, cabe observar que ela potencializa opiniões extremadas e não traz claramente visibilidade a um grupo numericamente significativo. Neste caso, o olhar atento a opiniões com conteúdos diferentes daqueles polarizantes e de alto teor político pode fazer a diferença na definição de um plano de ação.

Além dos profissionais, os demais leitores devem compreender que a área de comentários virou um campo disputado por pólos opostos e que as informações ali contidas devem ser filtradas e verificadas antes de se formar juízos de valor.