Uma vez mais recebo o honroso convite de MobileTime para atualizar minha percepção sobre a realidade atual do segmento de MVNOs no Brasil.

Nesta oportunidade fui instado ainda a comentar as recentes turbulências verificadas no mercado MVNO do México que se transformou nos últimos anos em um case de sucesso impressionante.

Tudo porque a rede neutra operada pela empresa Altán Redes acaba de promover aumentos de seus preços na faixa de 15% que pode chegar a percentuais ainda mais altos, com ondas de choque de repasse de preços sendo rapidamente anunciadas pelas prestadoras MVNO, como não poderia deixar de ser.

Vamos começar recuperando um pouco a história. Fundada em 2014, a Altán toma vida como resultado de uma licitação promovida pelo Governo Mexicano para promover a expansão da cobertura móvel em áreas carentes e de baixo interesse econômico, através de um contrato de Parceria Publico-Privada resultado de licitação em 2016.

Com metas ambiciosas de cobertura e atuando apenas como atacadista com preços muito baixos, a Altán foi o motor para o real surgimento do segmento MVNO no México.

Ocorre que o segmento móvel tem uma dinâmica já demonstrada em inúmeros mercados e a insistência em combater elementos básicos da economia do segmento sempre acaba mal.

Não foi diferente com a Altán. Iniciando os serviços em 2018, investindo pesado e se endividando para isto, a empresa entra em recuperação judicial já em 2021 incapaz sequer de rolar suas dívidas. Aí entra um resgate do Governo Mexicano em 2022, assumindo o controle da empresa e viabilizando financiamentos adicionais. A velha, surrada e comprovadamente inviável fórmula.

Mas enquanto isto o segmento MVNO florescia valendo-se dos preços incrivelmente baixos que a Altán estava obrigada a praticar.

Um estudo recente mostrou que os preços praticados pelas MVNOs aos assinantes no Mexico são da ordem de apenas 15% daqueles praticados pelas operadoras. Bom para os consumidores, ruim para todos os contribuintes mexicanos, ruim para as operadoras… uma fórmula inviável.

Agora a Altán, possivelmente amparada pelo seu Estado Controlador, consegue reajustar seus preços e isto chegará em cadeia até os consumidores.

Não sei avaliar a justiça ou legalidade destes aumentos mas me parece que não fosse o Governo agora seu controlador não sei se este e futuros reajustes seriam autorizados.

É uma fórmula que já deu errado, vai continuar dando errado, mas, enquanto isso, o segmento MVNO se expande, uma parcela de consumidores se beneficia e o contribuinte paga a conta.

O mercado móvel, como muitos outros, tem uma lógica econômica inescapável. E neste caso é a escala é fundamental.

Outro dia vi dados que confirmam isto e dão um spoiler claríssimo do que está por vir no México: a margem EBITDA da Telcel é acima de 40%; da AT&T no México é de 16%… e da Telefônica-Movistar, de apenas 8%!

Como alguém pode competir num mercado de consumo que requer altos investimentos com margens EBITDA tão pequenas? A resposta é simples: não pode!

E isto acontece porque AT&T e Telefonica não tem recursos financeiros? Não tem competência neste negócio?  Não! É porque neste negócio ESCALA – neste caso com efeitos logarítmicos – é o que importa!

Acredito que toda esta situação no México vai se traduzir por reformas que deveriam ser urgentes e orientadas a racionalizar o mercado. E entendo que o segmento de MVNO tem um papel fundamental para beneficiar os consumidores sem prejudicar os contribuintes: preços de atacado efetivamente regulados pelo regulador.

Este para mim é o único caminho.

Já destinar recursos públicos para “universalizar’ acesso a internet e beneficiar as camadas mais pobre NUNCA deveria ser feito através de empresas do Estado.

Espero sinceramente que no Brasil o governo não caia mais ainda no caminho que levou à recriação da Telebrás, dando-lhe mais e mais papéis “de governo”.

Depois desta humilde reflexão sobre nossos hermanos, vamos olhar para o Brasil.

Aqui, após longa e excruciante espera, dávamos como certa a aprovação da revisão do PGMC com a inclusão do MVNO e a revisão das ofertas ORPA derivadas da aprovação da venda da Oi Móvel para patamares reais. Mas infelizmente assistimos a matéria, depois de relatada como esperada pelo senhor Conselheiro Relator, ser objeto de pedido de vistas por outro Conselheiro. Esta situação é motivo de muita preocupação.

A venda da Oi foi aprovada há 3 anos. As compradoras aproveitaram para repassar aumentos de preços, enquanto o segmento MVNO, que foi reconhecido pelo CADE como a válvula de controle contra tais abusos, segue de mãos atadas.

É verdade que assistimos nos últimos tempos o surgimento de uma séria de iniciativas dos mais variados portes no segmento. Mas não tenho duvidas que em pouco tempo todas irão sucumbir a uma realidade inescapável: se não há margem suficiente não há viabilidade.

Se não há ar não há vida.

Fórmulas modernas de financiamento e teorias de investimento conseguem dobrar um pouco o espaço-tempo aqui prolongando a sobrevivência de algo economicamente inviável.

Mas é o tal ditado: podes enganar muita gente por um tempo. Pouca gente por mais tempo. Mas não todo mundo o tempo todo.

O que é inviável por falta de margens será inviável de forma inexorável.

Ou a MVNO tem seu papel reconhecido e apoiado com vigor pelo novo PGMC, e preços de atacado verdadeiros impostos às operadoras, ou o segmento seguirá sendo marginal e incapaz de cumprir seu papel em beneficio do consumidor e da sociedade.

E, enquanto isso, assistimos à nossa versão tupininquim da saga da Altán: a iniciativa das chamadas operadoras regionais, sua recente luta por espectro em condições favorecidas, a promoção de todas as barreiras possíveis a novos competidores, incluindo às crescentes redes privativas em 4G e em especial às MVNO.

Como a Altán, e muito pior que ela, operações de pequeno porte são inviáveis. Isto já está provado e comprovado mundo afora depois dos cerca de 45 anos de crescimento do setor móvel. Fica o meu conselho a quem se propuser a desmontar esta realidade. E espero que o Governo resista à tentação de promover iniciativas, ainda que meritórias mas economicamente inviáveis, principalmente utilizando empresas publicas.

 

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