A humanidade ainda está atordoada com a chegada da inteligência artificial generativa, medindo o seu impacto e prevendo as próximas consequências. Uma reflexão recorrente, geralmente misturando encanto e assombramento, trata da facilidade com a qual agora qualquer um pode criar textos, imagens ou vídeos mesmo sem ter a aptidão, o talento, o conhecimento ou o treinamento para tal.

Bom, para começo de conversa, há uma grande cortina de fumaça, feito aqueles truques de ilusionistas, que nos impedem de ver com mais cuidado a questão. Sim, é verdade que qualquer um agora consegue fazer textos, imagens e vídeos sem qualquer treinamento prévio nessas áreas específicas: basta pedir ao Gemini, ChatGPT, Claude, DeepSeek, Dall-E, Sora ou afins. O resultado, porém, nem sempre é o desejado. Na média, eu diria que é satisfatório. Digamos, que daria para passar de ano, nota 6 em 10. Mas dificilmente é um conteúdo excepcional. Ao menos não sem muito trabalho e conhecimento associados, transformando a IA em mais uma ferramenta nas mãos de um profissional.

Gosto de dar o exemplo do campo da poesia. Experimente pedir para o ChatGPT fazer uma poesia combinando temas aleatórios. Como num passe de mágica, ele vai atender seu pedido em poucos segundos, com versos rimados e que fazem sentido entre si. À primeira vista, é notável, sem dúvida: uma máquina gerando poemas sobre qualquer assunto. É superior e certamente mais rápido ao que a maioria dos seres humanos conseguiria fazer diante da mesma solicitação. Mas, analisando com mais atenção os poemas, com o olhar de um crítico literário, são obras medíocres, sem encanto. Apenas cumprem minimamente o que foi pedido.

O mesmo vale para imagens. Se o solicitante for breve e vago no seu pedido, a IA vai criar uma imagem qualquer, provavelmente uma média de outras similares encontradas na Internet e com as quais foi treinada – vide o caso dos relógios que marcam 10h10, ou a dificuldade de se desenhar um canhoto. E dificilmente vai ser exatamente como a pessoa imaginou.

Para conseguir um resultado mais original, é preciso, antes de mais nada, imaginá-lo. E precisa fazê-lo com riqueza de detalhes. E depois é necessário descrever essa imagem com precisão em seu prompt. Essa etapa da imaginação detalhada eu entendo como o trabalho de um artista. Me lembra também, em grande medida, os jogos de role playing game (RPG), em que o mestre precisa descrever a cena e os jogadores, imaginá.la. Quanto mais habilidoso na descrição for o mestre, mais os jogadores se sentem dentro daquele universo.

Você pode usar a IA de forma preguiçosa, com prompts vagos, e terá de volta resultados igualmente preguiçosos e de pouca criatividade. Ou você pode botar a imaginação para funcionar e descrever com riqueza de detalhes o que deseja, para obter um resultado mais próximo possível daquilo que deseja. Não é fácil, até porque nem sempre a IA compreende exatamente o que queremos. Dá muito trabalho, digamos, domar cada assistente. E, dependendo da sua habilidade com desenhos ou palavras, às vezes pode ser mais rápido ou melhor fazer com suas próprias mãos mesmo.

Mas o que quero contestar, em resumo, é essa ideia de que a IA seria uma ferramenta anti-imaginação. Ela até pode ser, para aqueles mais preguiçosos ou desprovidos de criatividade. Mas para os artistas a IA pode ser uma ferramenta a serviço da sua imaginação. Basta praticar e domá-la.

 

*********************************

Receba gratuitamente a newsletter do Mobile Time e fique bem informado sobre tecnologia móvel e negócios. Cadastre-se aqui!