Expressionismo Imaginário seria um movimento artístico em que o pensamento serviria como suporte para as obras. Em vez de tela, argila ou filme, a obra seria a ideia em si, sem a sua execução. Entretanto, para viabilizar a sua comercialização, a arte no Expressionismo Imaginário seria materializada na forma de um certificado assinado pelo artista.
O Expressionismo Imaginário nunca existiu. É fruto da minha imaginação como escritor e faz parte de um conto no livro “Depois que o tempo passar, Madalena”, publicado em 2016 pela editora 7Letras. O conto é carregado de sarcasmo, e o citado movimento era uma farsa. Porém, existiu de verdade um movimento bastante próximo disso, chamado de Arte Conceitual, explorando justamente a fronteira entre a nossa imaginação e a materialidade da obra.
A arte em NFTs, que foi uma febre nos últimos anos, também traz à tona uma discussão interessante sobre posse da obra de arte, que neste caso existe não em pensamento, mas em formato digital. Pode ser um desenho, um meme, qualquer coisa. O que interessa é que a versão original é digital. Qualquer materialização, como a impressão da obra, por exemplo, passa a ser uma cópia.
O novo debate em arte é provocado pelo advento de ferramentas de inteligência artificial generativa, como ChatGPT, Midjourney e Dall-E, capazes de produzir conteúdo em texto e imagem a partir de solicitações do ser humano. O ChatGPT pode criar poemas e contos. O Midjourney e o Dall-E, desenhos e fotografias. Não vou entrar no mérito da qualidade das obras. A discussão proposta aqui é sobre a autoria. Quem é o autor neste caso?
Para alguns, obras produzidas por IA não são arte. Ou, ainda que fossem arte, então o ser humano por trás da requisição não seria o autor. Eu discordo. Claro que a execução é importante, mas não existe arte sem que antes haja uma ideia. Ou, antes ainda, uma intenção de se fazer arte. A máquina não tem a ideia sozinha e, muito menos, a vontade de fazer arte. Por trás dela ainda está o artista.
Valorizar a intenção e a ideia em uma obra de arte não é algo tão novo assim. Pelo contrário: há muitas décadas grandes artistas se valem de assistentes para executarem suas obras. E não há nada de errado nisso. Eles continuam sendo os autores, pois são deles a intenção e a ideia. Há inclusive certas formas de arte em que contar com ajuda de terceiros para a sua execução não se trata de uma escolha, mas de uma necessidade. Na arquitetura, por exemplo, o arquiteto imagina e desenha como será um prédio, mas cabe ao engenheiro construir. No cinema, antes da filmagem, é feito um storyboard: o desenho em quadrinhos das cenas previamente imaginadas.
As ferramentas de inteligência artificial não são artistas. Artista é quem as utiliza para fazer arte. E muita gente está descobrindo como fazê-lo. Um exemplo do qual gosto muito é o do fotógrafo carioca Cartiê Bressão. Ele construiu no Midjourney uma série chamada de “Carnavais artificiais”, na qual gerou imagens do carnaval do Rio misturando suas próprias fotos com estilos e personagens de outros artistas. Tem, por exemplo, imagens dos personagens de Star Wars curtindo o carnaval do Rio na década de 60.
Resumindo, IA não é artista. IA é ferramenta para artista. O dia em que construírem uma IA com autoconsciência, capaz de ter sentimentos e vontade real de expressá-los em arte, bom, aí eu reescrevo este texto. Ou melhor, peço para o ChatGPT reescrevê-lo.