O uso de ad blockers cresceu 41% somente no último ano. Atualmente, são 198 milhões de usuários ativos no mundo. Tamanho crescimento deixou os anunciantes da mídia online bem preocupados. Mas a grande questão que envolve o uso dessas ferramentas é: deveria haver algum limite à publicidade nos serviços e conteúdos? Não apenas na Internet, mas em todas as mídias?

O modelo tradicional da Internet entrega serviço e/ou conteúdo gratuito em troca de publicidade/dados dos usuários. O aumento excessivo de anúncios não acompanhado pela melhor oferta de serviço/conteúdo propiciou o surgimento dos ad blockers. Vimos esse aumento ocorrer não só na web, mas também em revistas, jornais, salas de cinema, onde o tempo de anúncios é cada vez maior sem haver retorno para o usuário, e até na TV a cabo, que inicialmente surgiu com a proposta de não ter propaganda como na televisão aberta, e hoje oferece opções de serviços sem publicidade, no chamado on demand.

Como o próprio nome diz, o serviço de adblock promete bloquear anúncios. O bloqueio dos anúncios ocorre de acordo com a seleção do próprio usuário. O usuário adiciona listas com filtros ao adblock, determinando quais anúncios deseja ver durante a sua navegação. Algumas dessas relações são predefinidas e podem ser inseridas prontamente pelo usuário, que também possui a opção de criar a sua própria lista a partir de categorias de anúncios, por exemplo, pop-up´s, block tracking e malwares.

No entanto, isso ocorre em um meio em que é o anúncio que remunera o conteúdo.  Ou seja, poderia gerar um ambiente onde quem usa adblock não acesse conteúdo gratuito, ou quem oferta conteúdo gratuito, não pode ali aplicar o adblock, pois provocaria a quebra do equilíbrio econômico. Até aí, isso é uma questão de mercado, podendo chegar em um questionamento de barreira à livre iniciativa (art.1, IV, e art.170 da CF). Mas, na medida em que o adblock passa a oferecer de forma paga para anunciantes a possibilidade de entrar na White List, isso pode representar uma situação de propaganda enganosa para o consumidor (art.6, IV, do CDC).

Segundo o site do Adblocks, não há pagamento para estar nas listas. A principal entidade, a Adblock Plus, afirma tacitamente que não há esse tipo de abordagem. A empresa pode apoiar a causa com doações, porém a determinação se o anúncio é aceitável ou não é feita segundo os critérios da “Acceptable ads criteria”. No applicant will be favored or treated differently, and no one can buy their way onto the whitelist. Everyone has to comply with the criteria and everyone has to go through the same process before the ads qualify as "acceptable”.

Mesmo com as indicações, no entanto, houve denúncias quanto à questão de pagamentos .  Como o site não possui Termos de Uso datadas, mas sim uma espécie de FAQ, não há como verificar se as modificações citadas acima são anteriores ou posteriores aos casos. Além disso, quando afirma que vai selecionar a propaganda, usa o termo “anúncio aceitável”.

Segundo a Adblock Plus, o critério de seleção é pautado exclusivamente nos compliance a “Acceptable ads criteria”, lista de termos que são levados em consideração para um anúncio ser considerado intrusivo ou não. São critérios como: não sobrepor o conteúdo da página e não utilizar sons, animações ou gifs. Isso pode representar não apenas uma censura (cercear liberdade de expressão – art. 5, IV e IX, da CF), mas, pior ainda, pode ser um ato de concorrência desleal, na medida em que um anunciante já esteja na White List e o anúncio de um concorrente pode ser impedido por não ser aceitável (art.2, V e art.195 da Lei 9279/96).

São muitos os abusos cometidos por parte dos Ad Servers. Há anúncios excessivos inclusive em games cujo foco são crianças e adolescentes, alguns até não apropriados para idade, ou mesmo ilícitos no Brasil (oferta de cassino online, oferta de sites eróticos). Neste sentido, já fere a legislação sobre publicidade infantil (Resolução 163/2014 do CONANDA, bem como ECA). O melhor caminho para garantir a sustentabilidade da Economia Digital seria criar uma regulamentação que estabelecesse alguns limites e parâmetros para proteção do consumidor e do próprio mercado, a fim de evitar práticas de concorrência desleal, dumping, entre outras. Por exemplo, uma medida que demarcasse a proporção entre anúncios versus conteúdo editorial ou serviço.

Hoje, empresas que desejam entrar no sistema de “propaganda aceitável” do Adblock Plus, além de cumprirem certos requisitos, devem pagar uma taxa de 30% do total obtido com os anúncios que seriam bloqueados à Eyeo, controladora do software. Ou seja, o anunciante paga o Ad Server, a operadora de Telecom lucra com o consumo de dados pago pelo consumidor, que nesse cenário ganha o quê? Há uma distorção no modelo que precisa ser corrigida, mas o caminho não é a eliminação da propaganda, e sim a adequação para que haja um equilíbrio. Isso precisa ser corrigido logo para evitar um colapso no modelo atual da gratuidade do conteúdo na internet.

Somente no primeiro trimestre do ano passado, 5% dos usuários de Internet no mundo usaram softwares para bloquear anúncios. Pela estimativa da Eyeo, são 50 milhões de usuários ativos mensalmente que utilizam o bloqueador Adblock. Outro caso que comprova a elevada procura por esses bloqueadores é o Peace. Lançado em setembro, o aplicativo para iOS rapidamente pulou para o primeiro lugar na App Store, onde estava sendo vendido para milhares de pessoas por US$ 2,99. Apesar da demanda, seu desenvolvedor decidiu removê-lo por acreditar que a abordagem de aplicativos para bloqueio de anúncios era muito brusca. Pago ou gratuito, os bloqueadores de anúncios compõem uma equação que não fecha e podemos desperdiçar o que conquistamos com o acesso mais livre e democrático da informação.