O Conselho Diretor da Anatel rejeitou o recurso interposto pelo Carrefour que questionava a cautelar da agência reguladora que permite punições aos marketplaces pela venda de produtos de telecomunicações não certificados e não homologados.
A varejista questionava que a imposição de obrigações deveria acontecer no âmbito do processo normativo, incluindo consulta pública e análise de impacto regulador.
O outro ponto questionado foi quanto ao obstáculo operacional e sistêmico decorrentes à falta de dados convergentes entre a base de dados da Anatel e fornecedores e fabricantes dos equipamentos, sobretudo a falta do código GTIN, o antigo código EAN de cada produto na base de dados da Anatel.
O terceiro ponto era que as multas fixadas seriam desproporcionais.
Sob a relatoria da conselheira Cristiana Camarate, a agência também negou recurso da Câmara Brasileira da Economia Digital para ingressar no processo como amicus curiae (amigo da corte, ou parte interessada). Vale dizer que a entidade tem entre seus associados empresas como Google, Meta, Amazon, Carrefour, Alibaba, Shein, Mercado Livre, Americanas, entre outras.

Conselheira da Anatel Cristiana Camarate. Crédito: reprodução de vídeo
Um dos pedidos da camara-e-net à Anatel era aplicar o mesmo entendimento do TRF3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região) favorável à Amazon em ação contra a cautelar. A conselheira também rejeitou o pedido e foi seguida por seus pares de forma unânime.
A entidade também acredita que a agência teria extrapolado a Lei Geral de Telecomunicações ao querer regular os marketplaces e argumentou que a determinação de controle prévio de anúncio e remoção de conteúdo sem ordem judicial específica contraria o artigo 19 e do Marco Civil da Internet que estabelece a responsabilidade subsidiária dos provedores.
Outro ponto criticado pela camara-e-net são as penalidades impostas, por considerá-las excessivas e prejudiciais ao setor de comércio eletrônico, especialmente aos pequenos comerciantes que dependem dos marketplaces. A entidade destacou ainda que o controle prévio de anúncios é “inviável devido à complexidade e ao volume de produtos anunciados, além da possibilidade de os anunciantes burlarem a regra”.
Em 2024, a Anatel emitiu uma cautelar para que as plataformas de comércio eletrônico adicionassem nos anúncios de terceiros um campo para a inserção do código de homologação de produtos de telecomunicações, entre eles o código GTIN (antigo EAN). A não conformidade com as regras poderia gerar multas que, se somadas em R$ 50 milhões, poderiam causar o bloqueio da plataforma.
Em sustentação oral, João Paulo Fernandes de Carvalho, advogado da camara-e.net, alegou que a medida de identificar e remover os anúncios seria uma missão “impossível” de ser cumprida de acordo “com o padrão de excelência que a agência exige para a qualificação como empresa conforme”. Ele defendeu ainda que os marketplaces são intermediadores e não poderiam ser responsabilizados por conteúdos de terceiros – alegando que o artigo 19 do MCI os protegeria de tal missão.
Anatel mantém cautelar
Camarate rechaçou o argumento:
“A entidade representativa que tem como associados Amazon e Mercado Livre está, em outras palavras, dizendo que ninguém pode impedir que elas vendam produtos que legalmente não podem ser usados pelos consumidores, [que] pagariam por um produto que não pode ser usado no território brasileiro e que pode lhe causar danos, com a plataforma livre de qualquer responsabilidade”, afirmou a conselheira, que também argumentou que o dispositivo do Marco Civil da Internet é válido para a proteção da liberdade de expressão das pessoas e não de e-commerces.
Camarate argumentou que, por trás dos marketplaces está a motivação econômica. Os e-commerces aplicam comissões sobre venda de celulares e não comercializar esses produtos não homologados representaria perda de faturamento.
“A Amazon e o Mercado Livre cobram 11% de comissão sobre a venda de celulares por parceiros na plataforma da empresa, com as demais cobrando valores que chegam a 18,5%. Em outras palavras, vender smartphone não homologado de R$ 3 mil implica em média em comissão de R$ 420″, afirmou Camarate.
A conselheira lembrou que 25% dos celulares vendidos no país são piratas. “É inegável o incentivo econômico para que a regularização não tenha sucesso: um player que coopere perderá dinheiro, e perderá ainda mais se outros players não cooperarem, porque os produtos irregulares ficariam disponíveis apenas nos concorrentes”, complementou.