A distância entre São Paulo e Manaus, em linha reta, é de 2.689 Km. O percurso é feito de avião com frequência por Gilberto Novaes, fundador da Transire, empresa cuja fábrica, instalada na Zona Franca de Manaus, produz hoje 400 mil máquinas de mPOS e POS por mês. Um ano atrás, a produção mensal era metade desse volume. Em cinco anos de existência, a Transire fabricou 7 milhões de máquinas para pagamento com cartão. Se fossem enfileiradas no chão, daria uma linha reta de 700 Km de extensão, considerando o tamanho da Minizinha, um dos seus modelos de maior sucesso. Não seria suficiente para chegar até Manaus, mas, pelo ritmo de crescimento, não vai demorar muito para a Transire atingir esse marco com seus produtos.

A empresa fornece máquinas de mPOS para PagSeguro, SumUp, Mercado Pago, Cielo, Safra Pay e várias outra. Por sinal, é justo atribuir a ela parte do sucesso da PagSeguro, que recentemente arrecadou mais de US$ 1bilhão com sua IPO. A Transire foi parceria de primeira hora da PagSeguro, como fornecedora de suas máquinas desde o início da operação.

A trajetória do fundador da Transire, por sua vez, está longe de ser uma linha reta. Giba, como prefere ser chamado, enfrentou altos e baixos, na estrada sinuosa da vida. Passou a infância na Cohab Artur Alvim, em Itaquera, São Paulo. Fez curso de informática e com

eçou trabalhando com manutenção de computadores na Credicard. Depois, foi chamado para a Hypercom, uma antiga fabricante de POS que lhe serviu como escola sobre meios de pagamento. Aos poucos foi subindo degraus no ambiente corporativo: passou pela American Express e pela Vale Refeição até ser convidado a montar a operação no Brasil da Lipman, outra fabricante de POS. Depois disso, chegou a montar uma empresa própria de manutenção de POS, mas não deu certo. Passou por alguns anos de penúria até conhecer a Pax, fabricante chinesa de mPOS, e decidir firmar com ela uma parceria para trazer o produto para o Brasil.

Impacto no mercado

O mercado de POS no Brasil era dominado até então por dois grandes fabricantes: Verifone e Ingenico. A chegada da Transire mexeu com o setor. Giba optou por fabricar em Manaus, por causa dos benefícios fiscais. Além disso, decidiu pela verticalização: em vez de terceirizar a produção, construiu uma fábrica própria, com investimento de R$ 40 milhões em equipamentos. A unidade fabril está em um terreno de 30 mil m2 e tem 1,4 mil funcionários.

É o próprio Giba quem faz a concepção de cada produto, enquanto a Pax cuida do desenvolvimento. A Transire importa da China as placas e demais componentes para a montagem local. Até mesmo os módulos GSM são produzidos dentro da unidade fabril de Manaus, para não precisar comprar dos fornecedores tradicionais. Giba estima que a verticalização e a escolha por Manaus fazem com que seu custo seja 30% menor que o dos competidores.

“Nosso objetivo é a democratização das maquininhas de cartão. Antes os players não tinham interesse em fazer uma máquina de baixo custo porque diminuiria a margem deles. Nós fizemos um produto que atende a base da pirâmide”, explica o executivo.

Ao longo de cinco anos de atuação, a Transire trouxe para o Brasil diferentes modelos de máquinas de mPOS, com variados tamanhos, funcionalidades e conectividade (Bluetooth, Wi-Fi, 2G, 3G etc), mas mantendo sempre o foco em preço baixo. “Lanço um produto para matar o outro. O ciclo de vida de um POS era de quatro anos. Nós encurtamos para um ano e meio”, diz Giba.

Futuro

A Transire já está planejando os próximos passos. Seu novo produto será um terminal de POS com sistema operacional Android, permitindo a instalação de aplicativos. Há dois contratos para testes-piloto assinados e que em breve serão divulgados no mercado.

Também este ano a empresa entrará no segmento de equipamentos de check-out para estabelecimentos comerciais, para concorrer com a Bematech. Uma fábrica está sendo construída ao lado daquela de máquinas de POS, no mesmo terreno em Manaus. Para esse segmento será adotada uma marca diferente: Callidus.

E Giba não se engana com o futuro das máquinas de mPOS. Ele sabe que em algum momento elas serão substituídas pelos próprios smartphones ou até por outro hardware mais simples e barato que o atual. Ele projeta que uma desaceleração comece a partir de 2020. Por isso, está investindo também em pesquisa e desenvolvimento na área de Internet das Coisas (IoT), por meio do Instituto Transire.

“Eu não tenho medo de arriscar, tanto que lanço um produto que mata outro. Quem mais faz isso?”, comenta. “E não tenho medo da pobreza. Eu vim de lá. Se eu tiver que voltar para a Cohab eu volto feliz. Meu grupo de WhatsApp é de amigos da Cohab”, acrescenta. Se depender do significado do nome Transire, que é uma mescla de “transcender” e “ir”, em latim, Giba ainda vai muito além dos 2.689 Km entre São Paulo Manaus.