Publicada originalmente no Teletime | Elaborando uma nova versão do Plano Geral de Metas de Competição (PGMC), que deve ser colocado em consulta pública na reta final de 2022, a Anatel pretende avaliar o impacto competitivo das empresas de aplicações over-the-top (as chamadas OTTs) sobre mercados como vídeo e voz.

A medida não significa que remédios pró-competição serão aplicados sobre as empresas de Internet, explicou o superintendente de competição da Anatel, José Borges, durante live promovida pelo portal Tele.Síntese nesta sexta-feira, 19.

“Estamos verificando se eles [as OTTs] estão trazendo competição para o setor e contestando a situação de incumbentes com poder de mercado significativo, […] com mudanças nos contornos de mercados como voz e vídeo”. Em última instância, a avaliação deste impacto pode refletir na redução da carga regulatória do PGMC sobre as teles.

“Não vamos colocar remédio em cima de OTT, até porque por lei uma coisa é telecom e outra, serviço adicionado e aplicações, mas nada impede que na fronteira a gente possa se posicionar. Já estabelecer obrigações para eles no curto prazo não é o objetivo”, prosseguiu Borges.

Para a Claro, ainda que não através do PGMC, as obrigações para as OTTs também deveriam ser endereçadas pela agência (assim como começa a ser discutido em outros países). “Como a gente faz para esses grandes grupos que se utilizam da infraestrutura de telecom participem também do desenvolvimento do nosso mercado e do estímulo ao investimento?”, questionou a diretora regulatória da operadora, Monique Barros.

“A demanda por vídeo, que há dez anos não existia, hoje não para de crescer e as OTTs são as grandes geradoras”, completou Barros, sugerindo que outros regulamentos da agência abordem o dilema. No caso do PGMC, a avaliação do impacto competitivo já gerado pelas empresas de aplicações foi apoiada pela operadora. “Se tem pouca competição tradicional em um município mas as OTTs suprem a necessidade, pode se avaliar que há competição suficiente”, argumentou a diretora da Claro.

Mudanças

A nova versão do PGMC em elaboração deverá incluir e retirar mercados relevantes (que recebem os estímulos para competição). No caso das redes neutras de FTTH, a Anatel está avaliando de perto os desdobramentos comerciais entre os players e considerando tal impacto na competição, mas Borges indicou que a vertical ainda não será vista como um mercado específico.

Já no caso do espectro, o superintendente reiterou que a “Anatel pode falar de possível mercado de exploração industrial de radiofrequências, com balizas que precisam ser discutidas no Regulamento de Uso de Espectro (RUE)”. Assim, o PGMC seria uma instrumento adicional para lidar com a concentração no segmento móvel disparada pela venda da Oi Móvel.

A Claro, por sua vez, é contra a inclusão das radiofrequências como mercado relevante. “O mercado de frequências já existe e até hoje não temos nenhuma demanda não atendida por utilização de espectro. Não existe demanda reprimida”, alegou Barros. “A própria Anatel já disse que não é hora de regular ex ante [previamente] o mercado secundário”.

Para a diretora da operadora, a inclusão do espectro no PGMC poderia até mesmo desestimular a participação de empresas em licitações de espectro. “Se eu não participo do edital mas posso ter acesso às mesmas radiofrequências sem custo ou com custo inferior, isso traz insegurança para o modelo de editais de licitação”.

PPPs

Em paralelo, Monique Barros também questionou a caracterização de empresas como prestadoras de pequeno porte (PPPs) definida pelo PGMC, mas que reflete em outros regulamentos da agência como qualidade, atendimento e consumidor. No cenário ideal para a Claro, outras condicionantes além do market share nacional seriam utilizadas para a definição de quem são as pequenas.

“Existem hoje prestadoras que individualmente parecem muito pequenas, mas se você olha o grupo que elas pertencem, é de enorme porte, com negociações na bolsa e investidores gigantescos aportando muito capital”, afirmou ela. Pela Anatel, Borges sinalizou que a agência ainda não verificou necessidade de mudança na caracterização das PPPs.

Outro ponto que deve ser mantido é a caracterização da interconexão como mercado relevante – não tanto pela questão preço, mas por condicionantes técnicas, de acordo com Borges. Já a Exploração Industrial de Linhas Dedicadas (EILD) pode ser revista como mercado relevante.

“O EILD ainda tem importância, com mais de 10 mil links na base do SNOA [Sistema de Negociação de Ofertas de Atacado, plataforma da Anatel para relações do tipo], mas tem reduzido porque o número de desconexões é maior que o de ativações. Ele é um insumo complementar para quem está chegando, mas a gente percebe que EILD tem perdido importância em relação ao último ciclo, com opções mais modernas surgindo”.