A Icatu se posiciona como a maior seguradora independente do Brasil em vida, previdência e capitalização, com R$ 60 bilhões sob sua gestão. Ao todo, tem 8 milhões de clientes, distribuídos entre seus diversos parceiros, pois atua em um modelo B2B2C. Seu produto de maior sucesso é o seguro de vida, cuja procura cresceu bastante durante a pandemia. Em entrevista para Mobile Time, o CEO da Icatu, Luciano Snel, fala sobre transformação digital, seguros dinâmicos, venda através de apps e expectativas para o open insurance. O executivo, aliás, entende que ainda é cedo para saber quem vai ganhar ou perder com a possibilidade de transferência de dados entre seguradoras. “O open insurance é uma página em branco”, compara.

Mobile Time – A Icatu é a maior seguradora independente do Brasil em vida, previdência e capitalização. O seguro de vida ainda parece ser um tabu no País. Por que? E como mudar isso?

Luciano Snel – Para responder a essa pergunta vou voltar alguns anos em minha análise. Desde que o Brasil iniciou um período de inflação sob controle (o ano passado foi atípico) e juros baixos, o brasileiro foi aprendendo a investir em previdência privada, com PGBL e VGBL. E as seguradoras foram desenvolvendo esse mercado. A Icatu criou um modelo de arquitetura aberta em fundos de previdência. Trouxemos os melhores gestores do Brasil, ampliamos os produtos oferecidos, com fundos multimercado. Trouxemos também opções para investidores de varejo, private banks etc. Nos últimos dois anos de crise e incerteza econômica, o mercado teve captação líquida positiva. Ou seja, entrou mais dinheiro do que saiu. A previdência privada se tornou um objeto de desejo do brasileiro, um produto de primeira necessidade. E o que falta para isso acontecer com o seguro de vida? Do nosso lado, ampliamos nosso portfólio de seguro de vida individual, em grupo e para PMEs. E investimos em infraestrutura de tecnologia para preparar a Icatu para esse mundo novo que está chegando. 

Sempre pensamos que a pessoa que contratou um plano de previdência está olhando para os próximos 30 anos. Fez uma decisão difícil, de longo prazo, se comprometeu… É uma jornada longa e nela imprevistos podem acontecer. Por isso, o casamento entre seguro de vida e previdência é quase perfeito. Você protege sua família caso certos eventos aconteçam, como uma doença grave. E o seguro de vida é mais acessível do que as pessoas pensam.  Geralmente se compara com seguro de automóvel ou de saúde, mas o seguro de vida é muito mais barato.

A pandemia impactou na demanda por seguro de vida?

Sim. As pessoas perceberam quão frágeis nós somos, quão vulneráveis. E as conexões afetivas ficaram mais fortes. Notamos um crescimento na curiosidade sobre o seguro de vida, sobre seus tipos de cobertura, seu preço, sua transparência etc. A quantidade de cotações aumentou fortemente. A gente cresceu 24% no ano passado em seguro de vida, atingindo R$ 3 bilhões em arrecadação. A busca por seguro de vida no Google mais do que dobrou. Acho que chegou para ficar. E empresas também estão valorizando esse tipo de benefício.

Mas deixou de ser tabu?

Falar sobre a morte sempre foi um tabu. Mas hoje as pessoas sabem as estatísticas por conta da pandemia: quantas pessoas morreram na sua cidade, no seu estado, no Brasil… Infelizmente todo mundo perdeu gente próxima. A morte se aproximou da realidade de todos. Ao mesmo tempo surgiram fintechs e os brasileiros estão se conectando e querendo resolver sua vida em diferentes canais. Nossa missão é democratizar o acesso a esse produto, que chamamos de proteção financeira e planejamento financeiro. Temos que criar o ecossistema e ter cabeça aberta para aprender, testar e nos conectarmos o máximo possível com fornecedores, startups, fintechs, acelerando o aprendizado e o conhecimento.

Quantas vidas estão seguradas pela Icatu?

Temos ao todo 8 milhões de clientes, sendo pelo menos 6 milhões com seguro de vida, ou seguro de pessoas, como chamamos, por abranger vários outros. É o nosso principal produto.

O seguro de pessoa abrange quais outros seguros?

Se for um profissional liberal, por exemplo, além de cobertura por morte e invalidez, temos diária por internação hospitalar, ou diária por incapacidade temporária. O mercado de seguros de pessoas no Brasil cresceu 14% em faturamento no ano passado e na Icatu, 24%.

A Icatu fechou uma parceria com a startup chilena Betterfly, que dá benefícios para os segurados que praticam exercícios e outras atividades de bem-estar. A comercialização desse seguro é feita para o mercado corporativo, ou seja, para empresas que querem oferecê-lo como um benefício aos seus colaboradores. Como estão as vendas desse produto no Brasil?

Fizemos um soft opening com a Betterfly, com a equipe comercial deles. Já implementaram em umas 10 empresas, a maioria startups. Mas o lançamento para valer deve ser depois do carnaval. Os planos da Betterfly são de atingir 1 milhão de clientes em até três anos. E no mundo querem chegar a 50 milhões de vidas. O Brasil é o pontapé inicial da internacionalização da Betterfly.

Icatu

Luciano Snel, CEO da Icatu: “O open insurance é uma página em branco a ser escrita e aprendida ao longo dos próximos anos”

A Icatu pretende firmar outras parcerias na área de tecnologia este ano?

Somos uma empresa B2B2C. Enxergamos a Icatu como uma empresa de projetos. Temos uma área enorme de tecnologia e projetos, para a gente se plugar aos nossos parceiros comerciais, como corretores, cooperativas de crédito e fintechs.Vemos a Icatu não como uma fábrica de produtos de seguros, mas como uma empresa cujo objetivo é agregar valor para o parceiro. Temos uma rede de mais de 10 mil corretores que trabalham conosco, além de parcerias com fintechs, varejistas, plataformas de investimento etc.

Já pensaram em firmar parcerias com operadoras de telecomunicações? Faz sentido vender seguro através de uma operadora?

Sim, faz sentido vender via operadora. Se a operadora estiver fornecendo serviços financeiros, faz mais sentido ainda. Acho que toda empresa vai ter um braço de fintech, seja para prover condições de pagamento mais simples, ou financiamento etc. Se tiver um app de fintech, os produtos de seguros ficam mais óbvios. Tenho visto as telecoms criando seus braços financeiros.

Mas alguma conversa já foi iniciada?

O momento de cada companhia varia em função de suas prioridades, seu momento etc. Estamos sempre abertos a conversar. 

Como está acontecendo o processo de transformação digital dentro da Icatu?

A nossa transformação digital começou lá atrás, preparando a infraestrutura e a arquitetura de sistemas que pudessem suportar esse desenvolvimento  acelerado pelo qual o mercado está passando. Criamos as bases e alicerces lá atrás. E são diversas iniciativas em andamento, como o open insurance, com exigências da Susep para cumprirmos. Queremos aprender sobre o desdobramento do open insurance. Nosso modelo B2B2C é muito virtuoso: aprendemos muito com nossos parceiros e testamos muitas hipóteses. Temos um time de 50 pessoas envolvidas em open insurance, desde consultoria externa até desenvolvimento tecnológico, segurança da informação, proteção de dados e ampliação do nosso data lake – revendo todas as permissões necessárias em relação a isso.

Além disso, temos investido em facilidade no processo de venda, tanto pré quanto pós-venda, avaliando toda a experiência do cliente. E temos uma plataforma chamada de Casa do Corretor, voltada para os corretores.

E temos também um portal de APIs. Todas as plataformas digitais de investimento estão plugadas na Icatu. Temos 150 gestores de recursos de sua arquitetura aberta de fundos e previdência, plugada em todas as plataformas digitais de investimento. Um gestor de recursos que queira lançar um fundo de previdência vê que já estou plugado em todas as plataformas. E para um fundo de previdência, já estou com todos os gestores. É um ciclo virtuoso, que se retroalimenta. 

Qual o tamanho da sua equipe de TI?

Temos uma equipe de tecnologia e experiência digital composta por 400 pessoas. 

O que acha da venda de seguros através de apps, como um autosserviço?

Acho ótimo ter cada vez mais experimentações de teses e conceitos que ajudam a disseminar a categoria e sua relevância. Para a democratização do produto, todo novo modelo e novo entrante são benéficos ao mercado. Aqui no Brasil já temos parceria com o Inter, que oferece previdência como autosserviço. Temos parceria também com Guiabolso, com quem tínhamos vida e previdência dentro do app deles. E também com Warren e Creditas. Os clientes estão demandando novas formas de se relacionar com seu banco ou empresa.

Qual é a participação de seguros vendidos via apps, contratados diretamente pelo cliente, sobre o total de novas vendas da Icatu?

A autocontratação ainda é incipiente. A presença de um consultor financeiro ou corretor fazendo a consultoria ainda tem um valor agregado e representa a maior parte. O autosserviço é um modelo em fase de aprendizado. Vai ter espaço para todos os modelos. Para democratizar o acesso precisamos oferecer em qualquer canal e formato que o cliente queira e se sinta mais confortável em fazer a contratação. 

Qual a sua opinião sobre a tendência de seguros dinâmicos, que podem ser ligados e desligados conforme a necessidade do segurado?

Desenhamos um produto com jornada completa de um seguro de acidentes pessoais que liga e desliga. Por exemplo, se a pessoa achar que está mais sujeita a risco quando pega uma estrada ou anda de avião, poderia ligar o seguro ou aumentar a cobertura por acidente e desligar quando chegasse ao seu destino. Mas como somos B2B2C, procuramos parceiros interessados em oferecer isso para os seus clientes.

Quando começou o open banking, acreditava-se que os bancos tradicionais seriam os mais afetados negativamente, enquanto as startups seriam beneficiadas. Mas até agora o que se viu foram poucas fintechs se cadastrando para operar no open banking, enquanto bancos tradicionais estão até fazendo propaganda para estimular e ensinar o público sobre o assunto. Vai acontecer o mesmo no open insurance?

O open insurance é uma página em branco a ser escrita e aprendida ao longo dos próximos anos. É uma novidade no mundo inteiro. O open banking tem experiências em alguns países, mas em open insurance o Brasil é pioneiro no mundo. Não dá para saber quem vai ganhar ou perder ainda. Vale lembrar que o open insurance é caro. Estar em compliance com as regras do Banco Central e da Susep dentro do tempo exigido não é barato. Requer investimento importante para atender os requisitos mínimos necessários. O que dá para afirmar é que o consumidor vai sair ganhando. Terá mais mobilidade e melhor uso dos seus dados. Mas hoje é uma página em branco para todo mundo. Como temos centenas de parcerias comerciais com os mais variados players dos mais variados segmentos no Brasil, acompanharemos de perto as demandas e os testes feitos.