| Publicada originalmente no Teletime | A associação comercial NetChoice, que reúne grandes empresas de tecnologia dos Estados Unidos, acusou o Brasil de adotar práticas comerciais desleais e de manter um “regime de censura” contra plataformas digitais norte-americanas. A entidade afirmou que medidas brasileiras de regulação e tributação criam um “ambiente hostil” para as big techs daquele país.
Com essa nova manifestação de uma associação ligada às big techs, pelo menos quatro entidades de tecnologia dos Estados Unidos criticam abertamente o Brasil, apontando responsabilidades do Legislativo, da Anatel, de diversos órgãos do Executivo e do próprio Supremo Tribunal Federal (STF).
NetChoice
Os comentários da NetChoice foram enviados ao Escritório do Representante de Comércio dos Estados Unidos (USTR). Eles estão no âmbito de uma investigação da Seção 301 — aberta em 15 de julho a pedido do presidente norte-americano Donald Trump, para apurar se práticas do governo brasileiro estão prejudicando companhias baseadas por lá.
Nesse caso, exemplos citados pela NetChoice como ameaças incluem a regulação de plataformas inspirada no modelo europeu, medidas de taxação de big techs e o antigo PL das Fake News, além de regras para inteligência artificial (IA) e decisões recentes do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a responsabilização de plataformas.
A entidade também mostrou preocupação quemedidas brasileiras possam servir de modelo para outros países, ampliando os obstáculos às companhias dos EUA em escala global.
“Nossos membros, plataformas tecnológicas e prestadores de serviços digitais líderes dos EUA, experimentaram em primeira mão a censura digital cada vez mais agressiva do Brasil e a extrapolação regulatória que mina a concorrência justa e viola princípios fundamentais da liberdade de expressão”, disse a NetChoice.
Para a entidade, um dos pontos mais críticos é o tratamento dado pelo STF a big techs dos Estados Unidos. “Talvez o mais preocupante seja o fato de o Supremo Tribunal Federal ter concedido a si mesmo autoridade sem precedentes para emitir ordens imediatas de remoção de conteúdo sem autorização legislativa ou procedimentos judiciais tradicionais, criando um ambiente regulatório no qual empresas americanas enfrentam ações imprevisíveis”, afirmou.
Regulação de big techs
O documento também criticou propostas em discussão no Ministério da Fazenda para regular plataformas digitais de forma semelhante ao modelo europeu — contra o qual a NetChoice também já se posicionou contra.
“Como resultado,as medidas minariam a capacidade competitiva de empresas americanas no Brasil, afetariam empregos nos EUA ao longo da cadeia de valor e reduziriam os recursos disponíveis para pesquisa e desenvolvimento”, argumentou o documento.
Outro ponto levantado é a tributação. Em referência à Medida Provisória nº 1262/24, que instituiu um imposto mínimo de 15% sobre multinacionais, a associação afirmou que “a aplicação seletiva desses impostos distorce a concorrência, viola obrigações de tratamento nacional em acordos de comércio internacional e funciona como uma tarifa indireta sobre o comércio digital”.
Nem mesmo o marco legal de uso da Inteligência Artificial no Brasil, aprovado ano passado no Senado, ficou de fora das críticas. “O efeito cumulativo dessas disposições seria restringir a inovação dos EUA e limitar o acesso das empresas americanas ao mercado brasileiro”, justificou a entidade.
Por fim, a entidade defendeu a atuação do governo norte-americano ao apoiar investigação do USTR. “A campanha do Brasil de censura digital, regulação ex ante, tributação discriminatória, regulações protecionistas de IA e aplicação seletiva representa um esforço coordenado para extrair o máximo valor de empresas americanas de tecnologia, ao mesmo tempo em que restringe sua capacidade de competir de forma justa”, escreveu.
Europa
Não é a primeira vez que essa entidade questiona regulações de big techs pelo mundo. O mesmo ocorreu na União Europeia com o DSA (que regula transparência e moderação de plataformas) e o DMA (que limita abusos de grandes empresas digitais).
Em dezembro de 2020, a NetChoice declarou que esses dois projetos na Europa sujeitam empresas com regulamentações sufocantes e penalidades severas. “Essas propostas prejudicam a escolha do consumidor em vez de harmonizar a regulação europeia para fomentar inovação e avanço no setor global de tecnologia”, escreveu a entidade, na época.
NetChoice também criticou a Online Safety Act (OSA), lei britânica de regulação de redes sociais, com foco na proteção de menores. No final do mês passado, inclusive, a associação publicou comunicado afirmando que a aplicação das regras inglesas já resultou em bloqueios de conteúdos legítimos e exigências de verificação de identidade via documentos.
A NetChoice é uma associação empresarial sediada em Washington, D.C. Ela defende os interesses de grandes big techs, principalmente as que têm sede nos Estados Unidos. Entre as associadas estão redes sociais como Meta (Facebook e Instagram), X (ex-Twitter), Pinterest, Reddit, Airbnb e Snapchat, além de gigantes como Google e Amazon.