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O Brasil viveu nos últimos anos uma revolução na oferta de serviços financeiros digitais para o consumidor final, com o surgimento de centenas de fintechs e a disseminação de smartphones junto à população. Porém, o mercado de serviços financeiros para empresas não acompanhou na mesma velocidade, por diversas razões, e está agora “mais de uma década atrasado”, na avaliação de Boanerges Ramos Freire, presidente da consultoria da Boanerges & Cia, em conversa com Mobile Time. Enquanto a oferta de serviços financeiros para pessoas físicas se tornou um oceano vermelho em razão da alta competição, aquele para pessoas jurídicas é um oceano azul a ser explorado.

Era natural que a prioridade nesse processo de digitalização do setor financeiro fosse inicialmente o consumidor final, em razão da massa de pessoas, da facilidade de venda e das altas margens de lucro. Mas com o passar do tempo e o aumento da competição o cenário foi ficando mais complicado. “Hoje há muita competição e dificuldade na diferenciação porque, no limite, tudo se assemelha e se comoditiza. E as margens tendem a cair. É preciso inovar continuamente para ter um diferencial”, analisa. Ele cita, por exemplo, o segmento de carteiras digitais: “São mais de 600 carteiras digitais. Passou do ponto. Vai começar a refluir”.

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Boanerges Ramos Freire: “Há espaço para um salto gigantesco em serviços financeiros para PJ”. Foto: divulgação

As empresas, por sua vez, têm processos estruturados, são mais conservadoras e acabam demorando mais para tomar a decisão de mudar de provedor de serviço financeiro, explica. “O mercado de serviços financeiros para PJ é mal servido porque tem menos concorrência e porque é mais difícil trabalhar nele. A venda é consultiva e mais complexa, não é massificada pela Internet”, comenta.

Só que o tamanho do segmento corporativo para serviços financeiros é muito maior que aquele para pessoas físicas, seja em volume de pagamentos, crédito, seguros, ou quase qualquer outra métrica que for escolhida – menos, claro, em quantidade de contas. Como exemplo, Freire compara o volume total de pagamentos em 2019 no Brasil, por segmento: enquanto as pessoas físicas fizeram R$ 4,3 trilhões em pagamentos; os governos registraram R$ 1,8 trilhão; e as empresas, R$ 10,8 trilhões. Ou seja, empresas transacionam em pagamentos ao longo do ano mais que o dobro que pessoas físicas no Brasil.

Open banking e âncora

A chegada do open banking valerá também para contas de pessoas jurídicas, o que abrirá uma oportunidade para novos players explorarem esse segmento, aponta Boanerges. Além disso, o consultor acredita que há espaço para o surgimento do que chama de “âncoras” de novos ecossistemas financeiros. Trata-se de grandes empresas de outros setores que não o de finanças mas que passam a oferecer serviços financeiros para seus fornecedores, clientes e parceiros em geral.

“A empresa âncora aproveita seu ecossistema de negócios para criar ao seu redor um ecossistema financeiro levando em conta a sua realidade. Ela pode fazer isso sem virar banco, mas com apoio de vários agentes do mercado, se tornando uma espécie de orquestradora disso. Ela pode ser mais flexível na hora de dar crédito para um fornecedor, de maneira a fidelizá-lo, por exemplo”, descreve. 

“Daqui para frente, cada vez mais, temos que nos acostumar a falar de provedores de serviços financeiros que podem ser bancos, ou fintechs, ou uma empresa de telefonia, uma varejista, uma indústria, um atacadista etc. Como disse Bill Gates: serviços financeiros são indispensáveis, mas os bancos não são. Há espaço para um salto gigantesco em serviços financeiros para PJ”, conclui.