Os pescadores da cidade acreana de Feijó começaram a usar smartphones e três aplicativos para monitorar lagos e a produção da pesqueira da região. Em uma iniciativa da ONG ambiental WWF, a ação faz parte do projeto Pesca Sustentável, realizado em parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social(BNDES).

O uso dos apps é voluntário e realizado com seis pescadores da região de Feijó em seus seis lagos. Esses pescadores são chamados de “coletores de dados”. Eles analisam informações dos lagos, pesam os peixes, informam quantias coletadas, registram os moradores das comunidades, assim como eventos de pesca ilegal. Antes do uso dos apps e do smartphone o trabalho de monitoramento era feito em formulários de papel.

“Com as chuvas na Amazônia, eles corriam o risco de perder as informações que eram registradas em papel e lápis. Às vezes era difícil de entender os dados, por caligrafia ruim ou erro de informação”, relata Antonio Oviedo, especialista de pesca do WWF.

“Usando um app eles conseguem evitar esses problemas. Esse ambiente digital facilita muito. E o tempo que o pescador leva é menor”, completa.

Pescadores analistas

Os coletores foram selecionados pelo WWF após avaliação de conhecimento da região, lagos, uso de dispositivos móveis, nomes de peixes e dos pescadores. Eles receberam treinamento de três dias para conhecer o projeto, o aparelho que utilizaram (Sony Xperia M2 Aqua à prova d’água) e os aplicativos “Comunidades” (socioeconômico), “Observatório” (registro de eventos e atividades) e Pesca + (coleta de dados sobre a pesca).

O resultado do treinamento surpreendeu Oviedo. Para ele, os pescadores aprenderam “muito rápido” a utilizar o smartphone com sistema Android e tela touch screen. Antes eles usavam apenas celulares de entrada (feature phones). Com pouco mais de cinco meses de trabalho, os coletores já apresentaram 77 registros, apenas 10% dos dados foram descartados e nenhum smartphone foi danificado.

“Como é fácil de usar (smartphone e app), o pessoal da comunidade de pescadores está acompanhando e aprendendo junto com a equipe do WWF, e dando treinamento aos outros pescadores”, afirma Charles Guimarães, presidente da Colônia de Pescadores de Feijó. Ele afirma que também ajuda na coleta de dados. “Afinal, é uma técnica muito mais fácil acompanhar com o smartphone do que estar indo à beira do lago, pesando os peixes e colocando as anotações no papel”.

Por ter dificuldade de acesso à Internet móvel na região – alguns dos lagos possuem três dias de distância de Feijó – os apps funcionam em modo offline e as informações são baixadas para um notebook entre 30 e 40 dias, em uma reunião com os pescadores e o WWF para analisar os dados. No entanto, a distância não diminuiu a vontade dos pescadores em colaborar com a busca por mais dados.

Uso dos aplicativos

Dois aplicativos foram usados nos primeiros meses e um terceiro foi instalado recentemente nos smartphones. O app Comunidades registra o nome do morador da casa e sua comunidade, e marca a residência por GPS. O segundo, chamado Observatório, é uma forma de registrar eventos como pesca e desmatamento ilegal. O último app, o Pesca +, é um coletor de dados sobre a atividade pesqueira em um rio ou lago.

Os aplicativos foram desenvolvidos por Oviedo com a ajuda de um consultor da ONG Global Canopy Programm que atua na Reserva Extrativista Chico Mendes. Os três apps são uma adaptação de aplicação criada para controle de insumos dados pelo governo na instituição. Oviedo sentou-se com o consultor e em um mês criaram os apps através da plataforma ODK.

Questionado se essas aplicações já deram um retorno em dados aos pescadores, Oviedo afirma que sim. “A gente consegue verificar qualquer ilegalidade na região. Já teve casos que a gente registrou pesca ilegal e avisamos o órgão regulador”, afirma o especialista.

O aplicativo Pesca + é o que deu mais resultado até o momento. “Com o app de pesca, nós já estamos conseguindo ter uma ‘fotografia’ interessante dos lagos. Quais são os produtivos, que têm mais peixe, quais estão usando rede de pesca que não estavam no ‘acordo de pesca’ (feito entre o WWF e os pescadores para não acabar com espécies mais jovens). Por exemplo, tinha um lago que utilizou uma rede menor que a malha de 7 (centímetros) e pegava peixe pequeno. Tivemos que alertar para terminarem com o uso”.

Próximas etapas

Para as próximas etapas, o WWF deve continuar trabalhando na região de Feijó. Os seis smartphones foram comprados pela ONG e fornecidos aos pescadores. Ainda faltam três lagos dentro do município acreano. No entanto, Oviedo afirma que até o fim de 2015 os três lagos que faltam terão representantes com smartphones. E mais cinco lagos de comunidades próximas devem receber novos coletores de dados.

Sem presença dos apps em lojas de aplicativos, ele ainda cogita levar as suas criações para outros lugares do seio amazônico, mas afirma que depende de adaptação.

"Nosso foco é de trabalhar nessa região de Feijó, para consolidar esse projeto e esse sistema do manejo (da atividade pesqueira na região). Como o WWF tem atuação em todos os biomas do Brasil, eu acho que a gente pode começar a influenciar outros parceiros."