Na sexta e última matéria da série sobre o metaverso, Mobile Time conversa com especialistas sobre o revés da Meta no resultado financeiro de 2021. Mas também sobre as dificuldades de medir o valor de mercado do metaverso, uma vez que é uma nova fronteira da tecnologia que está sendo desbravada. E se o mercado for com muito apetite para um tema que ainda está em construção?

Entenda

A introdução do conceito de metaverso pela Meta, em novembro do ano passado, ajudou a reduzir a repercussão negativa que a companhia estava sofrendo de governos, reguladores e sociedade civil. A empresa mudou o ciclo das notícias negativas em prol do seu avanço tecnológico e do rebranding de Facebook para Meta. Porém, o mercado viu com certo ceticismo a aposta do CEO Mark Zuckerberg em criar um universo que junta os mundos físico e digital.

Além da perda de receita com publicidade e com a disputa com rivais – como o TikTok – em 2021, a companhia também encarou questionamentos do mercado pela aposta nesta nova fronteira da tecnologia. Como resultado, a Meta perdeu US$ 250 bilhões de valor de mercado em uma semana.

No primeiro trimestre de 2021, a divisão responsável por criar produtos para o Metaverso, Reality Labs, registrou um prejuízo de US$ 2,96 bilhões no período, em comparação com uma perda de US$ 1,83 bilhão no primeiro trimestre de 2021.

Rapidamente, Zuckerberg tratou de atender os seus investidores e público para reduzir a sangria. Em um evento sobre inteligência artificial de sua empresa, o CEO afirmou que o metaverso é uma aposta de longo prazo: “Na Meta, somos movidos por propósitos de longo prazo. Por exemplo, as novidades que estamos vendo hoje em inteligência artificial é algo que estava nas nossas apostas de longo prazo. É o caso do aprendizado autossupervisionado (self-supervised learning ou SSL, no original em inglês) que usamos em nossas pesquisas”, disse em março.

Clareza

Rafael Nobre, analista da XP, aponta que o posicionamento da Meta ainda é um pouco dúbio. Embora seja a empresa que mais investe no tema e tenha criado propriedades intelectuais de criptomoedas e wallets, a companhia ainda não explicou ao mercado como deseja construir seu metaverso voltado para o público: um Facebook Digital ou uma engine de interface gráfica, como o Roblox.

Esse problema é visto também por Guilherme Moika, consultor e engenheiro do CESAR. Ele lembra que para qualquer empresa existe risco no curto, médio e longo prazo. Mas, neste caso, o risco é que o metaverso ainda está em desenvolvimento e se esses experimentos não trouxerem retorno financeiro, os aportes podem ser considerados como “desperdício”. Um exemplo de aposta que não deu certo foi a da Microsoft em celular, que gerou um prejuízo superior a US$ 8 bilhões.

Ainda assim, Moika acredita que a Meta deve emplacar bons resultados no futuro.

Outro que aposta no potencial da Meta é Fernando Moulin, consultor da Sponsorbob e professor da ESPM. Para ele, é natural o ceticismo do mercado com a nova estratégia da companhia: “Toda vez que tem ‘pivotagem’ de estratégia de negócios, você pode sofrer impactos no mercado que mira o curto prazo”, diz.

“Nós podemos ver uma derrocada do negócio, se a Meta não alcançar os seus objetivos. Mas, eu apostaria neles”, completa.

Valor de mercado

Jennie Li, estrategista de ações da XP, explica que há grandes desafios de criação e precificação na criação de qualquer metaverso. Em especial por ser um tema novo e difícil de precificar valor em cima disso: “São grandes desafios, do ponto de vista de mercado – que é um pouco mais fundamentalista – , o desafio é colocar mais valor em cima disso. Não tem justificativa para esses gastos de milhões de dólares ainda (em investimentos e NFTs)”, diz.

“Para uma pessoa física, se ele entra no mercado e vê volatilidade nos preços, isso pode assustar. Até para gente – analista de ativos – é difícil justificar o preço. Ainda não existe um conceito de calcular esse mercado ante um ativo mais tradicional com métodos, consenso, estudos e teorias para cálculos”, completa.

Apetite demais

Mobile Time ainda perguntou aos executivos se o mercado colocou muita expectativa no metaverso e se o fato de empresas correrem para entrar nesse mundo virtual – que ainda está sendo criado – apenas para surfar na onda, pode ter atrapalhado os planos da Meta e de outras empresas que estão desenvolvendo suas experiências virtuais.

Li, da XP, acredita que esse movimento desenfreado das empresas está muito ligado ao medo de ficarem fora (FOMO): “Ainda estamos vivendo muito no início. Existe muita especulação, muito FOMO. É igual quando começamos na Internet”, conclui.

Moika, do CESAR, compara a vontade dessas empresas com o movimento que ocorreu na cloud, quando companhias falavam que adotavam tecnologias em nuvem, mas, na prática, poucas faziam. Lembra também do começo da realidade virtual nos anos 1990, que teve experiências igualmente ruins.

“Quando vimos a cloud, foi algo parecido. Ninguém entendia o que era nuvem. Tinha um desentendimento geral. Vimos serviços que não eram nuvem, usando o nome ‘nuvem’. E depois que passou o topo da onda, nós vimos estabilização. A palavra cloud não é mais hype, mas seu conceito está amadurecido e é utilizado. A mesma coisa com realidade virtual. Tanto que a primeira experiência foi usando espelhos e ótica. Fracassou várias vezes, mas voltou com força seis anos atrás”, explica o especialista do CESAR. “É natural. Ninguém quer ficar para trás. Isso não é ruim e não atrapalha o metaverso. O que vemos é não chegar no conceito. Pegando o exemplo dos podcasts, ele foi lapidado, mas existia há muito tempo. Acredito que o termo metaverso terá ondas”, completa.