O uso do SMS como canal de comunicação entre candidatos a cargos políticos e eleitores nas eleições deste ano provavelmente se concentrará em brokers não homologados pelas operadoras, prevê o CEO da Zenvia, Cássio Machado. As teles planejam liberar o serviço, mas com restrições para proteger a privacidade de seus usuários e cumprir a legislação eleitoral, o que talvez empurre candidatos a cargos no poder legislativo a optarem pelos canais não-oficiais. O executivo prevê que as eleições de 2014 vão bater recorde em volume de SMS, ultrapassando 500 milhões durante os meses de campanha, dos quais apenas 5% serão feitos através de brokers homologados. Em entrevista a MOBILE TIME, o executivo falou também sobre o crescimento do mercado de SMS corporativo no Brasil, a competição com serviços OTT e o sonho de abrir capital no futuro.

MOBILE TIME – Se na comunicação entre usuários finais o SMS tem perdido força, no corporativo esse canal segue crescendo. Qual é o tamanho hoje do mercado brasileiro de SMS corporativo?

Cássio Machado – Não tem ninguém que meça esse mercado. Existe o mercado oficial, das operadoras, e o não-oficial. Estimo que sejam 500 milhões de mensagens de texto por mês somando os dois.

Qual é a proporção entre o mercado oficial e o não-oficial, também chamado de "SMS pirata"?

O oficial deve ser de aproximadamente 300 milhões de mensagens. O não-oficial é difícil de medir, mas seria algo em torno de 200 milhões. Talvez o total seja superior a 500 milhões… é um chute por baixo.

Que verticais têm puxado mais o crescimento do mercado corporativo de SMS?

O SMS corporativo teve a primeira onda com o mercado de cobrança. Hoje é uma ferramenta indispensável para qualquer empresa de cobrança. Ao longo do tempo mais empresas aprenderam a usar o SMS. Atualmente temos mais de 4,3 mil clientes de todos os setores. Já mapeamos mais de 100 usos completamente diferentes. As empresas de serviços, que têm relação mais densa com o consumidor, são as que puxam o uso de mensagens, desde empresas financeiras até aquelas de saúde, educação, comunicação e mídia.

Com que velocidade o mercado de SMS corporativo está crescendo?

Cresce 20% ao ano.

Qual o seu balanço da campanha movida pelo MEF contra o SMS pirata até agora?

O MEF tem um papel importante de educar o mercado. Traz à tona algo que as empresas não entendiam e que as próprias teles tinham dificuldade de lidar. O MEF tem papel fundamental de conscientização. O problema agora está nas mãos das operadoras, que são quem tem condição de bloquear os furos do serviço, que permitem o envio de SMS não-oficial.

Que furos são esses?

Alguns SIMcards 3G de mini-modems USB para notebooks tinham SMS liberado. Outro exemplo: a oferta de SMS ilimitado em planos pré-pagos. Mesmo que algumas teles limitem em, digamos, 500 mensagens por dia, ainda compensa comprar esse SIMcard e revender mensagens para o mercado corporativo. Existe também o furo do plano corporativo, em que se revende o SMS do plano usando um hardware que pode enviar mensagens (chipeira), a partir de um SIMcard de pessoa jurídica. E tem os furos da rede SS7, nos acordos de roaming internacional. As teles que terceirizam os acordos de roaming têm controle melhor do tráfego. E há ainda as mochilas que fazem broadcast de SMS: o cara consegue enviar mensagens para todo mundo que passar pela mesma ERB onde ele está. Já vimos propostas disso no Brasil.

Existe um selo do MEF para integradores homologados, não?

Por mais que haja um selo, tem empresas que buscam se certificar que provedor faz trabalho lícito e outras que não têm essa preocupação, às vezes porque nem sabem que existe pirataria ou porque buscam apenas preço. Um comprador nem sempre tem conhecimento para avaliar a qualidade de um fornecedor. Compra 1 mil mensagens e não sabe nem conferir se todas chegaram.

No fim do ano passado as operadoras decidiram baixar o preço do SMS marketing, o que era uma demanda antiga dos brokers homologados. Qual foi o impacto dessa decisão até o momento?

O mercado está se abrindo. Já conseguimos fazer (SMS marketing) com as principais operadoras. E temos já alguns primeiros cases relevantes. É algo que está começando agora. Como as teles proibiram esse mercado por um tempo, as empresas precisam aprender que agora é possível. Hoje o SMS marketing deve representar cerca de 5% do nosso volume. Estamos operando com isso há apenas um trimestre.

As teles estão discutindo a liberação do SMS eleitoral. Qual a sua opinião sobre o tema?

O SMS eleitoral vai acontecer independentemente das teles quererem ou não. Já aconteceu outras vezes. A questão é se as teles vão rentabilizar ou não. É uma escolha delas. O grande problema da operadora é que se ela decidir rentabilizar, ela assume uma responsabilidade em relação à legislação do TSE e em relação à privacidade do próprio usuário, que precisa ser respeitada. Se a operadora flexibilizar demais, vai ter trabalho. Se endurecer demais, não vai ter tráfego. É provável que na pressa de uma campanha os políticos priorizem preço e simplicidade. Se as regras das teles forem duras demais em comparação ao mercado não-oficial, os políticos vão escolher a opção mais simples.

Quais cuidados você entende serem necessários no caso de uma oferta de SMS eleitoral?

O grande entrave do SMS eleitoral é o opt-in. O opt-out a gente considera que é obrigatório e deve ser respeitado não apenas em SMS eleitoral, mas em todo tipo de SMS em que se quer vender alguma coisa. No eleitoral são raros os instrumentos que um político tem para conseguir o opt-in. E se for exigido um duplo opt-in o mercado vai 100% para os players não-oficiais.

Não poderiam pegar o opt-in no site do partido ou em campanhas nas ruas?

É trabalhoso. Na decisão de campanha, optam pelo caminho mais fácil. Eles têm uma base de opt-in, mas captada de forma orgânica. Vale lembrar que os políticos trabalham sempre com a divulgação do seu número de candidato. Se ainda por cima precisarem comunicar o número de um large account de SMS para fazer o opt-in,  a comunicação não funciona. É uma questão de mnemônico. A comunicação política tem que ser muito simples. As letras não têm serifa, as cores são básicas, o contraste é alto etc.

No fim das contas, você acha que as teles vão permitir o SMS eleitoral este ano?

Acho que vão liberar, mas com regras que serão difíceis para o político aderir.

Ou seja, os partidos vão acabar preferindo o SMS com brokers não homologados…

É um tema sensível. Do jeito que está se desenrolando, acho que 95% do tráfego acontecerá através de canais não-oficiais. E aí não serão as operadoras e nem os integradores homologados que vão ver esse dinheiro.

Qual a sua estimativa de volume de SMS político na campanha eleitoral deste ano?

Acho que teremos um recorde nessas eleições, pois o número de empresas não-oficiais é muito grande e o preço caiu muito. O serviço está mais acessível para os políticos. Acredito que o volume deve passar de 500 milhões durante os meses de campanha. O grosso virá de campanhas de deputados e senadores, não de presidente e governadores.

Já começam a surgir algumas utilizações corporativas de serviços de mensagens instantâneas. Alguns veículos de mídia, como a rádio CBN e o jornal Extra, estão usando WhatsApp para receberem sugestões de pauta do seu público. Como a Zenvia está se preparando para essa competição no mundo dos smartphones?

Os players de serviços OTT (over the top), como WhatsApp, Facebook, Kakao, nunca permitiram que aplicações de terceiros enviassem mensagens para seus usuários. Nenhum deles tem API para essa funcionalidade. Isso vem desde os tempos de ICQ, MSN, Skype, e agora segue com essa série nova de apps móveis. Fazem isso porque, se permitissem, perderiam valor de negócio, que é a rede ser fechada. Se um dia algum deles abrir, se tornará para a gente mais um canal de entrega de mensagens. ICQ começou em 1994, Skype em 2001, e Whatsapp em 2010, e nenhum deles fez isso até agora. Sinto que é porque se trata de um negócio muito vinculado à privacidade do usuário. Se abrirem para publicidade, correm o risco de perder base para um concorrente que permanecer fechado. Não creio que o modelo de negócios deles seguirá por esse caminho.

Vale lembrar que temos a Zynk, uma plataforma própria para distribuição de conteúdo em smarpthones e tablets. Ela é usada por empresas que têm público definido com smartphones. Zynk é um aplicativo móvel que pode ser personalizado com o logo da empresa. O usuário que instalar recebe push notification com conteúdo da companhia, que pode ser mensagem de texto, apresentação Powerpoint, PDF etc. Funciona em Android, iOS e web mobile. A Zynk veio da aquisição de uma empresa. Está rodando em fase beta com alguns clientes. Ainda não está divulgado no nosso site porque estamos testando o modelo de negócios. Estamos rodando com meia dúzia de clientes e devemos botar no ar até o final do ano. A principal barreira que enfrentamos é que nem toda empresa compra smartphones para seus colaboradores.

Outra aquisição recente da Zenvia foi a PureBros. Como está essa empresa?

Compramos a PureBors no início de 2013. É a principal integradora de billing nas teles. Serve de billing para  portais de esportes, de conteúdo adulto, entretenimento em geral. O carrier billing tem diferenças importantes em relação à Google play e à App Store: a operadora pega uma fatia maior, mas oferece um alcance maior. E carrier billing é muito simples. Quando compramos a PureBros, demos continuidade aos serviços e adotamos nossa estratégia de expansão do negócio. Como temos proximidade com as teles e entendemos de serviços de valor adicionado (SVA), começamos a fazer conteúdo white label com integração de billing com as teles. Não fazemos a produção do conteúdo em si, o que fica com parceiros. Mas montamos junto com a operadora o produto, oferecido desde SMS até aplicativo. Lançamos serviços com a TIM nas verticais de educação, bem-estar e saúde, todos no primeiro trimestre. E com a Claro lançamos o serviço da Ana Maria Braga. Vamos firmar parcerias semelhantes com outras teles este ano. A ideia é trabalhar com todas. 

Qual a projeção de receita da Zenvia para 2014?

Faturamos pouco mais de R$ 100 milhões ano passado e devemos crescer 40% este ano. A área de mobile messaging (SMS corporativo, SMS marketing e Zynk) deve responder por 60% da receita este ano e a parte de conteúdo, por 40%.

Soube que você é um entusiasta de big data. Como esse conceito pode ser explorado com SMS?

Todo player de tecnologia que trafega milhões de transações e não coloca big data no centro de sua atenção está faltando com alguma coisa. Big data pode ser usado para gerar conhecimento para melhorar os processos internos. E também para enriquecer a comunicação com o consumidor. Nosso primeiro foco é na eficiência dos nossos processos. Depois, para 2015, queremos usar big data para melhorar a interação com os usuários, personalização de campanhas etc. Muitas vezes temos informações que podem ajudar a segmentar melhor a base de um cliente. Mas nunca vamos vender base.

Pode explicar melhor o uso que fazem de big data para aumentar a eficiência da Zenvia?

No acompanhamento de billing, por exemplo, entendemos qual a melhor maneira de se fazer uma oferta de SVA. Analisando qual o perfil de billing do consumidor ajudamos o parceiro a definir a precificação de serviços. Usamos também nas interações de conteúdo para saber quando é melhor entregar um conteúdo de SMS. Sabemos quando gera maior índice de resposta, ou menor rejeição. Aprendemos qual o melhor formato de texto e o melhor horário do dia. Enfim, usamos big data para a inteligência dos negócios.

Para terminar, três perguntas sobre estratégia. Primeira: há outras aquisições em vista?

Sim. A Zenvia, a partir do segundo semestre, deve começar mais algumas operações. E os próximos dois anos serão bem interessantes nesse aspecto…

Há planos de expansão internacional?

Não neste ano. Mas nos próximos dois anos, sim.

Já pensaram em abrir capital?

Se o mercado estiver propício a isso… Se conseguirmos em cinco anos atingir o porte necessário, esse é um caminho que faz parte do interesse dos sócios.

Qual é o porte necessário?

Um Ebitda entre R$ 60 e R$ 100 milhões, no caso de empresas de tecnologia. É uma faixa factível. O investidor institucional no Brasil é desejoso de empresas de cunho inovador na Bolsa. E acho que o mercado pessoa física também.