Para Bruno Vieira, diretor do Deezer no Brasil, podcast ainda é nicho e precisa de mais criadores de conteúdo criativos

Está no carro, no celular, no fone de ouvido, no videogame, na TV. O podcast já é uma realidade para o consumidor brasileiro. Contudo, Bruno Vieira, diretor da Deezer no Brasil, um dos serviços de streaming que vem dando espaço aos podcasts, acredita que ainda há muito trabalho a ser feito. Ele frisou que “o segmento ainda é um nicho”, com poucos ouvintes. Já do lado dos produtores de conteúdo é um “movimento caro”, pois demanda gastos com equipamentos, softwares, edição e serviços de armazenamento, e traz poucos resultados. Para Vieira, o podcast terá desenvolvimento no Brasil quando tiver mais produtores criativos e mais investimento de publicidade.

“Com conteúdo de qualidade vem a audiência. E, na sequência, os anunciantes. Além da participação da Deezer no mercado como produtor de conteúdo de qualidade, falta ainda no mercado brasileiro de podcast a participação dos grandes publishers. Algumas rádios replicam hoje em podcast alguns dos seus programas, mas falta o desenvolvimento de conteúdo original para podcast por parte dos grandes publishers”, explica Vieira.

“Também falta o desenvolvimento de talentos dentro desse mercado. Hoje temos grandes histórias de sucesso com youtubers e instagrammers, mas carecemos de formação de talento entre podcasters”, completa o executivo do serviço de áudio.

Agregador

Vieira ressalta que o podcast é um segmento em franco crescimento e que tem ajudado no desenvolvimento do Deezer. Em um ano, por exemplo, o consumo desse tipo de conteúdo cresceu 40% e o tempo de uso aumentou 130% entre usuários do serviço no Brasil. Atualmente, os gêneros que mais se destacam dentro da plataforma são de os notícias & política, sociedade & cultura, educação, business e humor/comédia. Os dez podcasts mais ouvidos na plataforma em janeiro deste ano foram:

  1. Mução
  2. Céu da Semana com Titi Vidal (Original Deezer)
  3. Inglês Todos os Dias
  4. NerdCast
  5. Quem Diria
  6. Pretinho Básico
  7. Um Milkshake Chamado Wanda
  8. Reprograme Seu Cérebro Cast
  9. Estadão Notícias
  10. Espresso English Podcast

15 anos de Podcasts

Para Leo Lopes, fundador do Radiofobia, movimentos de players, como Spotify, mostram que o podcast está na palma da mão do usuário

Em 2019, o podcast completa 15 anos. O termo foi cunhado pelo jornal britânico The Guardian, em matéria publicada em 11 de fevereiro de 2004. Com o passar do tempo, o podcast vem se tornando o canal para dar voz a diversos produtores de conteúdo sem espaço no rádio ou TV, como comediantes, fãs de filmes e séries, livros, filosofia, esportes, empreendedorismo, música. Imagine uma categoria de conteúdo e, sim, há um canal de podcast para isso.

Agora, o segmento caminha para um movimento de profissionalização, expansão de conteúdo premium e audiência. Nele, os conteudistas acharam um carro-chefe para alcançar seu público: os serviços de streaming e agregação de conteúdo. Desses, o mais proeminente é o Spotify. O serviço de streaming sueco está investindo pesado nos podcasts para alcançar mais usuários, assinantes e publicidade. Tanto que a companhia selecionou 500 milhões de euros para gastar com a compra de plataformas de podcast neste ano. Com o montante, a empresa já adquiriu Gimlet, Anchor e Parcast.

“A curva de consumo do podcast sempre exigiu um certo estimo tecnológico pelo ouvinte. Procurar canal, baixar agregador. O que o Spotify está fazendo surpreendeu o mercado. Não apenas com as compras. A companhia investiu em marketing para podcasts. Envelopou o metrô e pontos de ônibus de São Paulo, por exemplo. Esse fato mostra que os podcasts também estão na palma da mão do usuário”, diz Leo Lopes, fundador do Radiofobia, empresa especializada em edição, produção e criação de conteúdos em podcasts.

“Por outro lado, o Spotify abriu espaço para que qualquer um criasse e publicasse seu podcast, como o iTunes já fazia. Criaram um termo de responsabilidade e qualquer um pode se cadastrar. Isso aumentou o catálogo de podcasts deles. Antes era era bem restritivo. Funcionava apenas através de serviços de hospedagem.”, completa.

Pesquisa

O desenvolvimento desse segmento já pôde ser visto no Brasil. De acordo com a pesquisa da Associação Brasileira de Podcasts (Abpod) com a rádio CBN feita recentemente, 92% dos ouvintes no País escutam os áudios por celulares, enquanto 25,5% escutam em computador e 16,5%, no som do carro – era permitido marcar mais de uma opção.

Com mais de 22 mil respostas pela web, o estudo mostra que os apps e agregadores mais usados são: Podcasts Addict (24%), iTunes (20%), sites e aplicativos do próprio canal de podcast (27%), Google Podcasts (14%), Pocket Casts, Castbox e Spotify (11% cada).

Entre os canais de podcast mais citados pelos usuários na pesquisa está o Nerdcast (57%), editado por Lopes. Ainda se destacam os canais Não Ouvo (21%), Mamilos do B9, Anticast e Gugacast (13% cada), Xadrez Verbal (11%) e Braincast (10%).

Note-se ainda que o custo médio para publicação de um episódio é baixo, menos de R$ 150 – embora quase metade (48%) dos conteudistas não gastem nada para publicar um episódio de seu canal. Além disso, a maioria (32%) dos produtores de conteúdo publica um episódio por semana, e a maior parcela deles (40%) ainda têm baixa quantidade de downloads – entre 1 e 99 downloads por episódio.

Conteudista

Americo Mattar, presidente da Fundação Telefônica, acredita que o desenvolvimento dos podcasts ocorra com o advento do mobile-first

Uma das empresas que recentemente apostou em desenvolver seu próprio podcast foi a Vivo. A companhia, por meio da Fundação Telefônica Vivo, criou um canal para levar empreendedorismo a jovens de comunidades carentes, o podcast Pense Grande, com três episódios publicados em seu site. “É um mercado que vem ganhando força com o crescimento do acesso a smartphones e dados móveis”, diz Americo Mattar, presidente da Fundação Telefônica.

O motivo para investir no segmento como forma de propagar o trabalho da Fundação foi definido a partir da análise de uma série de pesquisas (desk research). Nos estudos foi visto que o consumidor está caminhando para o mobile-first, já que, em sua maioria, os ouvintes acompanham os episódios sozinhos (85%), usam banda larga para baixar os podcasts (97%) e ouvem cerca de cinco podcasts por semana e oito horas semanais.

“A popularização do smartphone acelerou o crescimento do mercado de podcasts, uma vez que a escolha desta linguagem se deve, especialmente, à conveniência e à liberdade de consumo. É possível ouvi-los facilmente pelos dispositivos móveis, em movimento, online ou offline, sem a necessidade da atenção visual”, explica o executivo da operadora.

“E, diferente de uma programação de rádio, por exemplo, o podcast oferece um conteúdo personalizado, uma vez que o ouvinte geralmente já tem um interesse prévio sobre o assunto. Além disso, são uma fonte de informação de fácil assimilação e com gasto útil de tempo, como em situações de deslocamento, principalmente para quem percorre grandes distâncias da casa para o trabalho, por exemplo”, completa.

Publicidade

Fundador e CEO da Redmas, Rodrigo Tigre, confirmou que os investimentos de publicidade em podcast ainda são incipientes. Atuando com publicidade via áudio digital, o que envolve também um trabalho com streamings musicais e rádios online, Tigre explica que o problema está em demonstrar que o áudio digital é uma mídia relevante para atrair consumidores para empresas e marcas. De acordo com os dados da e-Marketer, apenas nos Estados Unidos, 32% dos publicitários já investiram em podcasts e 36% desejam fazê-lo em breve.

“É ainda um pouco a percepção do ‘iPhone na agência’ [jargão publicitário sobre não entender o áudio como meio de relacionamento com o consumidor]. É importante frisar que o áudio digital é informação”, diz Tigre. “Trabalhamos com as agências para trazê-las para esse segmento. Elas ainda veem como algo caro para fazer uma campanha no Brasil, pois têm a visão do modelo tradicional. Daí vem o desafio de explicar nossos benefícios às marcas”.

Tigre compartilhou com esta publicação uma outra pesquisa, de outubro de 2018, que mostra o potencial do podcast e do áudio digital. Feita com 994 usuários na Internet, o estudo da Audio.Ad com a Qriously mostra que 80% dos consumidores ouvem áudio digital por smartphones, 44% do consumo de áudio está no segmento adulto-jovem (18 a 34 anos) e 25% escutam podcast.

Próximos passos

Com um cenário com poucos investimentos em publicidade, “nichado”, mas com um público em potencial no Brasil, os especialistas ouvidos por Mobile Time acreditam em um cenário positivo para o podcast no País. Vieira, do Deezer, afirma que seu serviço apostará em incluir conteúdo diverso, exclusivo e de qualidade, como Céu da Semana, Essenciais e Stereo Falante, além de novos podcasts exclusivos. O Stereo Falante, canal que aborda temas relevantes para a sociedade, por exemplo, acaba de lançar sua segunda temporada.

Por sua vez, Leo Lopes, do Radiofobia, acredita no potencial da criação de podcasts para o segmento corporativo: “2019 começou como um ano extremamente positivo. Estou há sete anos com minha empresa, a gente nunca teve tantas expectativas e trabalhos. Darei treinamento na Fiat (FCA). Já fiz no Bradesco. A ideia é utilizar o podcast como ferramenta, não como conteúdo. Criar onde, quando, como, na hora que quiser. É uma ferramenta com uma curva de aprendizado muito suave, investimento muito baixo em equipamento e pessoal. Pode usar para treinamento, comunicação interna, recrutamento”.

Já Mattar, da Fundação Telefônica Vivo, informa que a instituição planeja lançar seis novos episódios do Pense Grande. A ideia é trazer temas mais específicos, de acordo com a demanda dos jovens. Para defini-los, os próprios jovens serão consultados.