A SumUp vem crescendo rapidamente no Brasil. Acabou de mudar de escritório, ocupando três andares de um prédio em São Paulo, para onde levou seus 350 funcionários. Mais da metade deles (cerca de 200) trabalham com atendimento. A empresa paga o dobro da média do mercado e dá liberdade para que eles tomem decisões de negócios e para que exponham abertamente aos superiores os problemas mais frequentemente encontrados na linha de frente. Essa turma agora ganhará o apoio de um robô de conversação, que vai procurar fazer o atendimento de primeiro nível, usando inteligência artificial para compreender o contexto do contato do cliente. O projeto está em andamento e a expectativa é de lançamento no primeiro trimestre de 2018, revela o CEO da SumUp no Brasil, Igor Marchesini, em entrevista para Mobile Time. O executivo falou também sobre comércio conversacional, evolução das máquinas de POS, competição com apps de pagamento e a recém-divulgada entrada em operação no Chile.

Mobile Time – A SumUp acabou de firmar parceria com o banco estatal chileno BancoEstado para lançar um serviço de mPOS naquele país. Como aconteceu essa parceria?

Igor Marchesini – O BancoEstado criou um cartão que é o mesmo número do CPF local. Foram emitidos mais de 10 milhões desses cartões em um país com população de 17 milhões. Mas as pessoas recebem dinheiro nesse cartão e não têm onde gastar porque há poucas máquinas de POS. Então sacam o dinheiro nos caixas automáticos. Isso acontece porque o Chile era um monopólio em adquirência, controlado pela Transbank, uma organização privada sem fins lucrativos. Ela só serve as lojas grandes, o filé mignon. Daí o BancoEstado contratou uma consultoria que o convenceu a se juntar com alguma empresa de tecnologia com DNA nessa área. Fizeram uma RFP global com mais de 70 empresas no mundo inteiro. E nós fomos escolhidos. As conversas começaram no fim de 2015 e assinamos a joint-venture em março de 2016.

Mobile Time – Quais os diferenciais da oferta de mPOS de vocês no Chile?

Para comprar uma máquina de POS tradicional (da Transbank) é preciso alvará, certidão negativa de débito e até liberação dos bombeiros. São sete documentos ao todo! O processo é desenhado para prevenir fraudes, não para aumentar as vendas. E a Transbank cobra aluguel da máquina, a gente não. Além disso, nossa taxa é mais baixa que a menor taxa cobrada pela Transbank.  Abrimos a operação beta há quatro semanas e já temos clientes na Ilha da Páscoa e no deserto do Atacama. 

Depois do Chile, pretendem levar a operação para outros países da América Latina?

A América Latina está 10 anos atrás do Brasil (em redes de adquirência). A maioria dos países têm dois adquirentes: um exclusivo de Mastercard e outro de Visa. Há mercados muito atrativos, onde tem penetração grande de cartões, mas a esmagadora maioria saca o dinheiro no caixa automático. Agora, o que vemos é um movimento das bandeiras junto com os bancos emissores pressionando pela quebra de monopólio em alguns mercados. Estamos olhando alguns deles, mas não temos nada fechado ainda. A Argentina está se abrindo, por exemplo.

O que acha da concorrência com produtos de carteiras digitais, que permitem transações entre usuários sem o uso de uma máquina de POS, como Picpay?

Realmente, me preocupo mais com esses novos serviços do que com os adquirentes tradicionais. Na China, sei que há lojas até no interior do país que não aceitam mais cartões, só QR code do WeChat.  Porém, acho pouco provável que no Brasil teremos um player que vai virar monopolista como o WeChat é na China. Acho que no Brasil vão coexistir vários meios de pagamento. E, independentemente disso, vai sempre existir a credenciadora, responsável por checar se você é você mesmo, se não está realizando alguma transação ilegal etc. Essa função vai continuar existindo. Aliás, se virar tudo digital seria uma mão na roda para mim, porque o leitor é uma dor de cabeça: temos que distribuir, fazer trocas etc.

Nunca pensaram em criar um serviço de conta virtual?

Bom, teríamos que entrar para ganhar, precisaríamos de alguma diferenciação. E nosso core business já tem tanta oportunidade: novos países, novas features, novos produtos. Mas vale lembrar que fora do Brasil temos três serviços de software. O primeiro é o SMS payment: o vendedor envia para o comprador um SMS com um link para confirmar o número do cartão. Usamos bastante na Europa, mas nunca tive coragem de trazer para o Brasil porque não tem senha, o que geraria exposição grande para a fraude. O segundo é uma versão in-app: digita-se o número do cartão ou tira-se foto dele com OCR criptografado. Temos um piloto disso na Austrália. E o terceiro é a venda por telefone, em que o comprador informa seu cartão de crédito. É importante frisar que 80% da nossa inovação está no processo de adquirência: como a gente cadastra, como avalia, como previne fraudes, como liquida, como atendemos o cliente de forma digital dentro do app etc.

Há uma tendência tecnológica no mercado de adquirência que consiste na transformação da máquina de POS em praticamente um smartphone, com tela touch screen, sistema operacional Android e a possibilidade de instalação de aplicativos que auxiliem o lojista. A SumUp vai seguir esse caminho?

Acho que não vamos trilhar esse caminho de máquina com Android. A nossa estratégia é de se juntar diretamente com as pessoas que fazem os apps para criar uma solução sensacional para o seu cliente. Temos uma arquitetura orientada a microsserviços e um SDK com dezenas de APIs. Qualquer desenvolvedor de software de gestão pode integrar nosso pagamento dentro do seu app para acessar a nossa máquina de mPOS. Queremos nos aproximar da comunidade desenvolvedora diretamente para que esteja integrada com a nossa solução.

Algum app brasileiro já tem o serviço de pagamento da SumUp integrado?

A primeira integração é com o MEI Fácil, um app para microempreendedores. Só entramos em uma parceria quando entendemos que os dois produtos vão ficar melhor conversando um com o outro. Temos alinhamento de propósito grande com MEI Fácil.

O que acha da tendência de comércio conversacional?

As pessoas saíram da tela grande e foram para a tela pequena e agora gastam menos tempo prestando atenção em algo. Se uma compra não for concluída em menos de dois minutos, o consumidor desiste dela. Transformar a compra móvel em algo agradável é o grande desafio da indústria. Incrível ninguém ter feito nada que preste até agora.

Entendo que a venda tem que ser mesmo uma conversa. A grande frustração do usuário é que nossas interações foram reduzidas a uma transação ou múltiplas transações. Odeio empresa que manda um email dizendo que meu produto está vindo, mas diz que não posso responder. Transformar essas várias transações em uma conversa é fundamental. Nem é tão importante se é um bot ou não. Importante é quando eu falar da próxima vez com a empresa haver um histórico de tudo o que já conversamos. Por isso estamos investindo muito dinheiro em criar essa experiência conversacional. Se o cliente me mandar um SMS, ou entrar no nosso site, ou qualquer outro canal, preciso ter o histórico, para entender o contexto. Essa migração de transações para conversas tem que acontecer. Um bot pode ajudar desde que a gente garanta que ele de fato está treinado para olhar o passado inteiro. Minha expectativa interagindo com um bot de varejo, por exemplo, é que se eu escrever que meu pedido ainda não chegou ele saber exatamente do que estou falando. Isso também vale para o relacionamento com o cliente. É este o caminho que precisamos seguir.

A SumUp então vai ter um bot? Ele vai funcionar dentro do app? Quando será lançado?

Vai ser um atendimento híbrido, combinando máquina e humano. Vai ser omnichannel: app, site, dashboard, talvez telefone também (por voz). Mas não vou deixar o cliente "brigando" com a máquina por mais que 15 segundos. O bot vai tentar fazer o primeiro atendimento. Já sei quais as dúvidas mais comuns de acordo com o estágio que o cliente está, então posso presumir qual é a dúvida dele. Já temos um parceiro para o projeto, mas não fechamos ainda quem vai cuidar da inteligência artificial. Estamos em piloto com três. A ideia é lançar no segundo trimestre de 2018.

Mas quero reforçar que estamos contratando pessoas a todo vapor e em todas as áreas. Desde agentes de relacionamento, até analistas e desenvolvedores, especialmente. Temos mais de 350 pessoas. Se tudo der certo vamos quase duplicar de novo em 2018. Nossa política de pessoal é o que mais me orgulha na SumUp. Uma vez por semana a gente para a operação inteira, por meia hora, e os executivos contam para a galera tudo o que está acontecendo, desde release de tecnologia até mudança no plano de saúde etc. E a outra meia hora é dedicada para o pessoal que está na linha de frente nos contar o que está rolando no telefone. Recebemos feedback direto de quem está na ponta. Nossos agentes não têm script nem regras de negócios. Eles têm essa liberdade de decisão. Tudo o que fazem está registrado e a gente verifica. 99% das vezes, com essa confiança, as pessoas fazem a coisa certa. A gente paga o dobro do mercado. Analisamos 70 currículos a cada contratação. Nosso atendimento é praticamente todo interno. Só pré-venda que tem um pedaço terceirizado. Nossos atendentes gostam de resolver problemas. Todo mundo que começa a trabalhar aqui, em qualquer cargo, passa três semanas atendendo o telefone. Nossos atendentes são gerentes de relacionamento. Quando a ligação cai neles, quero que saibam o que está acontecendo. Há quase 200 pessoas trabalhando em atendimento aqui.