[Matéria atualizada em 16/04/21, às 21h40] O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) julgou nesta semana recurso do Google em ação movida pelo Intervozes em abril de 2019, por violação às garantias de liberdade de expressão estabelecidas pela Constituição Federal e pelo Marco Civil da Internet. A decisão determina que vídeos postados pelo Intervozes, removidos sem aviso prévio da plataforma do YouTube com base no mecanismo Content ID, sob a alegação de que estariam sido violados direitos autorais da TV Globo e Bandeirantes, fossem republicados. A empresa também foi condenada a pagar uma indenização de R$ 50 mil.

Entenda a história

A partir de um convênio com a secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, em 2015, o Intervozes desenvolveu um material para capacitar agentes públicos sobre temas relacionados a direitos humanos. Entre os documentos criados, uma cartilha e vídeos, que foram colocados no YouTube.

Nos vídeos, o Intervozes inseriu pequenos trechos de TV extraídos de TV Globo e Bandeirantes para mostrar maus exemplos sobre os direitos das crianças, da mulher, entre outros, que eram infringidos.

Como o YouTube tem um mecanismo de detecção de violação de direitos autorais, a ferramenta Content ID identificou os vídeos do Intervozes como material que afetaria os direitos autorais das emissoras.

Com base no mecanismo do Content ID, os titulares de direito autoral depositam seus conteúdos numa base de dados específica da plataforma. E quando um usuário do YouTube posta um vídeo que se identifique com esse conteúdo na base de dados, a ferramenta notifica o titular e cabe a ele decidir se mantém aquele material postado ou retira da plataforma. No caso, TV Globo e Band mandaram retirar o vídeo do Intervozes.

“Eram vídeos com pequenos trechos, totalmente de acordo com a lei”, explicou ao Mobile Time a advogada do coletivo, Flávia Lefèvre. “As emissoras ficaram incomodadas com o caráter de crítica que tinham os vídeos do Intervozes. Não foi por desrespeito do direito autoral, mas por censura, e o mecanismo do YouTube estimula isso”, afirma Guimarães. De acordo com o próprio texto do acórdão, “os mesmos conteúdos foram postados por outros usuários na íntegra, enquanto o que se discute é a remoção vídeos que se utilizaram de pequenos trechos, conforme autoriza expressamente a Lei de Direitos Autorais e a jurisprudência”.

Na primeira instância, a juíza entendeu que a ação deveria ser contra TV Globo e Band e não contra a ferramenta de vídeos do Google. “Apelamos e ganhamos no tribunal, que reconheceu que o Content ID representa censura e a discussão de violação de direito autoral cabe ao judiciário e não unilateralmente ao YouTube e os criadores de conteúdo porque afeta o direito à liberdade de expressão”, afirmou Lefèvre. O Google representou embargos de declaração para o mesmo tribunal, que o julgou afirmando que não há nada para ser corrigido da decisão.

De acordo com a decisão, apenas o Poder Judiciário poderia determinar a ilegalidade ou não do conteúdo com relação à violação de direitos autorais, e não uma plataforma comercial.

“As regras de uma plataforma estrangeira não podem contrariar a legislação brasileira. E é o que acontece com o contente ID, que contraria a liberdade de expressão e o Marco Civil da Internet”, justifica a advogada do Intervozes. Para Lefèvre, a vitória é um precedente importante para direcionar o debate que acontece na sociedade brasileira.

O Google tem o direito de recorrer ainda STJ e no STF.

O YouTube foi procurado, mas não respondeu a tempo até a publicação desta reportagem.