Quando o WhatsApp foi adquirido por Mark Zuckerberg (ou melhor, Facebook), em 2014, o app contava com 35 engenheiros em sua equipe e algo como 450 milhões de usuários ativos. E, um ano depois, o time cresceu para 50 engenheiros, mas o número de usuários dobrou, chegando a 700 milhões em 2015.
Mas como um time pequeno era capaz de gerenciar um aplicativo com esse tanto de gente usando?
Certa vez, um engenheiro de software, Jamshid Mahdavi, explicou em um evento que um dos truques para o WhatsApp ter tantos usuários e poucos engenheiros de software trabalhando por trás era o uso do programa de linguagem chamado Erlang, cuja particularidade foi ter sido programado para lidar com comunicações de um grande número de usuários e desenhado para que programadores pudessem adicionar novos códigos de maneira dinâmica.
Sistema AXE
O Erlang foi desenvolvido pela Ellemtel AB, a joint venture entre a Ericsson e a Telecom sueca Televerket. Ele fazia parte do Sistema AXE, uma central telefônica digital criada em 1974 para projetar um “comutador eletrônico que atendesse aos objetivos, em certa medida diferentes, dos dois proprietários”.
Para a Televerket, a empresa estatal sueca de telecomunicações, a ideia era obter um comutador (equipamento utilizado para interligar e direcionar comunicações entre diferentes partes de uma rede) projetado e adaptado às características da rede telefônica sueca.
Já a Ericsson estava de olho em sua expansão internacional e, com o sistema AXE queria um comutador que fosse adequado para o maior número possível de sistemas telefônicos internacionais.
Em conversa com Paulo Bernardocki, diretor de soluções e tecnologia da Ericsson no Brasil, para poder escrever este Museu Móvel, o executivo apontou algumas características da central telefônica digital.
Características e evolução:
- Modularidade e flexibilidade: A AXE foi projetada com uma arquitetura modular, permitindo que fosse adaptada a diferentes necessidades e infraestruturas de telecomunicações, incluindo as mais antigas.
- Tecnologia avançada: A AXE introduziu tecnologias avançadas para a época, como comutação digital e arquitetura de software modular, que a tornou uma das centrais telefónicas mais avançadas do mercado.
- Suporte a diferentes protocolos e evolução contínua: A AXE suporta uma vasta gama de protocolos de telecomunicações, incluindo redes móveis o que a tornou uma plataforma versátil para a construção de redes de telecomunicações. A AXE passou por diversas evoluções ao longo dos anos, com a adição de novas funcionalidades e capacidades, como a comutação de dados e suporte a redes de alta velocidade.

Estação telefônica nos anos 1970. Foto: divulgação/Ericsson
De volta ao Erlang
Enfim, tudo isso para falar também do Erlang, aquele que o WhatsApp usou para ser o… WhatsApp.
O programa de linguagem suporta simultaneamente distribuição de tarefas e é tolerante a falhas. Mas, apesar de ter sido desenvolvido nos anos 1970, ele ainda é usado para a criação de sistemas em tempo real. “É amplamente usada em sistemas que exigem alta disponibilidade e requisitos de tempo real, como telecomunicações, bancos e sistemas de mensagens instantâneas. Por exemplo, sistemas de mensagens instantâneas, como o WhatsApp, utilizam a Erlang para lidar com grande volume de mensagens e alta disponibilidade. Erlang também é usado em outras áreas, como sistemas de jogos, sistemas de produção industrial e sistemas de controle de tráfego”, explicou Bernardocki.
No fim, os poucos engenheiros de software que trabalharam lá no início do WhatsApp devem agradecer ao programa de linguagem Erlang
No Brasil, o sistema AXE chegou a partir de uma parceria entre Ericsson e Telesp, sendo ele a primeira CPA (Central de Processamento Automático) a ser implantada no país, em 1982, ou seja, oito anos depois de sua criação.
O sistema AXE revolucionou a telefonia ao introduzir a tecnologia digital e modular, permitindo a adição de novas funcionalidades no futuro e, apesar de 51 anos de história tecnológica – que costuma desdenhar daquilo que já tem uma certa idade – ainda presta serviços importantes para a telecomunicação.