O sonho humano de interagir com personas virtuais, dóceis e servis, está representado de forma abundante nas obras artísticas. A nova edição de Blade Runner presenteia o protagonista “K” com uma bela companheira holográfica, “Joi”, e eles dão seu jeito de chegar às vias de fato.

A façanha não foi repetida pelo personagem de Joaquim Phoenix em “Her” com o sistema operacional “Samantha”, em que a relação platônica mais se assemelha com uma paixonite por uma “Siri” turbinada.

Falando nela, até mesmo o teatro se apropriou do tema, e a assistente virtual da Apple dá título a uma peça em que “divide o palco” com a atriz canadense Laurence Dauphinais (em cartaz no Rio de Janeiro em Dezembro de 2017).

Algumas instituições culturais entenderam o recado e construíram assistentes virtuais para interagir com o público. No Museu do Amanhã, as interações do público com as inúmeras telas interativas são mediadas por uma entidade abstrata, de nome “Iris” e representada por círculos.

Um pouco mais longe, em Cartagena, Colômbia, o Museu da Inquisição oferece audioguia que é conduzido por um personagem ficcional da época retratada, em tom dramático e muito bem produzido.

A novidade do momento são os chatbots. Interações que acontecem no Facebook Messenger, Whatsapp ou similares. Fácil porque dispensa a instalação de um novo aplicativo, o que estatisticamente é um estorvo para a maior parte das pessoas segundo pesquisas do instituto brasileiro Opinion Box em conjunto com o boletim Mobile Time. Natural porque acontece em uma plataforma amplamente utilizada por todos e dispensa manual de instrução. Imersivo ao usuário, pois permite uma navegação em “árvore” em que é possível aprofundar-se em determinado tema até o ponto em que se desejar. Valiosíssimo porque pode fornecer uma quantidade enorme de informações do usuário – ?dispensável lembrar que entregamos de bandeja os dados de nossa vida inteira no Facebook. E, por fim, um mecanismo de retenção do visitante porque, ao abrir uma conversa com um chatbot, aquela relação pode – ?e deve – ?se estender para os momentos pós-visita.

Há, hoje, inúmeras plataformas de construção de chatbots sem necessidade de desenvolvimento e bem acessível para leigos, com destaque para o Chatfuel.

É de se surpreender que haja poucos cases aqui no Brasil na área cultural. O destaque fica por conta do chatbot do Canal Futura, que organiza o seu conteúdo por perfis e áreas de interesse, provendo informações do próprio canal ou externas. Fora do país temos casos interessantes porém claramente prematuros, como o chatbot do Museu de Anne Frank, em Amsterdam, que se contenta em oferecer serviços como a informação do preço dos ingressos.

Antes mesmo das plataformas de chatbot o Museu do Brooklin desenvolveu um aplicativo chamado “Ask”, com geofence (ou seja, só funciona na área do museu), que simula um aplicativo de mensageria e é integrado com beacons (ou seja, o app sabe com precisão onde você está no museu no momento em que você manda a pergunta). Nesse caso, no entanto, as perguntas são respondidas manualmente por atendentes, que, inclusive, ficam visíveis no espaço do museu.

Na mobCONTENT desenvolvemos em 2017 o “Du Champs”, um chatbot com personalidade elaborada dramaturgicamente e conteúdo construído com estratégias narrativas. Ele vai possuir conteúdo e interface com diferentes museus do Rio de Janeiro (em um primeiro momento), e será um ponto de contato permanente entre usuário e informações culturais em geral. Logo no início do papo o usuário é convidado a dizer onde está fisicamente e, se o local bater com o de um museu coberto pelo app, o conteúdo é disponibilizado. Se estiver de casa, pode planejar visitas em centros culturais. Em determinadas interações, valores são atribuídos ao usuário, como por exemplo o gosto por arte moderna caso ele escolha uma opção relacionada ao tema. Informações de contato também ficam disponíveis ao chatbot. Após a interação inicial, novas mensagens são enviadas regularmente ou em ocasiões especiais, como grandes eventos, feriados ou em mensagens patrocinadas. E tudo acontece através de um papo, sem a cara de propaganda e de robôs impessoais.

Como já escrevi em textos anteriores, um dos entusiastas da plataforma de chatbot, o Facebook, também está investindo pesado em sistemas de realidade virtual social. Não é difícil imaginar o cruzamento de tecnologias de chatbot, inteligência artificial e interfaces virtuais de conversa para poder afirmar que muito em breve você terá uma “Joi” ou “Samantha” para chamar de sua. E a desculpa de falta de companhia para visitar (presencialmente ou virtualmente) assuntos culturais vai acabar de vez.