O setor espacial tem passado por transformações significativas nos últimos anos. O desenvolvimento de foguetes reutilizáveis e o avanço de constelações de satélites não geoestacionários, por exemplo, aumentaram as atividades espaciais, levando à preocupação acerca da sustentabilidade no uso do espaço.

Nesse sentido, no Brasil, a Anatel tem empenhado esforços para avaliar iniciativas regulatórias com vistas à promoção do uso sustentável dos recursos de espectro e órbita.  Em outubro de 2024, foi publicada a Tomada de Subsídios n° 12/2024 (TS) para colher contribuições sobre o tema. A TS, cujo prazo se encerrou em 23/12/2024, contou com contribuições de players nacionais e estrangeiros, interessados no assunto.

O objetivo da Agência foi discutir o ambiente regulatório com foco em eventuais iniciativas direcionadas aos satélites não geoestacionários, em especial, aqueles de baixa órbita, além de analisar medidas de incentivo para o avanço da sustentabilidade espacial.

Dentre as contribuições encaminhadas à Agência, destacam-se:

  • Relevância do alinhamento com as recomendações e regulamentos internacionais, como o art. 44 da Constituição da União Internacional de Telecomunicações (UIT), que enfatiza que os recursos de espectro e órbita devem ser utilizados de forma racional e eficiente;
  • Apoio pelas operadoras de satélites geoestacionários (GEO) e a ABRASAT para as medidas previstas no Código de Conduta sobre Sustentabilidade Espacial, publicado pela Global Satellite Operators Association (GSOA) em 2023.

Vale dizer que, no documento, a associação consolida algumas práticas recomendadas aos players do setor aeroespacial para, entre outros objetivos, mitigar riscos de colisão e geração de detritos. Para isso, indicam-se medidas como: (i) coordenação entre players do setor durante toda atividade espacial, incluindo lançamento, operação e retirada de órbita para evitar colisões; (ii) cautela ao projetar o satélite, permitindo sua rastreabilidade e minimizando geração de detritos; (iii) compartilhamento de informações seguindo padrões internacionais sobre detritos gerados ou não pela atividade espacial.

  • Compromisso das operadoras de satélites não geoestacionários (NGEO), de modo geral, para o provimento de conectividade no Brasil e com a sustentabilidade espacial.

Ainda no contexto brasileiro, a sustentabilidade espacial foi brevemente endereçada na aprovação da Lei n° 14.946, de 31 de julho de 2024, que dispõe sobre as atividades espaciais, e prevê seção destinada à proteção ambiental, além de estipular que medidas de mitigação dos detritos espaciais devem ser consideradas na realização de atividades espaciais.

Além do marco legal, o Brasil também tem empenhado esforços em outras frentes. Diante da presidência do BRICS em 2025, o Grupo de Trabalho de Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) propôs o tema da sustentabilidade espacial como um dos assuntos prioritários para debate.

Essas iniciativas brasileiras são especialmente relevantes considerando o aumento dos players no setor, sobretudo em razão da conferência de direito de exploração de constelações de satélites não geoestacionários no Brasil. Segundo os Painéis de Dados da Anatel, o setor já conta com nove sistemas não geoestacionários em operação comercial no Brasil, e há expectativa de aumento com a chegada de novos players estrangeiros. Os atos mais recentes para conferência do direito de exploração de satélites não geoestacionários no país foram outorgados à operadora espanhola Sateliot e à operadora australiana Myriota, e publicados no DOU em 31/01/2025 e em 05/02/2025, respectivamente.

Como se trata eminentemente de tema global, a Anatel também tem se posicionado de modo importante no cenário internacional. A título exemplificativo, a Agência participou do Comitê para os Usos Pacíficos do Espaço Exterior (Committee on the Peaceful Uses of Outer Space, em inglês), destacando temas como a mitigação de detritos espaciais e a gestão de mega constelações. Além disso, a Agência participa ativamente na elaboração do Handbook sobre sustentabilidade espacial, previsto na Resolução ITU-R 74.   

E, como não poderia deixar de ser, o tema também se encontra endereçado pela Anatel na iniciativa 24 da Agenda Regulatória para o biênio 2025-2026, que trata da “avaliação da necessidade de inclusão de regras relativas à sustentabilidade no uso de recursos orbitais, conforme orientações de órgãos internacionais e os diversos aspectos envolvidos, tais como o ambiental e o concorrencial”. Note-se que a publicação do Relatório da Análise de Impacto Regulatório e a proposta de resolução com endereçamentos sobre o tema estão previstas para o 2º semestre de 2026.

Diante do posicionamento internacional e abordagens regulatórias da Anatel, é impreterível que as operadoras de satélites nacionais e estrangeiras estejam atentas às tendências regulatórias do setor em direção à valorização da sustentabilidade no uso de recursos espaciais, em especial, os orbitais.

Ainda há um longo caminho de discussão, mas está aberta oficialmente a oportunidade para os diversos players do setor e da sociedade se posicionarem e ajudarem a Agência, – que não perde o olhar para o contexto internacional –, a construir um caminho sustentável para o tema. Por isso, muito possivelmente, este assunto ganhará cada vez mais espaço nas pautas de reguladores e mídia especializados nos próximos meses.

 

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