Até os dias de hoje, as utilities de energia elétrica contabilizam seu inventário de forma manual. Ou seja, vários técnicos percorrem a cidade contando o número de postes, luminárias, lâmpadas, transformadores, entre tantos outros itens que compõem seu arsenal. A contagem é importante para depois, por exemplo, poder cobrar da prefeitura a conta de luz de maneira precisa.
A Fu2re, uma empresa de inteligência artificial e visão computacional, desenvolveu uma série de algoritmos capazes de acelerar a realização do inventário em até 100 vezes e com 100% de acurácia. O resultado foi o mapeamento de 500 mil pontos de luz em um ano para a Light na região metropolitana do Rio de Janeiro. E, agora, o projeto expande para os 31 municípios do estado fluminense onde a distribuidora de energia atua e segue para uma segunda etapa de prova de conceito (PoC) em Portugal, onde vai fazer o censo de 1 mil quilômetros na região de Ourém, próximo de Lisboa.
Como funciona
Quatro câmeras de alta definição rodam as ruas da cidade capturando as imagens dos postes. A IA consegue média de 85% de acurácia por meio de fotografias realizadas pela visão computacional, que tira fotos a cada cinco metros. O que a tecnologia não consegue detectar, uma equipe de técnicos resolve – daí os 100% de acurácia.
As câmeras são GoPro e estão acopladas a GPS para saber exatamente a geolocalização dos itens. Os carros andam a 45 km/hora e os algoritmos identificam os postes de modo que eles não sejam computados mais de uma vez.
“Temos o posicionamento preciso dos ativos”, afirma André Sih, fundador e manager partner da Fu2re. “A visão computacional consegue captar até a potência da lâmpada que está sendo usada”, garante.
Parceria com a Light
O projeto da Light começou ainda em 2022. Nesta primeira etapa, houve a identificação de 131 mil ativos sem foto com causas como: túneis (8.929), áreas sem acesso (14.771) e áreas de risco (108.012). Em seguida, houve a confecção da tecnologia e das caixas onde ficam as câmeras. E, ao longo de 2024, foi feito o censo.
No mapeamento dos 31 municípios de concessão da Light no estado do Rio de Janeiro serão fotografados 352 mil pontos em mais de 22 mil quilômetros rodados.
Aplicativo e detalhes da tecnologia
Em comunidades onde um carro não consegue entrar, a empresa utiliza um aplicativo desenvolvido por ela. Neste caso, o técnico passeia de moto pela região e faz os registros dos postes e o app interpreta as imagens.
Batizada de SmartAssets, a tecnologia se serve de inteligência artificial, machine learning e deep learning. Ela foi treinada para reconhecer automaticamente os ativos de utilities. E, em uma segunda etapa, há o processo de inferência, quando ela, uma vez treinada, identifica as imagens. O treinamento é feito na nuvem, no caso, Azure, e os algoritmos são processados em GPUs da Nvidia – unidades gráficas de processamento capazes de interpretar essas imagens. Já as inferências são realizadas em servidores ou em dispositivos edge – como o aplicativo móvel. “Depois de treinar o modelo na nuvem, ele é baixado no app que faz a detecção no campo, mesmo de forma offline e em tempo real”, explica Sih.
No veículo, o processamento não é feito em tempo real por conta dos custos. Quando o carro volta à base, as imagens são descarregadas e a inferência é feita nos servidores locais.
Em Portugal
Em Portugal, a empresa participou de uma primeira prova de conceito para a cobertura de somente 100 quilômetros. Em outubro, a PoC é maior, 1 mil quilômetros, e, ainda neste ano, será realizada a RFP (Request for Proposal). Caso sejam aprovados, vão mapear o país inteiro, com aproximadamente 200 mil pontos no ano que vem.
Sih conta que, para Portugal, a empresa precisou fazer alguns ajustes no algoritmo, já que os dispositivos são diferentes, como os postes grudados nas casas – algo que não se encontra no Brasil.
Modelo de negócio
A Fu2re optou por manter a cobrança na forma tradicional, ou seja, por ponto mapeado. Seu diferencial não é a redução de custo para as utilities. “Seu modelo se sobressai aos demais tradicionais pela rapidez e confiabilidade no processo”, afirma. “Historicamente as empresas estão acostumadas a cobrar por pontos mapeados. Usamos o mesmo parâmetro para facilitar a vida do mercado e não fazer contas complicadas”, acrescenta.
Tudo indica que a empresa receberá aporte em breve. Em fevereiro deste ano, a Fu2re estava finalizando uma rodada de investimentos série A.