A Abes (Associação Brasileira de Empresas de Software) acredita que existe uma falta de maturidade nos debates regulatórios sobre inteligência artificial e plataformas digitais. Durante a apresentação da agenda regulatória da entidade nesta terça-feira, 6, especialistas defenderam uma regulação de IA mais enxuta e criticaram a cobrança de taxa pelo uso das redes das operadoras às big techs, conhecida como fair share ou network fee.

IA

Para Eduardo Paranhos, líder do grupo de trabalho de IA na Abes, há preocupações com a influência do modelo europeu na vindoura regulação brasileira, algo que pode causar insegurança jurídica, em especial para os pequenos desenvolvedores. Um exemplo que apresentou é a atividade de recrutamento de pessoa que entra como pré-classificação de risco, uma vez que a discriminação em IA pode gerar riscos e vieses. Segundo Paranhos, esse risco já é coberto pela LGPD, uma vez que a proteção ao dado pessoal contra usos errôneos não é permitida.

Também demonstrou receios com os modelos distintos em dois projetos de lei (PL 21/2020, PL 2338/2023) e um substitutivo no Congresso Nacional que possuem estruturas diferentes: “Qualquer erro na regulação da tecnologia da IA pode colocar o Brasil como retardatário por décadas, ouvindo sensibilidade jurídica, técnica e de negócios”, disse.

“Na grande maioria dos casos não precisa de regulação de IA. As situações podem e devem ser endereçadas com as leis atuais: legislação eleitoral; Código de Defesa do Consumidor, Marco Civil, LGPD, código penal. Tem arcabouço para endereçar as novas situações, sem acelerar uma regulação transversal”, completou.

O líder de IA na Abes acredita que foi positiva a extensão da duração da Comissão Especial de IA do Senado para maio de 2024, uma vez que terminaria em dezembro de 2023. Paranhos acredita que é preciso ter mais discussão técnica e econômica sobre IA; assim como olhar outras geografias além da Europa, como EUA, Cingapura, Austrália e Japão, uma vez que a visão desses países é mais aberta e setorial e menos centralizadora, se comparada com a europeia.

“EUA focam no setorial, Europa centraliza em um escritório. Temos que olhar essas geografias para entender o que funciona e o que não. Tem que ser progressiva e não adotar de um país para ser restritiva e irreversível”, concluiu. Na visão da Abes, a regulação deve ser setorial com cada regulador tendo seu posicionamento de forma temática. Ou seja, a Anatel faria sua regulação de IA em telecom; Anvisa, em saúde; ANP, em petróleo e gás, por exemplo.

Plataformas

Por sua vez, para Marcelo Almeida, diretor de relações governamentais e institucionais da Abes, a principal crítica é com a possível cobrança pelo uso das redes das operadoras pelas big techs. Importante dizer aqui, as operadoras chamam isso de ‘fair share’ (cobrança justa, na tradução livre para o português) e a Abes classifica como ‘network fee’ (taxa de uso de rede, em tradução livre para o português).

Almeida afirma que, embora esteja em discussão em uma tomada de subsídios na Anatel, “não há base sólido” para tal cobrança, uma vez que as “razões” propostas são de “natureza econômica” e faltam “razões estruturantes”. Como ponto de defesa, o diretor da associação afirmou que essa taxa fere o conceito de neutralidade da rede que está protegido pelo Marco Civil da Internet Brasileira (Lei 12965/2014).

Outro ponto que o especialista destaca é que as operadoras têm o Fust, que “gera superávit primário e não é utilizado”. Portanto, na análise da Abes, não faz sentido criar uma “taxa com um outro fundo para que esse montante não seja revertido em mecanismos de inclusão digital”. “Me parece que essa discussão precisa estar um pouco mais amadurecida para que a gente possa atribuir esse custo de transação no mercado”, concluiu.

Almeida também afirma que a inclusão dessa taxa, embora seja focada nas big techs, deve afetar os pequenos negócios. Questiona se a inclusão de taxas para big techs ajudará os pequenos negócios a acessarem a rede em pé de igualdade com os grandes serviços, ou se continuará existindo problemas de acessibilidade à rede no País afora.

Crédito: imagem produzida por Mobile Time com IA generativa