O presidente da República, Jair Bolsonaro, publicou nesta segunda-feira, 6, a medida provisória 1.068, que altera o Marco Civil da Internet e impõe limites à moderação das redes sociais sobre conteúdo publicado em suas plataformas. Com a justificativa da “liberdade de expressão”, a MP impede que as redes sociais removam conteúdo de ordem política, ideológica, científica, artística ou religiosa. Na prática, isso facilita a disseminação de notícias falsas. As redes sociais têm 30 dias para se adaptar, mas é esperado que a questão acabe no Supremo Tribunal Federal ou que a MP seja barrada pelo Congresso.

As novas regras valem apenas para redes sociais com no mínimo 10 milhões de usuários registrados no País, o que abrange todas as grandes plataformas, como Facebook, Twitter, YouTube e TikTok.

Definição de rede social

A MP adiciona ao Marco Civil da Internet a definição de “rede social”, descrita da seguinte maneira no texto: “aplicação de internet cuja principal finalidade seja o compartilhamento e a disseminação, pelos usuários, de opiniões e informações, veiculados por textos ou arquivos de imagens, sonoros ou audiovisuais, em uma única plataforma, por meio de contas conectadas ou acessíveis de forma articulada, permitida a conexão entre usuários, e que seja provida por pessoa jurídica que exerça atividade com fins econômicos e de forma organizada, mediante a oferta de serviços ao público brasileiro com, no mínimo, dez milhões de usuários registrados no País”

A MP ressalva que o texto não se aplica a apps de mensageria e de comércio móvel. Ou seja, não vale para o WhatsApp ou para marketplaces em geral, por exemplo.

Remoção de conteúdo

A MP veda aos provedores de redes sociais “a adoção de critérios de moderação ou limitação do alcance da divulgação de conteúdo que impliquem censura de ordem política, ideológica, científica, artística ou religiosa”, a não ser em casos previstos como de “justa causa”. Configura-se justa causa para a remoção imediata a publicação de conteúdos de nudez; incitação ao terrorismo ou à pedofilia; apologia a drogas ilícitas; prática ou incitação de atos de ameaça ou violência; violação de patentes; disseminação de vírus de computador; dentre outros.

Também está previsto que as redes sociais podem remover conteúdo caso haja requerimento de uma pessoa que tenha se sentido ofendida em sua honra ou tido sua privacidade ou dados pessoais violados. 

Fora essas possibilidades, as redes sociais só poderão excluir conteúdo mediante determinação judicial.

Além disso, as redes sociais são obrigadas a comunicar qualquer remoção de conteúdo imediatamente ao seu autor e garantir a ele direito de recurso e ampla defesa.

Bloqueio ou exclusão de contas

O bloqueio parcial de serviços ou a exclusão de contas das redes sociais só poderão acontecer em determinadas hipóteses previstas na MP, como: uso da identidade de terceiros para enganar o público; uso de bots para publicações automáticas; contas que vendam produtos que firam patentes; ou cumprimento de ordem judicial.

O descumprimento da MP pode gerar sanção no valor de até 10% do faturamento do provedor de rede social no Brasil ou mesmo a proibição de suas atividades no País.

Reação

É esperado que entidades, partidos políticos e/ou empresas de tecnologia acionem a justiça contra a MP. Especialistas apontam uma série de ilegalidades contidas nela, inclusive constitucionais. Outra possibilidade é de que a MP seja barrada no Congresso. Os parlamentares têm um prazo de 90 dias para aprová-la ou rejeitá-la.

Análise

Nos últimos anos, as redes sociais viraram meio de distribuição de notícias falsas e de teorias da conspiração, muitas delas maléficas para democracias e para o combate à pandemia. Pressionadas pela opinião pública e por instituições governamentais, as redes sociais começaram a tomar providências para controlar o uso abusivo de seus canais, doa a quem doer. Conteúdos do ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e do atual presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, já foram removidos ou classificados como duvidosos por redes sociais como Twitter, Facebook e YouTube. Trump, aliás, teve sua conta banida do Facebook até 2023, por exemplo.

No Brasil, apoiadores de Bolsonaro vêm sendo presos ou investigados pelo que publicam nas redes sociais, especialmente quando fomentam atos considerados antidemocráticos ou pregam a violência contra figuras públicas. Além disso, muito conteúdo falso sobre a pandemia vem sendo removido das redes sociais no Brasil, em razão do desserviço que prestam, pois podem causar mortes.

Com o pretexto da liberdade de expressão, a MP 1.068 dá segurança jurídica para propagadores de fake news. É um retrocesso perigoso para o enfrentamento da pandemia, para a realização das próximas eleições e para qualquer outro grande debate público que a sociedade venha a ter no futuro.