Algar Telecom; Brain

Zaima Milazzo: “A grande armadilha da inovação é não ter foco no resultado”. Foto: divulgação

Cinco anos atrás, a Algar tomou a decisão de criar um centro de inovação, o Brain. Com foco especialmente em IoT e 5G, os resultados já estão sendo colhidos. Um dos projetos mais recentes é o de uma geladeira inteligente para bares e restaurantes que consegue fazer a venda por reconhecimento facial, além de avisar sobre a necessidade de reposição de estoque. Até o final do ano, 5 mil delas estarão espalhadas pelo Brasil, prevê a diretora de Inovação da Algar Telecom e presidente do centro de inovação Brain, Zaima Milazzo. A executiva, que estará no painel de abertura do MobiXD, dia 10 de maio, junto com executivos da Claro, da Vivo e da TIM, conversou com Mobile Time sobre este e outros projetos do Brain.

Mobile Time – O que é o Brain?

Zaima Milazzo – O Brain é uma iniciativa muito nova, que completará cinco anos de vida em agosto. Seis anos atrás estava sendo cunhado o termo ‘transformação digital’. As operadoras naquela época sofriam com as OTTs, que eram vistas como ameaça para suas linhas de receita. O SMS era o exemplo mais emblemático, porque foi destruído pelo WhatsApp, embora siga crescendo até hoje, por ser ferramenta importante para segurança e confirmação de senha. Mas, para mensagens P2P, nós brasileiros paramos de usar o SMS e trocamos pelo WhatsApp. Naquela época começavam a surgir os streamings de vídeo. Diante disso, qual seria o futuro da TV a cabo? Hoje sabemos que o impacto foi drástico. Naquele tempo a Algar vivia um momento bom, com resultados e entregas de metas de forma bastante consistente. Mas ao olhar a revolução ágil de transformação tecnológica e digitalização perguntávamos se aquilo era um ameaça ou uma oportunidade para negócios? A nossa visão é de que seria uma oportunidade e precisávamos dar o foco necessário. Então, idealizamos uma estrutura que fosse autônoma e que tivesse processos, métodos e ambientes apropriados para capturar essa oportunidade vinda da transformação digital. Assim nasceu o Brain, como um centro de inovação.

Desenhamos o que seria adequado à nossa estratégia, que era gerar mais negócios e oportunidades para a Algar Telecom. Só que existe uma grande armadilha na inovação. Tenho 22 anos de Algar e aprendi que a grande armadilha da inovação é não ter foco no resultado. São tantas as oportunidades que aparecem que a gente se perde. E se não gerar resultado a gente não tem perenidade. Se o Brain não tivesse obtido resultado, eu não estaria conversando com você hoje.

Por falar em foco, quais as áreas ou verticais priorizadas no Brain?

Elegemos algumas avenidas tecnológicas para entendermos e nos aprofundarmos para extrair oportunidades: IoT; 5G (neste momento estudamos fortemente soluções para verticais de negócios); virtualização de telecom (a primeira onda de produtos teve esse foco, com soluções em cloud, porque cada vez mais buscamos escala); digital (onde agregamos todas as tecnologias que tratam dados, como inteligência artificial, realidade aumentada e realidade virtual, blockchain, enfim, tecnologias que fazem a transformação digital acontecer).

Além disso, temos foco estratégico sob a ótica de negócio. A Algar tem foco de atendimento para o pequeno e o médio negócio. É onde a gente se especializou. E somos reconhecidos por esse público. Quando desenvolvemos uma solução pensamos em qual a melhor forma de resolver a dor desse cliente. É diferente de uma grande corporação, onde tem departamento de TI ou de telecom que consegue entender seu problema e demandar soluções mais customizadas. O pequeno e o médio não contam com isso. Levamos soluções que são simples para resolver problemas relevantes desses clientes.

A Algar também atende clientes corporativos, mas aí atuamos de forma verticalizada, com foco em agronegócios, por estarmos no centro do País e o grupo Algar inserido no agronegócio, o que nos permite entender melhor essa atividade. Também estamos no setor de saúde, que notamos ter pouca eficiência, precisando de ajuda principalmente para automação aplicada em processos internos da cadeia. Outra vertical é a da indústria 4.0, na qual temos foco específico em ‘fast moving consumer goods’, também conhecida como cadeia gelada, ou marcas que dependem de refrigerador na ponta para a entrega de produtos para o consumidor final.

Como é a estrutura do Brain e sua relação com a Algar? Qual é seu grau de autonomia?

O Brain é autônomo. Recebemos as diretrizes da Algar e temos liberdade de criar soluções e fazer os projetos.

Trabalhamos com muita colaboração, com vendors tradicionais do nosso setor, e também com players digitais do mundo. Já lançamos com IBM e Nokia, e colaboramos com muitas startups. Open innovation é a base do nosso trabalho. Transformamos diretrizes em desafios buscando startups que tenham soluções para nos ajudar a montar produtos e serviços.

Quantas pessoas trabalham no Brain? Qual a formação dos profissionais? 

120 pessoas trabalham no Brain. A formação é diversa. E atuamos com squads. Tem cadeiras técnicas com engenheiros e arquitetos de soluções, mas também gente de UX, CX, e cadeiras de negócios, marketing e comunicação. O pessoal de processos é quem desenha a jornada do cliente. Temos design estratégico, com a voz do cliente, com a participação de uma pessoa que o representa. Às vezes trazemos o próprio cliente para essa cadeira. 

Quando uma solução criada no Brain passa para as mãos da Algar?

Evoluímos cada solução até ela ficar pronta para escalar. Usamos método ágil, fazemos protótipo, validamos tecnicamente, evoluímos para MVP, até ter o formato de um produto ou solução. Daí fazemos a incubação dentro do Brain até ter escala mínima e entregamos para que possa sobreviver dentro da estrutura da Algar Telecom, com os processos de venda da operadora.

Mas se a gente entregasse a uma estrutura tradicional dentro da Algar, isso morreria. Então a Algar criou um programa que é a expansão do programa ágil do Brain, mas dentro da estrutura da Algar. Quando solução é internalizada, vai para dentro desse programa. Então não tem choque cultural nem de forma de trabalho ou método. 

Você citou o setor de saúde como uma das prioridades. Já tem algum produto nessa área desenvolvido pelo Brain?

Lançamos em novembro do ano passado o MediQuo, um plano de saúde barato: R$ 15,90/mês. O cliente tem acesso 24 horas a atendimento primário. Não precisa sair de dentro da casa. Durante a ômicron conseguimos ajudar bastante as pessoas com esse produto. Inclui telemedicina e até orientação psicológica e de personal trainer. Só foi possível por causa da pandemia. É um app que o cliente baixa e pode ter acesso ao corpo medico. MediQuo é uma startup espanhola que queria entrar no mercado brasileiro. Fizemos a validação técnica e comercial. É uma parceria comercial que temos com eles.

Há intenção de firmar parcerias mais profundas, com participação acionária ou até joint-venture? Essa parece ser uma tendência atualmente entre as operadoras.

Sim, temos outras iniciativas nas quais tentamos aprofundar mais as parcerias. A tendência é essa mesmo: termos participação mais forte nessas parceiras, porque entendemos que a gente se complementa em diversos aspectos e estando ligados de forma mais estratégica do que simplesmente em uma parceria comercial.

No segmento de fast moving consumer goods temos um exemplo de parceria mais profunda. Trata-se de um projeto desenvolvido junto com o cliente, que é a marca mais valiosa do mundo nesse setor. O desafio dessa marca era de se aproximar do consumidor final. Essa cadeia tem várias etapas: o fabricante do produto licencia a marca e a fórmula; tem os distribuidores; e tem os bares. É necessário que o produto esteja gelado na ponta para que cliente possa degustar. O grande problema é que a marca queria se aproximar do consumidor e entendê-lo. Então desenvolvemos um ponto de venda totalmente autônomo e inteligente baseado em reconhecimento de imagem e inteligência artificial. É uma geladeira em que o cliente, para comprar o produto, precisa antes se cadastrar em um aplicativo, registrando seu rosto e seu meio de pagamento. Depois do cadastro, não precisa de mais nada para comprar o produto. A geladeira reconhece o seu rosto e o produto é retirado, fazendo a cobrança automaticamente.

O produto é reconhecido por computação visual?

Sim. E o cliente pode retirar até mais de um. A precisão é de 98%. O cliente não precisa dizer qual é o produto.Temos algumas geladeiras inteligentes hoje. Esperamos ter 5 mil até o final do ano no Brasil. E agora estamos buscando outros clientes desse setor de fast moving consumer goods para essa solução.

Como é feita a transmissão de dados da geladeira?

Usamos a rede móvel 3G e 4G. Não precisamos de baixa latência. A transmissão é só para as transações. Além de dar toda a experiência para o consumidor e aproximar a marca ao cliente final, a gente gera eficiência para a cadeia porque damos informações para a reposição de estoque em tempo real, o que permite planejá-la melhor. Ficamos sabendo quantos produtos saem por dia, e dá para prever quando vai acabar. Esses dados alimentam a plataforma.

Quem desenvolveu com vocês esse produto?

Foi uma startup chamada U-Get, com a qual fizemos uma parceria mais estratégica. Temos participação societária nela. Somos minoritários, mas não posso abrir o percentual.

Algum outro produto que queira destacar?

Temos um guarda-chuva de produtos para levar soluções para apoiar nossos clientes na agenda ESG. O primeiro deles se chama Utilities Control e foca em eficiência energética através de monitoramento remoto do consumo de energia. É um sensor que instalamos em equipamentos, como refrigerador ou ar condicionado. E temos calculadora de emissão de CO2 embarcada para mostrar ao cliente quanto está emitindo em CO2. No monitoramento de energia, a parceria é com a HEPHAENERGY, uma startup. E na calculadora temos parceria com uma startup chamada Green Domus. É um produto bacana porque ajuda nosso cliente a tratar a questão de ESG. E estendemos para o cliente todo know-how da Algar, que este ano foi reconhecida pela nona vez como a operadora mais sustentável do País.

Houve o caso de um pequeno supermercado que participava da prova de conceito dessa solução e conseguiu salvar todo o seu estoque porque nosso sistema avisou que o refrigerador havia parado de funcionar durante o fim de semana, quando o estabelecimento estava fechado. Ele ficou muito agradecido de a gente ter evitado essa perda. 

Ao monitorar um ar condicionado, verificamos se está funcionando dentro dos parâmetros de energia convencionais. Às vezes precisa só fazer limpeza de filtro, ou trocar o gás etc. O cliente identifica o vilão de consumo de energia e atua em cima. É uma solução simples. Os dados captados pelo sensor são transmitidos pela rede celular, ou por Wi-Fi.

O que muda com a chegada do 5G? Quais novos serviços a Algar está planejando?

A Algar foi a grande vencedora do leilão na nossa área de atuação. Aumentamos a faixa de frequência para o consumidor final e adquirimos também 1 GHz na faixa de 26 GHz. Queremos atuar verticalmente para alguns setores na frequência milimétrica. Temos soluções sendo testadas em clientes para essa verticalização. Queremos auxiliar na automação do chão de fábrica. São soluções para trazer mais produtividade. Em saúde, usaremos realidade virtual e aumentada na telemedicina. Temos muitas soluções sendo testadas, ainda não em caráter comercial. Mas pretendemos, em um curto espaço de tempo, colocar algumas delas no mercado. Nossa intenção com essa grande faixa em 26 GHz é termos um campo vasto para desenvolvimento de soluções verticais no 5G. E depois levaremos para clientes do resto do Brasil com outras formas de uso da frequência, de repente no modelo de rede privada, ou em parcerias com outras operadoras. Essa é a nossa estratégia.