As escolas brasileiras não estavam preparadas para a mudança radical no ensino que o isolamento social causado pela pandemia do novo coronavírus forçou. Nem as instituições, nem alunos ou professores. A pesquisa TIC Educação 2019, divulgada nesta terça-feira, 9, e desenvolvida pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), por meio do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), revela que 28% das escolas presentes em áreas urbanas contam com um ambiente ou plataforma de aprendizagem a distância, o que poderia ajudar nesse momento. Outro ponto detectado pelo estudo é que 18% dos alunos acessam exclusivamente a Internet via celular e 98% dos alunos das escolas urbanas acessam a rede no handset. Vale esclarecer que a pesquisa investiga o acesso, o uso e a apropriação das tecnologias de informação e comunicação (TIC) nas escolas públicas e particulares brasileiras de Ensino Fundamental e Médio, com enfoque no uso pessoal desses recursos pela comunidade escolar e em atividades de gestão e de ensino e de aprendizagem.

Sobre Internet nas casas dos alunos, 83% dos estudantes de escolas em centros urbanos afirmam acessar a rede no próprio quarto e 94% em outro cômodo da casa.

94% dos alunos entrevistados assistem a vídeos, programas, filmes ou séries na Internet. Porém, quando o assunto é produção de conteúdo, o número cai: 45% já postaram um texto, uma imagem ou um vídeo que fez, e 10% dos entrevistados criaram um jogo, aplicativo ou programa de computador.

Desenvolvimento de habilidades

De acordo com o gerente do Cetic.br, Alexandre Barbosa, mais de 60% das escolas particulares já tinham alguma plataforma baseada em ensino a distância. Essas instituições conseguirão passar pela pandemia melhor do que aqueles sem nada. “Mas (na pandemia) os professores tiveram que desenvolver habilidades para poder usar esse tipo de plataforma, assim como os alunos e os responsáveis. Existe um potencial das tecnologias para a ampliação do acesso à educação, mas as implementações e as políticas públicas demoram. E essas políticas focam na escola – conectar e promover atividades dentro do espaço escolar. Chegar aos alunos sempre foi mais complexo. Temos mais de duas décadas fomentando isso, mas são políticas públicas voltadas para a conexão das escolas. Na pandemia, todos foram pegos de surpresa. Muitas casas não estão preparadas para isso, com Internet ruim ou mesmo sem. Agora, as políticas públicas devem pensar em disponibilizar a tecnologia nos domicílios”, explica Barbosa.

Para os pesquisadores da TIC Educação 2019, a estrutura tecnológica por si só não resolve: é preciso desenvolver habilidades nos professores e, neste momento de isolamento social, nos mediadores também – pais, mães e responsáveis – para ajudar as crianças menores sem autonomia.

Celular não é o ideal

Além das habilidades tecnológicas que precisam ser desenvolvidas, outra limitação está nos dispositivos usados. Computadores de mesa ou notebooks estão cada vez menos presentes nos domicílios, assim como os tablets – e essa é uma tendência mundial, segundo Barbosa. Para se ter uma ideia, o desktop está presente em 41% das residências dos alunos, uma redução de 4 pontos percentuais em relação ao estudo de 2018. Já os notebooks, caíram de 39% para 35%. Sobra, então, o celular.

“Muitos usam apenas o celular como dispositivo de acesso à Internet. Vimos isso também na nossa pesquisa anterior, a TIC Domicílios. Com a pandemia, as desigualdades se tornaram ainda mais evidentes”, explicou Barbosa durante a apresentação do estudo em live no YouTube. Para o pesquisador, o fato de o celular ser o principal meio de acesso à Internet é um complicador para o desenvolvimento de novas habilidades tecnológicas.

Para a coordenadora da TIC Educação 2019, Daniela Costa, a pesquisa, realizada há 10 anos, revela uma característica marcante na comunidade escolar brasileira: a iniciativa própria. “Em todos os dados vemos a iniciativa dos próprios alunos e professores em vencer os desafios. Quando a escola não tem Internet ou computador, os alunos e professores usam o próprio celular. Esse é um dado marcante. Quando as políticas públicas não chegam, as pessoas encontram mecanismos para resolver via tecnologia”.

Uso da rede

Em relação ao uso da Internet para a realização de atividades pedagógicas em 2019, 77% do total de alunos de escolas urbanas que são usuários de Internet utilizavam a rede para fazer trabalhos em grupo, e 65%, para trabalhos escolares à distância. Uma porcentagem menor dos alunos (28%) afirmou, ainda, que utiliza a rede para se comunicar com os professores. Os docentes, por sua vez, usam a rede para esclarecer dúvidas dos alunos (48%), disponibilizar conteúdos para os alunos (51%) e receber trabalhos enviados (35%).

A pesquisa também indica que um percentual importante dos alunos de escolas urbanas utilizam as redes sociais para a realização de trabalhos escolares: em 2019, 81% usaram este recurso, sendo que 61% disseram utilizar o WhatsApp para essa tarefa, percentual que se manteve estável desde 2018.

Metodologia

A pesquisa TIC Educação 2019 foi realizada entre agosto e dezembro de 2019. Em escolas urbanas, foram entrevistados presencialmente 11.361 alunos de 5º e 9º ano do ensino fundamental e 2º ano do ensino médio; 1.868 professores de Língua Portuguesa, de Matemática e que lecionam múltiplas disciplinas (anos iniciais do Ensino Fundamental); 954 coordenadores pedagógicos e 1.012 diretores. Em escolas localizadas em áreas rurais, foram entrevistados 1.403 diretores ou responsáveis pela escola. Neste caso, as entrevistas foram feitas por telefone.