Os representantes dos marketplaces online-to-offline (O2O) acreditam que a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) não deve alterar o modelo de negócios das empresas e nem empresas devem desaparecer. No entanto, ressaltam que elas precisarão passar por adaptações para se adequar à lei assinada nesta semana pelo presidente Michel Temer.

“Não é só atualizar os termos de privacidade. Com a nova lei têm ações específicas para implementar. Criar essa cultura de que a LGPD é necessária, não é fácil, mas estamos fazendo isso há meses”, disse Myrella Mazzuchelli Dias, advogada da OLX.

Na OLX, por exemplo, a diretoria passou a ver lei de proteção dos dados como uma oportunidade, não um fato. “Adotar as políticas corretas e ficar de acordo com a legislação, vale muito mais do que correr o risco (de levar a multa). E não é só a multa, tem o valor de marca, como aconteceu com diversas firmas que tiveram vazamento de dados”, completou a executiva ao lembrar que as companhias têm 18 meses para se adaptarem.

A também advogada Camila Nagano, do iFood, defendeu que parte do trabalho de adequação à lei vem sendo feito pelas empresas desde a aprovação do GDPR, lei da União Europeia. E, assim como sua colega da OLX, a especialista crê que é necessário um trabalho de “cultura e conscientização” para dar importância à privacidade.

Por sua vez, Ricardo Dalmaso, gerente sênior jurídico do Mercado Livre, acredita que mesmo neste cenário, é preciso encarar a lei com tranquilidade de positividade, especialmente dentro das empresas. “Inevitavelmente, nós, empresas, vamos ter que revisitar custos e a nossa área de negócios”.

“No caso do advogado interno (dentro de empresa) é vital achar parceiros. No Mercado Livre todos entendem a importância do tema. Acho que um dos principais diferenciais para atingir isso é a confiança”, completou Dalmaso.

Aprendizados, adaptações e investimentos

Mas nem tudo são flores com a entrada da lei de dados para as empresas, como lembrou Diego Gualda, chefe do jurídico da 99: “Passar por esse processo de adaptação pode não ser fácil. Nós vimos que o processo da GDPR durou dois anos, e nem todo mundo está pronto. Para quem está no negócio, essa visão deve ser de longo prazo”.

“Quanto mais rápido eu adaptar a minha curva de aprendizado e acelerar os processos de adaptação, estarei mais preparado no mercado e terei soluções inovadoras para tratamento de dados. Quem tiver uma estrutura de tratamento de dados poderá ofertar esse serviço. Nem todo mundo vai querer ter uma estrutura de dados interna”, completou.

Esse trabalho de adequação também demanda investimentos. A partir de 2020, por exemplo, as empresas precisarão de uma pessoa especialista em política de dados, o Data Protection Officer (DPO), algo que ficará mais esclarecido quando uma eventual Autoridade Nacional de Dados definir detalhes do DPO – se será obrigado a ficar dentro da empresa, se deverá existir de acordo com o tamanho da empresa, dos dados trafegados ou receita, como lembra Renato Leite Monteiro, sócio do escritório Baptista Luz Advogados.

Para Gualda da 99, a entrada da LGPD no cotidiano jurídico brasileiro demanda “aprendizado” por parte dos profissionais de direito. E, no caso específico de empresas, a lei deve ser introduzida aos poucos, como estágios de luto.

“Nos nossos casos (99, iFood, Mercado Livre e OLX) são empresas internacionais. Mas, quando vamos explicar para alguém de negócios com atuação local, você tem que explicar como a lei como ‘fases de luto’. Quem tiver que começar essa discussão com alguém, tem que lembrar que a Europa trata disso há 20 anos, e nós estamos começando praticamente do zero. A maior tarefa do profissional de direito corporativo é ser uma espécie de psicólogo para a companhia”, explicou o executivo.