“As pessoas não atendem mais as chamadas a não ser quando sabem quem está ligando: isso acontece em qualquer lugar do mundo”, diz o cofundador e presidente da First Orion, Jeff Stalnaker, em entrevista para Mobile Time. Na sua visão, as operadoras precisam restaurar a confiança dos assinantes nas chamadas telefônicas, o que pode ser feito através da adoção de soluções de bloqueio de chamadas de spam e de identificação da empresa que está ligando. Quem implementar isso primeiro no Brasil poderá ter uma vantagem competitiva resultando em aumento de adições líquidas, tal como aconteceu com a T-Mobile nos EUA, depois de instalar esses sistemas da First Orion, prevê Stalnaker. Na conversa com Mobile Time, o executivo comparou o problema das chamadas indesejadas nos cenários brasileiro e norte-americano, tendo como base os resultados da pesquisa Panorama Mobile Time/Opinion Box encomendada pela First Orion.

Mobile Time – Chamadas de televendas são as ligações indesejadas mais recebidas no Brasil: 92% dos brasileiros com celular já receberam esse tipo de chamada e 89% reclamam que isso os incomoda. É também um problema frequente: 39% afirmam que recebem essas chamadas todo dia ou quase todo dia. O cenário é parecido nos EUA?

Jeff Stalnaker – Com certeza. Qualquer empresa precisa vender, e não as culpo por isso. Entretanto, entendo que o consumidor, neste caso o assinante móvel, tem o direito de dizer ‘não’. Tal como no Brasil hoje, nos EUA há listas de bloqueio, regras para televendas ou listas de “não perturbe”, mas elas não funcionam. A principal diferença é que as operadoras móveis norte-americanas implementaram uma tecnologia que permite aos consumidores restringir severamente chamadas indesejadas de televendas.

Além disso, no fim de 2016, o órgão regulador dos EUA começou a exigir que as operadoras tomassem certas medidas, como a oferta aos assinantes de níveis básicos de controle sobre as chamadas. Não vimos os reguladores brasileiros agirem da mesma forma até agora. Graças a empresas como a First Orion, operadoras podem adotar tecnologias bastante eficientes para proteger seus assinantes. Também provemos o serviço de chamadas verificadas para marcas, de maneira que apareça para o usuário o logo da empresa que está chamando e o motivo da ligação. Assim o consumidor fica bem informado para decidir se atende ou não.

Golpes telefônicos são outro grande problema no Brasil. 72% dos assinantes móveis no País já receberam esse tipo de ligação e 14% deles perderam dinheiro. Esses números surpreendem você quando comparados com os EUA? Quais os tipos de golpes telefônicos mais comuns nos EUA?

Jeff Stalnaker, cofundador e presidente da First Orion

Esses números não me surpreendem. Nos últimos 12 meses, 59 milhões de consumidores norte-americanos perderam US$ 29 bilhões em golpes telefônicos. São números impressionantes! Enganar os consumidores pelo telefone é um grande negócio, fácil de fazer e muito lucrativo para os criminosos. Os fraudadores estão constantemente desenvolvendo novos e engenhosos métodos para enganar as pessoas, como o ‘spoofing’ (alteração do número de quem está ligando). Essa é a razão para golpes telefônicos continuarem sendo um problema massivo mesmo depois de as operadoras norte-americanas terem adotado certas soluções. O problema é tão grande que os consumidores estão dispostos a trocar de operadora para conseguir uma proteção melhor. Ter a melhor solução de proteção contra golpes telefônicos para ganhar market share foi a motivação para a T-Mobile ter lançado o Scam Shield em 2020. E funcionou: a T-Mobile registrou significativo incremento em adições líquidas de assinantes depois do lançamento. Devo dizer que a First Orion é a provedora dessa solução para a T-Mobile nos EUA. Acredito que a primeira operadora no Brasil que investir em proteger seus consumidores verá resultados similares em adições líquidas. A pesquisa Panorama Mobile Time/Opinion Box confirma que o mesmo fenômeno acontece no Brasil e a única linha de defesa contra os fraudadores é através das operadoras móveis. Embora a gente não tivesse à mão essa pesquisa quando decidimos investir no Brasil, nossas análises eram claras de que os brasileiros precisavam de proteção. Estamos aqui para ajudar todas as operadoras móveis.

Deixe-me abordar também a questão do ‘spoofing’. Prevenir os golpes requer também identificar corretamente quem está ligando. Nossa tecnologia de inteligência artificial pode reduzir os golpes significativamente, mas o consumidor também contribui ao analisar quem está ligando. O spoofing não acontece sob a nossa supervisão. Essa tecnologia só pode ser implementada pelas operadoras móveis.

A respeito da última parte da sua pergunta, os golpes mais comuns nos EUA são maneiras criativas de roubar dados pessoais dos consumidores que facilitarão acesso a contas bancárias, tornando possível a solicitação de empréstimos etc. Entre os dados procurados está o número de seguridade social, equivalente ao CPF no Brasil, assim como senhas e pin codes.

Fraudadores estão atentos às notícias e tentam aproveitá-las em seus golpes. Fazem uso de eventos como desastres naturais, datas comemorativas e até a pandemia. A First Orion monitora o tráfego em regiões do país que estejam passando por algum evento fora do comum, como furacões e nevascas, pois o volume de tentativas de golpe aumenta de maneira significativa.

Como uma consequência das chamadas indesejadas, muitos brasileiros simplesmente não atendem mais as ligações de números desconhecidos. Como marcas e operadoras podem lidar com esse problema? 

As pessoas não atendem mais as chamadas a não ser quando sabem quem está ligando: isso acontece em qualquer lugar do mundo. Infelizmente, esse comportamento leva o consumidor a perder algumas chamadas importantes. Enquanto lutamos contra os spammers de um lado, por outro também nos dedicamos a prover ao consumidor transparência completa sobre as chamadas para poder decidir se quer atendê-las ou não enquanto o telefone toca ou vibra. Chamamos essa solução de ‘Branded calling’. Nós inventamos o ‘Branded Calling’ em 2015. Parte da nossa luta contra chamadas indesejadas é olhar e analisar as chamadas legítimas e boas. Neste ano, somente nos EUA, vamos processar mais de 500 milhões de chamadas verificadas de marcas (branded calls). Isso significa que as empresas ou marcas ligam para os consumidores e têm suas informações exibidas na tela do smartphone. Assim, bancos, seguradoras, varejistas, hospitais, clubes esportivos podem contactar consumidores e ter seu logo e uma mensagem expostos no aparelho. A pessoa pode se tranquilizar e atender a chamada sabendo quem está ligando e porquê. Mesmo que não atenda, vai saber quem ligou e a razão da ligação, podendo tratar do assunto mais tarde, mesmo que em outro canal. Desta forma, o propósito da chamada é atingido, restaurando confiança e poder às chamadas de voz, além de adicionar valor às operadoras de serviços móveis.

Nossos serviços de chamadas verificadas de marcas funcionam diretamente com as marcas e seus call centers e provedores de BPO parceiros. Acredito que esse serviço será altamente bem sucedido no Brasil. Entendemos que nossos produtos de proteção de chamada e de branded calls trazem confiança e credibilidade de volta ao telefone, ajudam a fechar mais negócios, e há em geral uma restauração da boa relação com os consumidores. Nossos sistemas estão prontos para serem implementados no Brasil e devemos ter em breve alguns cases de sucesso.

Os EUA criaram uma regulação chamada STIR/SHAKEN* para combater o problema das chamadas indesejadas. Poderia explicar do que se trata? Acredita que iniciativas regulatórias similares deveriam ser adotadas no Brasil e em outros mercados? Por quê?

Em 30 de junho de 2021, todas as operadoras norte-americanas precisaram implementar o STIR/SHAKEN, uma iniciativa que abrange toda a indústria com o objetivo de reduzir golpes telefônicos com falsificação do número de origem (spoofed calls). Entretanto, há várias exceções, como no caso de operadoras de pequeno porte e redes legadas que não são baseadas em protocolo IP. Os componentes do STIR/SHAKEN são bastante complexos. Os reguladores exigem diversas providências, mas, de maneira genérica, o STIR/SHAKEN permite que a operadora que origina a chamada possa ‘assiná-la’ de forma que a operadora que a recebe consiga verificá-la. Assim, é possível assegurar que o número de origem não foi alterado. Ressalto que embora o STIR/SHAKEN ajude, ele não resolve o problema massivo de golpes telefônicos nos EUA ou em nenhum outro lugar do mundo. Estamos trabalhando com algumas operadoras fora dos EUA, em países onde o STIR/SHAKEN está sendo avaliado mas onde ainda não é mandatório. Não há dúvida de que a adoção holística do STIR/SHAKEN faz diferença e poderá eventualmente ser mandatória, mas isso ainda pode levar muitos anos. Nós provemos soluções de STIR/SHAKEN para nossas operadoras parceiras. Aliás, implementamos a primeira solução STIR/SHAKEN do mundo para a T-Mobile, nos EUA.

*STIR significa “Secure Telephone Identity Revisited” e SHAKEN, “Signature-based Handling of Asserted Information Using toKENs”.