A defesa da Meta, por meio do Facebook Brasil, encaminhou manifestação ao STF contra eventual determinação de medidas imediatas por parte das plataformas digitais diante de apontamentos de violações de direitos feitas pela AGU. Para a empresa, os casos de veiculação de conteúdo ilícito demonstrados pelo órgão não refletem a realidade, além de que o pedido formulado pela União seria “amplo e impreciso”, impactando diferentes provedores.
“[…] a presente discussão evoluiu de forma preocupante para uma tentativa de prolação de decisão, em cognição sumária, que representa um instrumento de regulação universal e abstrata da internet, com a criação, por via judicial precária, de um regime normativo novo para a atuação das plataformas digitais no Brasil”, alega os representantes da empresa em petição protocolada no fim da tarde de ontem, terça-feira, 27.
Trata-se de um pedido de tutela de urgência incidental (que gera exigências de medidas imediatas diante de riscos de dano enquanto o julgamento não é concluído), encaminhado na segunda-feira, 26, pela AGU, especialmente ao ministro Dias Toffoli , um dos relatores dos processos que analisam a responsabilidade dos provedores de aplicação de internet sobre o conteúdo gerado pelos usuários, nos termos do Artigo 19 do MCI (Marco Civil da Internet) – dispositivo que exige ordem judicial para responsabilização.
Na petição, o órgão federal destaca que a tese apresentada por Toffoli é a que mais se alinha ao posicionamento da União – o magistrado entende que há hipóteses em que as plataformas devem remover conteúdos ilícitos mesmo sem ordem judicial ou notificação. Contudo, a AGU não sugere expressamente quais medidas imediatas o Supremo deveria tomar, limitando-se a indicar a necessidade de respostas diante de casos de fraudes, desinformação e violações de direitos consumeristas. O instrumento utilizado em questão poderia admitir um despacho individual por parte de Toffoli.
Na manifestação, a big tech destaca que embora Toffoli seja um dos relatores, o recurso (de autoria do Facebook) é analisado em conjunto a outro (do Google) e a tese apresentada por ele não é a única em discussão, já que o relator do outro processo, Luiz Fux, e o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, apresentaram visões diferentes.
“Em síntese, enquanto o julgamento estiver em andamento, com divergência registrada e previsão de retomada da deliberação, é absolutamente descabido cogitar de medida cautelar que antecipe, isole ou projete efeitos de tese ainda não firmada, motivada em mero casuísmo fragilmente demonstrado, sob pena de comprometer a autoridade institucional do Supremo Tribunal Federal e desvirtuar o próprio sistema de precedentes qualificados”, defendeu a plataforma.
Além disso, considera, ainda, que “a pretensão da União Federal traz embutido dano reverso ao Facebook Brasil, à Meta e a todos os provedores de aplicação de internet, com franca violação a direitos fundamentais e medidas restritivas de liberdade desprovidas de bases racionais”.
Dados de anúncios fraudulentos
A Meta dedicou grande parte da manifestação em contestar levantamento citado pela AGU no pedido formulado ao STF, contidos em relatório do NetLab (Laboratório de Estudos de Internet e Redes Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro). A pesquisa em questão identificou 1, 7 mil anúncios em plataformas da big tech com conteúdo fraudulento que promoviam golpes e informações falsas sobre valores a receber pela população e outros temas relacionados às novas regras de envio de informações de transações via Pix à Receita Federal, sendo 70,3% adulterados com IA e 40,5% feitos por páginas que se passavam pelo Governo Federal.
Os dados do NetLab foram apresentados pela AGU como um dos fatos que justificaria a situação de urgência para a exigência de medidas por parte da plataforma. A Meta diz que “todos os anúncios indicados na petição da União Federal estão indisponíveis ou inativos”, e classifica como “poucas horas” o fato de algumas dessas postagens patrocinadas terem sido impulsionadas por cerca de três horas.
A Meta também critica o uso de amostragem para o levantamento da NetLab, argumentando que o número analisado corresponde a menos de 1% do total de anúncios veiculados no Brasil. O levantamento do laboratório ocorreu de 10 a 21 de janeiro. Neste período, a empresa diz que “removeu mais de 500 mil anúncios apenas no Brasil em razão de violações às suas políticas”, sem detalhar por quanto tempo ficaram ativas a maioria delas. De forma geral, a plataforma ressalta que cerca de 90% do conteúdo ilícito nem chega a ficar online por mecanismos de checagem prévia.
Validade do despacho
Na petição, a Meta também coloca em dúvida a validade de eventual medida que viesse a ser proferida individualmente por Toffoli.
“A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é clara no sentido de que a tese de repercussão geral [como é o caso em questão] somente adquire autoridade normativa quando for firmada pela maioria absoluta do Plenário. Além disso, a própria composição do julgamento demonstra a existência de divergência substancial, o que impede qualquer conclusão prematura ou simplificação da controvérsia. […] Em termos técnicos, o fundamento invocado não é nem vinculante, nem aplicável analogicamente à situação concreta, pois carece de definitividade e encontra-se submetido ao contraditório judicial qualificado”, argumentou.
A empresa também menciona outro processo que corre na Justiça Federal do DF, em que a AGU pede medidas imediatas semelhantes no sentido de remoção de conteúdos fraudulentos, alegando que o pedido ao Supremo seria “dupla litigância”, que “revela-se abusiva”.
Acesse aqui a íntegra da manifestação.
Retomada do debate no STF
O processo em questão teve votação iniciada em novembro do ano passado e foi suspenso por pedido de vistas (mais tempo para análise) do ministro André Mendonça. Ainda na segunda-feira, 26, mesmo dia em que a AGU protocolou o pedido de tutela, o magistrado liberou o processo para julgamento. A retomada da deliberação agora depende da inclusão em pauta pelo presidente Barroso.