A Anatel deliberou em reunião do Conselho Diretor nesta segunda-feira, 13, aplicação de multa de R$ 6,27 milhões ao Mercado Livre em Processo Administrativo por comercializar equipamentos eletrônicos sem homologação. O caso teve como relator Octavio Penna Pieranti. A decisão foi unânime entre os conselheiros.

Não é de hoje que acontece fiscalização em marketplaces. Em 2021, a agência pediu para que as plataformas de comércio eletrônico parassem de vender produtos de telecomunicações irregulares. Em 2024, fez-se uma aliança entre a agência reguladora e os marketplaces para combater o contrabando de smartphones.

No mesmo ano, a Anatel publicou uma cautelar que, entre as medidas mais extremas, estão a retirada do e-commerce do ar e uma multa que pode chegar a R$ 50 milhões. Nenhuma dessas penalidades foi aplicada ainda.

O caso entre Anatel e Mercado Livre

Com relação ao caso de venda de diferentes produtos irregulares, inclusive de câmeras de segurança, em uma primeira instância, foi aplicada uma multa de R$ 2,64 mil. Após o Mercado Livre apresentar recurso, a área técnica da Anatel reavaliou o caso e o cálculo da sanção, aumentando o valor para R$ 5,45 milhões – “para garantir a proporcionalidade e a razoabilidade da penalidade”, explicou Pieranti sobre o andamento do processo.

A equipe técnica da Anatel negou provimento ao recurso e reformou a sanção de ofício para o valor sugerido. O recorrente, então, apresentou novo recurso, quando foi verificada uma nova possibilidade de agravamento da sanção. O conselheiro Pieranti assumiu o caso tão logo chegou à agência, em setembro.

Os argumentos da defesa

Durante a reunião da Anatel, o advogado do Mercado Livre, Tomás Felipe Paiva, alegou que a agência criou uma “falsa narrativa” de que o marketplace não estaria disposto a cooperar. A defesa destacou diversas medidas voluntárias adotadas pela plataforma para coibir a venda de produtos não homologados, como: proibição de venda de jammers ou TV boxes, exigência de códigos de homologação para anúncios e a penalização de usuários violadores. Explicou que o Mercado Livre possui canais de denúncias e, no primeiro semestre de 2025, removeu mais de 6,8 milhões de anúncios por violação dos termos de uso, sendo que 98,9% dessas remoções foram proativas, utilizando tecnologia de machine learning.

A defesa argumentou ainda que a Anatel tem preferido uma abordagem de “comando e controle” em vez de diálogo, “distorcendo a competição ao agir apenas contra um conjunto de plataformas”.

De acordo com o advogado, há uma série de ilegalidades no processo, como: aplicação retroativa da metodologia (para chegar ao valor final da multa); falta de apuração da verdade material; violação à isonomia/impessoalidade; uso da confissão como agravante; e responsabilidade objetiva e solidária.

O advogado alegou que a aplicação da nova metodologia só seria razoável se o procedimento de fiscalização, que permite a cooperação do administrado e a obtenção de atenuantes, também tivesse sido adotado.

A multa foi majorada com base em um cálculo que considerou um volume em estoque “impensável” (como mais de 93 mil unidades de uma câmera de segurança). Esse número foi “obtido por uma simulação de compra no site e não por diligência para apurar o estoque real, o que catapultou a multa para milhões”.

Paiva alegou que o Mercado Livre não recebeu o mesmo tratamento dado a outras plataformas (como Shopee, Magazine Luiza, Americanas e Amazon), para as quais a Anatel adotou presunções mais benéficas (como 150 unidades presumidas de estoque) quando não conseguiu identificar o valor real.

A defesa alegou que o Mercado Livre, de boa-fé, trouxe aos autos dados sobre produtos vendidos para demonstrar que o número de estoque era irreal. A Anatel, no entanto, utilizou essa informação voluntária (suposta “confissão”) não como atenuante, mas sim para majorar a multa.

E, por fim, o advogado questionou a tese da responsabilidade objetiva e solidária das plataformas de marketplace, afirmando que essa conduta deveria ser atribuída aos usuários. Ele alegou que as decisões do STF sobre o artigo 19 do Marco Civil da Internet (MCI) – de responsabilização parcial das plataformas digitais por postagens de seus usuários – ainda não foram publicadas.

O voto do relator

Em seu voto, o conselheiro Pieranti rebateu os argumentos da defesa, negando provimento ao recurso e mantendo a majoração da multa. O relator rebateu todos os argumentos do representante do e-commerce e destacou que a Lei Geral de Telecomunicações confere à Anatel a competência para fiscalizar e certificar produtos relacionados a serviços de telecomunicações.

“A responsabilidade não termina no vendedor, mas se estende às entidades que divulgam ou intermediam a venda de produtos para telecomunicações. O Código de Defesa do Consumidor respalda essa ação”, disse Pieranti.

O relator defendeu a aplicação da nova metodologia, afirmando que esta é respaldada pela necessidade de atender aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Neste caso, a sanção inicial de R$ 2,64 mil era desproporcional, pois “apenas um dos diversos produtos irregulares verificados era anunciado a valor superior ao da multa inicialmente aplicada”, afirmou. Disse ainda que a possibilidade de agravamento da sanção é prevista em processos administrativos, já que o recurso possui efeito devolutivo.

Sobre o estoque, o conselheiro notou que o valor contestado pela defesa era aquele apresentado pelo próprio Mercado Livre em sua página da internet. Caberia à empresa provar que a informação era inverídica, o que não ocorreu.

O agravamento final da multa se deu após o recorrente apresentar voluntariamente em petição extemporânea o número de equipamentos vendidos (Vol). Diante da “confissão do recorrente”, foi solicitado um recálculo que resultou na multa final. O relator esclareceu que, pelo regulamento da Anatel, a confissão só seria um atenuante se ocorresse até o término do prazo para alegações finais, o que não se verificou.

A plataforma pode ainda judicializar o caso. “O STF já decidiu; vamos continuar fiscalizando e fazendo o rito regulatório. Se (o Mercado Livre) quiser judicializar, judicializa. Todos têm direito de acesso à Justiça”, completou Carlos Baigorri, presidente da Anatel, ao comentar o caso em coletiva de imprensa nesta segunda-feira.

 

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