Com a recomendação de quarentena para evitar a disseminação do novo coronavírus (covid-19), o uso massificado da telemedicina poderia trazer uma grande contribuição ao sistema de saúde do Brasil. A tendência, contudo, ainda esbarra na falta de regulamentação que impede o potencial do recurso amparado pelas redes de telecom.

Diretor de tecnologia da informação da Associação Paulista de Medicina (APM), Antonio Carlos Endrigo lembra a este noticiário que o setor atravessa há anos um processo de regulamentação da telemedicina liderado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). Uma resolução sobre o tema chegou a ser publicada em 2018, mas foi revogada após críticas de parte dos profissionais.

“Com a recomendação de ficar em casa e evitar aglomerações, a melhor maneira de continuar atendendo pacientes seria remotamente”, lamenta Endrigo, lembrando que atendimentos por outros motivos que não o coronavírus seguem necessários durante a pandemia. Ainda assim, diante do arcabouço atual, o procedimento virtual só pode ser realizado em caso de triagens, orientações ou segunda opinião de especialistas. Já a teleconsulta com diagnóstico e prescrição é vedada.

Por outro lado, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, afirmou em coletiva do gabinete do emergência do governo federal na última quarta-feira, 18, que uma solução para telemedicina e uma nova regulamentação para a atividade seriam aceleradas pela pasta até esta sexta-feira, 20.

“Deveremos ter uma ferramenta inovadora para que o brasileiro receba chamada e, ao manifestar o risco, o sistema manter o paciente monitorado. Além disso, empregaremos telemedicina de médico para médico”, disse Mandetta. Segundo ele, também há intenção de regulamentar “a telemedicina, o teleatendimento e a teleconsulta para todo o território nacional durante essa epidemia”. Maiores detalhes sobre o tema não foram fornecidos.

“O CFM vai acabar sendo atropelado”, observou Endrigo, destacando também o que chamou de “conservadorismo” do órgão diante do tema. Em um ritmo normal, a previsão do diretor da APM era de publicação de um novo regulamento para a telemedicina no começo do segundo semestre, após a análise das contribuições enviadas para a consulta pública encerrada em fevereiro.

Tecnologia

O CEO da plataforma de agendamento de consultas Doctoralia, Carlos Eduardo Spezin Lopes, afirma que a empresa já conta com uma solução de telemedicina pronta para entrar em operação assim que o novo direcionamento para a atividade ocorrer.

Enquanto isso, como forma de colaborar com a prevenção do coronavírus, a empresa está oferecendo a possibilidade de prefeituras e unidades de saúde públicas utilizarem a ferramenta para pré-consultas e triagens de forma gratuita: a intenção é justamente desafogar o sistema durante o período de quarentena . “Já recebemos várias solicitações e devemos anunciar em breve uma parceria com uma grande prefeitura”, afirmou Lopes.

Ainda assim, o executivo acredita que, dada a urgência do coronavírus, a regulamentação e a adoção da telemedicina no seu pleno potencial precisam ser aceleradas. “Será necessário algo coordenado e bem orientado para que não haja descontrole. Nós já estamos preparados”, afirmou.

Infraestrutura

Naturalmente, o papel da infraestrutura de telecomunicações será fundamental para a consolidação da telemedicina no Brasil.

“A rede é a base do serviço, além de um celular, computador ou tablet na outra ‘ponta’ para a interface”, explica Endrigo, da APM. “Só temos evoluído nesse campo por conta da evolução das redes, pois telemedicina seria impraticável no 3G. Já o 4G é razoável, mas ainda assim os serviços disponíveis usam linha dedicada, porque a qualidade é importantíssima, assim como a disponibilidade”, completa.

Dessa forma, a expectativa do setor com o 5G é grande, uma vez que a telecirurgia e demais possibilidades em saúde devem entrar no radar com o upgrade das redes. “É uma pena que no Brasil o 5G só chegue em 2021 ou 2022, pois vamos ficar mais atrasados ainda. No hemisfério norte a telemedicina já é uma realidade, enquanto nós seguimos no século passado”, avalia o diretor da APM.