De acordo com a Global Digital Inclusion Partnership (GDIP), além de outros órgãos e especialistas do setor de telecomunicações, ter um smartphone seria um um direito básico da conectividade significativa – isto é, o dispositivo mínimo para as pessoas exercerem esse direito. Porém, há discordâncias. Paloma Rocillo (foto), diretora do Instituto de Referência em Internet e Sociedade (IRIS), acredita que possuir um celular pode não ser o suficiente.

As especialista confrontou a ideia apresentada por Sonia Jorge, diretora executiva da GDIP, nesta terça-feira, 25, que discorreu sobre o conceito de conectividade significativa, durante evento de mesmo nome, promovido pela Anatel e BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), em Brasília. Desde 2019, o termo vem ganhando espaço no debate sobre inclusão digital, definindo parâmetros mínimos de acesso às redes de telecomunicações aos quais as pessoas têm direito. O smartphone seria um deles.

“Nós estamos hoje num público bastante elitista e privilegiado, mas é um público que também compõe a sociedade brasileira”, disse, referindo-se aos participantes e ouvintes do evento. “Eu pergunto: vocês conseguiriam fazer o trabalho que vocês têm hoje em dia, ter o entretenimento que vocês têm sem um computador?”, questionou. “Eu realmente acho que essa resposta é não.”

A especialista mencionou a mais recente edição da TIC Domicílios, de 2021 – a pesquisa mostrou que, para as classes A e B, é muito importante ter um computador. Já para as classes C, D e E, não é possível ter um computador, muito provavelmente por razões econômicas. “Por que vamos falar que para alguns grupos um smartphone é o suficiente?”, afirmou.

Para ela, essas especificidades precisam ser levadas em conta quando são colocadas em prática políticas públicas de universalização do acesso aos serviços de telecomunicações. “Quando eu falo que temos que pensar em equidade, quando estamos cunhando o conceito de conectividade significativa, é muito mais para pensarmos nas condições que a sociedade inteira deve ter e não necessariamente nos usos que aquela sociedade deve fazer, porque eu também não acho que a nossa função é exigir o uso da sociedade”, explicou.

Fim da franquia móvel

Dentro do espectro da conectividade significativa, Rocillo defende o fim do modelo de franquia de acesso à Internet móvel para que se garanta autonomia e liberdade às pessoas. Uma pesquisa do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) com Instituto Locomotiva, de 2021, apontou que as classes C, D e E, a maior parte da população brasileira, estão tendo suas liberdades cerceadas por causa do modelo de franquia móvel. Em média, uma pessoa das classes C e D tem acesso à Internet pelo celular apenas 23 dias do mês. Nos outros sete dias, não tem acesso, porque a franquia se esgota.

“Se estamos falando de uma autonomia, que queremos que essa conectividade tenha significado para populações de grupos vulnerabilizados, também precisamos falar sobre liberdade e acesso ilimitado”, defendeu, lembrando o pedido administrativo encaminhado pela Coalizão Direitos na Rede ao Ministério da Justiça, em janeiro de 2023, pelo reconhecimento da ilegalidade do modelo de franquia móvel de acesso à Internet.

“Eu sei que tem vários representantes aqui de empresas de telecomunicação. Eu acho que precisamos sentar numa mesa e repensar esse modelo, porque não dá para aceitarmos que nós vamos ter acessos plenos à Internet o mês inteiro e certos grupos muito grandes não terão”, disse.