O presidente da Anatel, Carlos Baigorri, detalhou a disputa judicial que a agência trava com os marketplaces Amazon e Mercado Livre, que estariam comercializando handsets do mercado cinza e sem certificação da Anatel – o que é proibido pelo artigo 162 e segundo inciso da Lei Geral de Telecomunicações (9472/1997). Em conversa com Mobile Time durante o Seminário Infraestrutura e Telecom do Lide, que aconteceu em São Paulo nesta segunda-feira, 19, o representante do órgão regulador disse que a ideia é tirar do ar as duas plataformas após elas atingirem o limite de excesso de multas diárias  –, atualmente está em R$ 50 milhões.

O tema não é novidade, uma vez que a agência indicou essa medida em junho de 2024. Mas agora a agência foca seus esforços nos dois players.

Anatel x marketplaces

Importante recordar, a Anatel alega que as duas empresas não estão seguindo uma cautelar da agência de junho do ano passado. O texto previa um escalonamento de valores caso as medidas não fossem cumpridas:

  • R$ 200 mil de multa diária até 25 dias;
  • R$ 1 milhão, a partir do 11º dia se não tirasse anúncios de celulares irregulares e retirada de todos os anúncios de celulares;
  • R$ 6 milhões, a partir do 21º dia, caso não cumprisse a parte dos anúncios, e retirada de todos os anúncios de equipamentos de rede (WiFi; Bluetooth; 2G; 3G; 4G; 5G);

Na época foram notificadas pelo regulador:

  1. Amazon;
  2. Americanas;
  3. Carrefour;
  4. Mercado Livre;
  5. Casas Bahia;
  6. Magalu;
  7. Shopee.

Dessas sete empresas, apenas Amazon e Mercado Livre não acataram as medidas da cautelar e entraram na Justiça contra o regulador com pedidos de liminares. Essas medidas de proteção dos dois marketplaces não foram aceitas por tribunais em São Paulo e Distrito Federal, mas as empresas seguem sem atuar dentro das normas da Anatel.

Takedown

Na visão de Baigorri, Amazon e Mercado Livre preferem acumular suas multas até R$ 50 milhões (o limite máximo que a Anatel pode aplicar) e vão pagar. No seu entender, o objetivo delas, empresas bilionárias, seria ter liberdade para “venderem o que quiserem”.

Porém, a ideia do regulador de telecomunicações é fazer o takedown, ou seja, a retirada do ar das plataformas após o teto de multa ser atingido: “Quando chegar a R$ 50 milhões, a multa, e eram multas diárias que vão agravando, a próxima medida será tirar o site do ar”, disse o presidente da Anatel.

“Vamos tirar o site inteiro do ar, não importa o que tem lá dentro do site”, completou, ao lembrar que a cautelar foi judicializada pelas duas empresas.

Baigorri reforçou que a decisão do takedown ainda está em discussão na Justiça e que essa é uma das principais discussões do meio digital, a responsabilidade das plataformas ante o Marco Civil da Internet (12.965/2014). Explicou que Amazon e Mercado Livre se respaldam no artigo 19 do Marco Civil da Internet para não serem responsáveis pelo conteúdo que é vendido em seus marketplaces. Contudo, há jurisprudência a partir de um dos votos do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).

“Basicamente, as plataformas de comércio eletrônico falam: ‘Olha, eu vendo qualquer coisa na minha plataforma, não tenho responsabilidade nenhuma, porque a lei me permite fazer o que eu quiser”, disse. “Mas o STF, no voto do ministro Dias Toffoli, tem um apontamento no sentido de reconhecer a responsabilidade das plataformas de comércio eletrônico na venda de equipamento de produtos controlados. Porque quando começamos a falar de medicamento, celular, agrotóxico, que têm legislações específicas, não podem ser vendidos de qualquer jeito no ambiente digital e não estão protegidas pelo artigo 19 do Marco Civil”, argumentou.

Vale lembrar, a visão de Toffoli e Baigorri são semelhantes desde 2023, quando o presidente da agência participou de audiência sobre o artigo 19 na Corte Suprema. Considerado técnico e vital para o futuro da Internet brasileira, o julgamento para a destinação do artigo 19 está atualmente em pausa após pedido de vista do ministro André Mendonça feito em dezembro de 2024.

Governo x Marketplaces

Sobre a possibilidade de fazer um trabalho judicialmente com outras áreas do governo contra os dois players, Baigorri afirmou que as conversas são mais de “combate” ao mercado cinza, com ações como investigações e apreensões.

“Temos uma atuação muito firme com a Receita Federal do Brasil, uma grande parceira nossa. Inclusive, nós fazemos parte do Siscomex, um sistema que é justamente para aumentar a assertividade da nossa fiscalização no combate ao mercado cinza de equipamentos de comunicações”, disse. “Mas também atuamos junto com o Ministério da Justiça, a Senacon, o Ministério da Fazenda, com a Câmara de Combate à Pirataria. Tem todas essas iniciativas do governo que a Anatel faz parte. É uma atuação conjunta de vários órgãos de governo”, concluiu.

Na última semana, a Abinee, que tem atuado junto ao regulador e demais parceiros do governo para combater o mercado cinza, afirmou que  Mercado Livre e Amazon são as principais fontes de entrada de aparelhos ilegais no comércio brasileiro e sugeriu uma ação conjunta do governo contra as duas empresas.

Por sua vez, Amazon e Mercado Livre responderam que combatem o grey market, inclusive com retirada de anúncios de handsets sem certificados de suas plataformas e, apesar das disputas judiciais, as duas empresas apoiam o trabalho do regulador e dos fabricantes de celular contra o mercado paralelo.

Imagem principal, da direita para esquerda: Carlos Baigorri, Anatel; Vahan Agopyan, governo de SP; Roberto Lima e Roberto Gianetti, Lide (crédito: Henrique Medeiros/Mobile Time)

 

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