Os agentes de IA são a onda do momento. Talvez não seja um tsunami como foi a inteligência artificial generativa, mas tem tamanho suficiente para gerar estragos em quem não estiver atento. Startups estão nascendo surfando essa onda, desenvolvedores de bots estão adaptando suas plataformas para incluir o conceito de agente e grandes empresas estão experimentando a novidade para automatizar processos e aumentar sua produtividade. Mobile Time conversou com vários especialistas do setor de bots para entender melhor sobre essa tendência.
O primeiro passo é definir o que é um agente de IA e marcar as diferenças para um chatbot. O agente de IA é um software com algum grau pré-definido de autonomia para executar um objetivo específico considerando dados contextuais em tempo real. Ele pode se valer de IA generativa para realizar a ação para a qual foi programado e/ou para comunicar seus resultados. Em algumas plataformas, a IA generativa serve também para a construção dos próprios agentes de IA. Mas um agente não precisa necessariamente usar IA generativa: pode se valer de IA determinística para análise de dados e tomada de decisão, sem requerer acesso a um LLM.
Em outras palavras: “agente de IA é uma aplicação capaz de entender o contexto do seu ambiente e tomar decisão de maneira autônoma, mas guiado por um objetivo específico”, descreve Ken Diamond, CEO da Escale.
“O conceito de agente é antigo. A novidade é a sua combinação com IA generativa. O agente é um software com autonomia”, acrescenta Cássio Bobsin, CEO e cofundador da Zenvia.
“Agentes de IA são uma nova forma de implementar automações”, complementa Roberto Oliveira, CEO da Blip.
E qual a diferença para um chatbot? O chatbot existe para conversar, como seu próprio nome indica. Em geral são reativos e suas ações dependem de comandos dados pelo interlocutor. O agente é pró-ativo, sendo programado para ter autonomia, e não necessariamente é conversacional.
Casos de uso para agentes de IA
São inúmeras as possibilidades de aplicação de agentes de IA. Para facilitar a compreensão, vale dividir os casos de uso entre aqueles que interagem com os humanos no front-end, e aqueles que trabalham no backend, realizando ações para outros agentes.
Um dos primeiros casos de uso que vem sendo explorado é o de vendas. É possível construir um agente de IA para ser um exímio vendedor de um produto ou serviço específico, e que seja capaz de adaptar seus argumentos de acordo com o contexto e com a realidade do consumidor com o qual conversa – inclusive tendo autonomia para oferecer descontos até um certo limite pré-definido. Um agente de IA de vendas pode atuar por texto ou por voz e entrar em contato pró-ativamente com consumidores listados em uma base de dados. É possível construir um agente para realizar a venda fim a fim, incluindo o pagamento e o acompanhamento do status do pedido.

Ken Diamond, CEO da Escale (Crédito: divulgação)
Outro caso de uso no front-end é o de aquecimento de lead. O agente pode entrar em contato com uma base de consumidores para pegar mais informações e qualificá-los, para que depois um vendedor humano (ou outro agente de IA) realize a venda.
Um agente de IA também pode cumprir a tarefa de agendamento de consultas e exames de saúde, fazendo as vezes de secretário de um consultório: liga ou escreve para o paciente, confirma o horário do atendimento e inclui o compromisso na agenda do médico.
Outro exemplo: o agente pode ser um copiloto para atendentes humanos, analisando os sentimentos do consumidor durante uma chamada para o call center e propondo respostas ou ações para o atendente.
No back-end também há infinitas oportunidades para a adoção de agentes de IA. A tendência é de que surjam cada vez mais agentes especializados em tarefas específicas, que se comunicam entre si e trocam informações. Alguns os chamam de microagentes ou subagentes. Por trás de um agente de IA que conversa com um consumidor para realizar uma venda de um serviço financeiro, por exemplo, pode haver vários microagentes para ajudá-lo: um cuida da autenticação do usuário; outro analisa o perfil do cliente no CRM para personalizar a conversa; um terceiro checa seu histórico financeiro para o desenho da oferta etc. E todos trocam dados com o agente de IA principal que interage com o consumidor.

Roberto Oliveira, CEO e cofundador da Blip (Crédito: divulgação)
Quanto mais restrita for a função de um agente, melhor tende a ser a sua execução. Criar um agente para várias tarefas ao mesmo tempo é arriscado, apontam os especialistas. “Às vezes, por economia, tem empresa que faz o que chamo de ‘agente pato’: caminha mal, nada mal e voa mal”, comenta Francisco Neto, CEO e cofundador da Fortics.
Assim, estão nascendo soluções de multiagentes nas quais é fundamental existir um orquestrador, ou roteador, que organiza a distribuição das tarefas, ou o acionamento de diferentes agentes. Ao mesmo tempo, vem ganhando força um protocolo aberto de comunicação entre agentes de IA e sistemas de dados, o Protocolo de Contexto de Modelo (MCP, na sigla em inglês), criado pela Anthropic.
“A complexidade está aumentando. Primeiro era só uma caixa de texto, depois veio RAG (retrieval-augmented generation), depois memória, agora MCP etc”, comenta Rafael Souza, CEO e cofundador da Ubots.
Agentes de IA no Brasil
O Brasil é um dos maiores mercados de chatbots no mundo, com um ecossistema diversificado de fornecedores e uma demanda relativamente amadurecida por parte das grandes empresas por esse tipo de solução, principalmente para atendimento ao cliente no WhatsApp, conforme indica o Mapa do Ecossistema Brasileiro de Bots. Isso faz do país um ambiente propício para a adoção também de agentes de IA, especialmente aqueles com interface conversacional.

Cassio Bobsin, CEO da Zenvia. (Crédito: divulgação)
Nesse contexto, estão nascendo startups com agentes de IA para determinadas verticais ou para resolver problemas específicos. Duas delas já viraram notícia no Mobile Time: a Resolva AI e a Doutor-AI.
A Resolva AI se propõe a agir em nome do consumidor para tratar de problemas com as três grandes operadoras de telecomunicações que atuam no Brasil: Claro, TIM e Vivo. Depois que a pessoa descreve o que precisa (por exemplo: trocar de plano, pedir reembolso de uma cobrança indevida ou cancelar um serviço), o agente entra em contato com o call center da operadora e cuida da solicitação, enviando em seguida um relatório para o cliente.
A Doutor-AI, por sua vez, é uma solução fim a fim para clínicas de saúde, laboratórios de exames e hospitais. Seu agente realiza o agendamento do paciente, auxilia o médico como um copiloto durante a consulta, gera relatórios para os gestores e ainda se encarrega da comunicação pós-consulta.
Outra empresa a apostar na construção de agentes de IA com um foco específico é a Escale. No seu caso, são agentes de vendas, que podem fazer a qualificação do lead, a negociação e a elaboração de uma proposta. Os agentes da Escale estão sendo usados nos setores de telecom e energia, para vendas de produtos como banda larga em fibra óptica e geração distribuída de eletricidade.

José Caodaglio, CEO e fundador da ColmeIA (Crédito: divulgação)
Empresas com plataformas de construção de chatbots, conhecidas como “bot builders”, também estão adequando seus portfólios para a era dos agentes de IA. A Fortics incluiu em outubro do ano passado em sua plataforma GOgenier a possibilidade de criação de agentes de IA, através de um fluxo conversacional. São oferecidos como ponto de partida templates de agentes com diferentes propósitos e o cliente pode definir o LLM que deseja usar, o grau de criatividade do agente nas respostas, a integração de sistemas etc. A Fortics incluiu ainda uma opção batizada como “copiloto reverso”: se o robô enfrentar uma situação que foge do limite para o qual foi configurado, ele pode solicitar a aprovação de um humano para ir em frente.
Outro exemplo: a ColmeIA anunciou recentemente o lançamento de um framework no-code para a construção de agentes de IA. Batizado como Polimata, ele torna possível produzir em poucas horas o que normalmente levaria meses, afirma o CEO e cofundador da ColmeIA, José Caodaglio.
Nas plataformas da Blip e da Botmaker já é possível criar agentes com LLMs diversos, mas também dá para mesclar com outras tecnologias conversacionais e de menor custo, como processamento de linguagem natural (PLN), construindo projetos híbridos. As duas empresas compartilham a visão de que suas plataformas funcionam como orquestradoras de vários sistemas, ferramentas e APIs utilizados por um bot ou agente.

Francisco Pinheiro Neto, CEO da Fortics (Crédito: Divulgação)
“Em vez de apostar em um agente superpoderoso que faz tudo, apostamos em microagentes, em agentes autônomos. O que antes a gente chamava de skills, com fluxos estruturados com NLP à moda antiga com integrações e chamadas a APIs, agora fazemos com agentes de IA”, compara Oliveira, da Blip. “Nossa estratégia é aberta e mais focada na orquestração do que na reivenção da roda. Vão existir bilhões de agentes autônomos que usam IA. E centenas ou milhares de AI agent builders”, prevê.
Na Botmaker, diante da demanda por projetos com multiagentes, a companhia está trabalhando com o conceito de “superagente”, que consiste em um agente de IA encarregado de coordenar os demais, verificando a acurácia e a eficiência de cada um, revela seu CEO, Erick Buzzi.
Na Ubots e na Zenvia alguns clientes já têm feito experiências com agentes de IA. A Ubots está neste momento trabalhando para incluir a construção de agentes dentro do seu bot builder, com lançamento previsto para o fim deste ano.
Vale mencionar que a Meta anunciou há poucas semanas que vai lançar uma ferramenta para a criação de agentes para pequenas e médias empresas (PMEs) no WhatsApp e no Messenger, chamada de Business AI. Não foram revelados maiores detalhes ou modelo de negócios. A novidade será disponibilizada primeiramente no México e nas Filipinas.
Modelo de negócios
O mercado de bots está acostumado a cobrar por sessões de conversas ou por usuário único. Normalmente, insumos extras, como o uso de motores externos de PLN, envio de mensagens no WhatsApp ou tokens de LLM, são cobrados à parte.

Rafael Souza, CEO e cofundador da Ubots (Crédito: divulgação)
Com a chegada dos agentes de IA começa a ganhar força o modelo de cobrança por resultado, também chamada em inglês de “success fee” ou cobrança por “outcome”. Um agente de vendas, por exemplo, cobraria por venda efetivada.
A Escale é uma das pioneiras em adotar o modelo de negócios por resultado. Ela cobra uma tarifa fixa barata de implementação enquanto 70% da sua receita vem do success fee dos seus agentes de vendas.
“Um vendedor humano recebe um fee fixo e um valor variável conforme suas vendas. Entendemos que esse modelo é justo para agente de IA de vendas. Se tiver resultado é ganha-ganha”, compara Diamond, da Escale.
Nesse modelo, o fornecedor assume parte do risco, na confiança de que seu agente de IA é bom e vai gerar resultado. O problema é que não depende somente da qualidade do agente de IA, mas também do apetite do cliente em usá-lo, o que pode variar mês a mês, prejudicando a previsibilidade do faturamento. Outra dificuldade é ter a rastreabilidade dos dados, para poder medir os resultados. Isso funciona quando o cliente é uma empresa grande, munida de sistemas de ERP e BI. Mas pode ser complicado no universo de pequenas e médias.
Além disso, dependendo da função do agente de IA, nem sempre o resultado pode ser verificado com objetividade, o que pode provocar divergências entre o fornecedor e seu cliente. “No caso de um agente de qualificação de leads, por exemplo, como o resultado pode ser mensurado de maneira que não gere uma disputa depois?”, questiona Oliveira, da Blip.
Muita curiosidade, pouca demanda
A curiosidade das empresas em torno de agentes de IA é grande, mas ainda há pouco dinheiro circulando em projetos com essa tecnologia, apontam a maioria das fontes ouvidas por Mobile Time.

Erick Buzzi, country manager do Brasil da Botmaker (Crédito: divulgação)
“Existe um hype de que tudo precisa ser agente de IA. Mas no mundo real depende do caso. Em alguns momentos um chatbot com processamento de linguagem natural pode ser melhor”, comenta Buzzi, da Botmaker.
“Em customer experience (CX), agente autônomo é algo que está no seu início. Tem muito problema para ser resolvido antes. Tem empresa que não tem nem URA. Algumas vão implementar um bot com árvore de decisão. Outras experimentam IA generativa, mas com certa insegurança, com medo de perder o controle”, relata Bobsin, da Zenvia.
“Não sinto barreira para fazer PoCs, mas as empresas precisam de uma fase de namoro para se sentir mais seguras a tomar a decisão”, comenta Diamond, da Escale.
Por outro lado, a Fortics informa que 1 mil agentes de IA foram criados em dez meses desde que a funcionalidade foi adicionada à sua plataforma.
É indiscutível que a onda de agentes de IA está chegando. A dúvida é qual será o seu tamanho e o seu real impacto na economia. Enquanto algumas empresas vão surfá-la, outras perigam se afogar. E talvez haverá quem prefira mergulhar, passar por baixo dela e voltar à superfície para pegar a próxima onda que virá.
Super Bots Experience 2025
O Super Bots Experience & Forum de Autoatendimento Digital 2025 debaterá a tendência de IA agêntica em seu painel de abertura, com participações confirmadas de:
Brunno Santos, country manager Brasil, ElevenLabs
José Caodaglio, CEO e fundador, ColmeIA
Ken Diamond, CEO e cofundador, Escale
Roberto Oliveira, CEO e cofundador, Blip
O evento terá também um painel sobre startups AI-native, com os seguintes executivos:
Davi Holanda, CEO e cofundador, Jota
José Larrucea, fundador, MaxMeAI
Mauricio Honorato, CEO e cofundador, Doutor-AI
Michele Chahin, vice-presidente de marketing, Zapia
Vicente Camillo, CEO e cofundador, Resolva AI
E outro sobre AI-commerce, com:
Bruno Venceslau, superintendente de dados, IA e negócios digitais, Brasilprev
Caio Gomes, CAIO, Magalu
Lídia Gordijo, diretora de CX, Buser
Lucas Zardo, vice-presidente de conversational payments, Bemobi
Valter Andrade, head de IA e dados, Visa
O evento, organizado por Mobile Time, acontecerá nos dias 21 e 22 de agosto, no WTC, em São Paulo. A agenda atualizada e mais informações estão disponíveis em www.botsexperience.com.br
As ilustrações nesta matéria foram produzidas por Mobile Time com IA