Em painel que discutiu a regulação em inteligência artificial no Brasil, durante o evento Abes Conference, nesta segunda-feira, 6, em São Paulo, ficou clara uma divisão entre representantes da iniciativa privada, que querem uma regulação aberta (open regulation, no original em inglês), e o governo federal, que defende a definição de estratégias e políticas públicas, algo que viria antes de se pensar em regulação.

Mercado

Diogo Costa, diretor-executivo do Instituto Millennium (reprodução: YouTube/Abes)

Para Diogo Costa, diretor-executivo do Instituto Millennium, o Brasil precisa olhar para a regulação de IA de uma forma mais “leve”, não tão “pesada”. Deu como exemplo, as decisões e ações que o Departamento de Comércio dos Estados Unidos tem apresentado sobre o tema, em trabalho conjunto com entidades de certificação, como a ISO.

Nós precisamos pensar em open regulation. Olhar como podemos nos beneficiar de um ecossistema (IA) que é ativo, dinâmico e exponencial. Até para que esse ecossistema possa ensinar o governo a ter uma regulação maior, ao invés de pegar um recorte de especialistas e acreditar que isso pode gerar um recorte para os próximos dez anos”, afirmou Costa.

A advogada especializada em tecnologia e cofundadora da Layer Two consultoria, Priscila Reis, afirmou que o open regulation em IA é uma questão de o governo definir um “trade-off”, ou seja, as trocas e benefícios que deseja alcançar com a tecnologia. Exemplificou com o regramento do governo do Japão ao instituir que os dados usados para treinamentos de algoritmos não infrinjam direitos autorais, uma ação que evitou problemas ao modelo de negócio de empresas locais.

Priscila Reis, advogada e cofundadora da Layer Two (reprodução: Abes/YouTube)

Na visão da especialista, o Brasil é um país altamente regulatório e com um projeto de lei que está seguindo a tendência “restritiva e protectível” da União Europeia. Reis enxerga falhas e possíveis restrições no projeto de lei 2338/2023, atualmente em discussão no Senado Federal: “O PL 2338 é baseado na abordagem de riscos e ele coloca como exemplo de sistemas de alto risco ‘todo e qualquer sistema produzido para a saúde’. Então, qualquer sistema que seja usado na saúde seria considerado um sistema de alto risco”, explicou.

A advogada conclui dizendo que o texto atual do PL “é altamente restritivo para as empresas” que eventualmente produzam um sistema de IA para a saúde o que poderiam gerar “uma série de obrigações”, “riscos” e “custos” para o cumprimento de regras em IA.

Governo

Secretário-executivo do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável (Conselhão) do Ministério das Relações Institucionais, Paulo Pereira (reprodução: YouTube/Abes)

Para Paulo Pereira, secretário-executivo do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável (Conselhão) do Ministério das Relações Institucionais, o caminho não é pensar apenas a regulação, mas o desenvolvimento de estratégias e políticas públicas. Ressaltou ainda que o problema da regulação não acompanhar a velocidade de adoção de uma tecnologia pelo mercado “não é novo”.

“As regras são sempre feitas para o futuro com base em experiências do passado e o mundo muda. O problema agora (em IA) é a velocidade, mas temos soluções para isso, como setores que trazem conselhos da sociedade e que se autorregulam. Mas o real problema da IA é a estratégia”, afirmou Pereira, ao dizer que o Brasil pode ser um player global em IA e digitalização, como a China é hoje.

Segundo Pereira, para montar a estratégia se deve levar em conta o seguinte: fazer com que a transformação digital não agrave os problemas da sociedade brasileira; identificar os esforços público-privado; casar a transformação digital com grande plano de educação e educação digital; e resolver os problemas de infraestrutura.

Por sua vez, Eliana Emediato de Azambuja, coordenadora-geral de transformação digital no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), lembrou que o governo tem um viés participativo ao lado da academia, governo e iniciativa privada. Um exemplo é a EBIA (Estratégia Brasileira de Inteligência Artificial). Outro exemplo é a plataforma Gov.Br, de digitalização dos serviços públicos. Ela acrescentou que o MCTI tem discutido com a Casa Civil para fazer um modelo mais participativo na estratégia digital do País.

Imagem principal: No telão, Eliana Emediato de Azambuja, coordenadora-geral de transformação digital no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (reprodução: YouTube/Abes)