A denúncia publicada na capa da Folha de São Paulo nesta quinta-feira, 18, de que empresas teriam pago pelo disparo de mensagens eleitorais contra o candidato à presidência do Partido dos Trabalhadores, tem implicações que extrapolam o âmbito da justiça eleitoral. A matéria revela a existência da oferta de serviços de mensageria não autorizada no WhatsApp. Ou seja, o mesmo problema que atormenta há anos o mercado de SMS corporativo (A2P) chega ao aplicativo de mensagens móveis mais popular do País, instalado em 97% dos smartphones nacionais e aberto todo dia ou quase todo dia por 98% dos seus usuários, de acordo com a mais recente pesquisa Panorama Mobile Time/Opinion Box sobre mensageria móvel.

Faz apenas dois meses que o WhatsApp abriu oficialmente a comercialização de disparo de mensagens por empresas para consumidores através da sua API. Preocupado em evitar o uso indevido de sua plataforma, a empresa tem sido bastante criteriosa na aprovação de seus parceiros. São poucos ao redor do mundo. Além disso, faz questão de aprovar cada cliente que seus parceiros trazem, revisando o fluxo de mensagens e a experiência do consumidor. Há ainda uma série de restrições, como a proibição de mensagens publicitárias de promoções e vendas. Somente comunicações de suporte e notificações de consumo podem ser enviadas. E, claro, o contato só pode ser feito com consumidores que tenham assim autorizado, ou seja, que tenham fornecido o seu opt-in.

O que a Folha de São Paulo denunciou não acontece através dos parceiros homologados pelo WhatsApp. As empresas citadas não são autorizadas pelo app a comercializarem serviços de mensageria nele. Em vez de usarem a API oficial, burlam a política de uso do WhatsApp se passando por mensagens enviadas por pessoas físicas. Para conseguirem fazer disparos em massa, utilizam softwares criados para essa finalidade e números móveis diversos, inclusive do exterior, em um modelo parecido com aquele das chipeiras usadas no SMS pirata.

“Não é a primeira vez que isso acontece em uma eleição no Brasil. Nos últimos três ciclos eleitorais, contando as eleições municipais de 2016, foram usadas empresas para disparos ilícitos massivos de spam a poucas semanas da votação, como acontece agora. A novidade é que temos a migração dessa ilegalidade do ambiente das operadoras no SMS para o ambiente das OTTs e outros meios. O WhatsApp é o principal mas não está só: acontece no Telegram e no Messenger também, embora em menor quantidade. Já era esperado, pois é onde está a audiência”, analisa Rafael Pellon, advogado especializado no assunto, sócio do escritório FAS Advogados e consultor do MEF.

A matéria do jornal afirma que há também venda de bases de números telefônicos, o que fere não apenas as regras do WhatsApp, mas a recém-aprovada Lei de Proteção de Dados Pessoais.

“A denúncia (da Folha de São Paulo) é gravíssima em relação à privacidade das pessoas. Quando empresas revendem bases sem ter o opt-in, elas transformam os consumidores em produtos. É algo muito errado e vai contra qualquer termo de conduta”, comenta Yuri Fiaschi, diretor para as Américas da Infobip, uma das parceiras oficiais do WhatsApp. E acrescenta: “Estamos diante do nascimento do mercado de WhatsApp pirata, algo que já existia no SMS e em outros canais”.

Pellon, do FAS Advogados, lembra que o Marco Civil da Internet isenta as plataformas digitais de responsabilidade pelo conteúdo trafegado entre seus usuários, mas pondera que existe uma pressão política e pública para que haja algum tipo de administração das redes de forma a se evitar esse tipo de propagação.

Parceiros oficiais

Roberto Oliveira, CEO da Take, outro parceiro oficial do WhatsApp, explica que as marcas que utilizam esses meios irregulares de envio de mensagens não buscam a construção de uma relação de confiança e de longo prazo com seu consumidor, pois sequer se apresentam com uma conta verificada. “Elas não seguem o conceito de contato inteligente. No nosso caso, oferecemos uma solução em que a marca passa a ter um contato oficial para se comunicar receptivamente e ativamente no WhatsApp. A grande força está na confiança da conta verificada, na construção de uma relação consistente, com a visão de contato inteligente. Nossa solução é para marcas que tenham uma visão de longo prazo. É diferente de usar um número desconhecido para um disparo de curtíssimo prazo”, explica Oliveira.

Fiaschi, da Infobip, acresenta que os parceiros oficiais do WhatsApp, assim como aqueles das operadoras em SMS, cumprem um papel de filtro contra a disseminação de notícias falsas ou de outros conteúdos inapropriados. “Quando se tem um broker homologado, tanto para SMS quanto para WhatsApp, ele ajuda a fazer a análise do conteúdo antes de ser postado. São criados filtros que evitam a disseminação de informações falsas”, explica.